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De um lado está o senhorio com ameaças de cortar água e luz, mandar demolir o edifício e integrar os moradores mais idosos num lar. Do outro estão 16 famílias residentes no prédio Santos Lima, em Marvila, Lisboa. Há mais de um ano que se recusam a sair. Vivem na zona oriental da capital há dezenas de anos e sabem que os preços da habitação na freguesia inflacionaram mais do dobro em poucos meses. Os proprietários, duas empresas de compra e venda de imóveis, alegam que o prédio pode ruir, mas a Câmara já intimou os proprietários a fazer obras de recuperação do edifício sem despejar os moradores. O impasse não tem fim à vista
Primeiro as boas notícias: Portugal foi considerado em 2019 o melhor destino europeu pelo terceiro ano consecutivo nos World Travel Awards e Lisboa teve direito ao “óscar” de melhor destino para escapadelas. Quem a visita procura o bom clima e a imensa história, sem se aperceber das consequências do crescimento desenfreado do turismo. Nos últimos anos, centenas de famílias residentes na capital têm sido vítimas da pressão imobiliária e os despejos sucedem-se para que os prédios se transformem em estabelecimentos comerciais.Marvila, bairro típico da zona oriental da capital, não escapou. No antigo pólo industrial da freguesia, na rua do Açúcar, o edifício Santos Lima foi vendido em 2017 por 2,4 milhões de euros. Uns meses mais tarde foi posto à venda por quase o triplo desse valor. Para os investidores, parecia uma pechincha.
Este edifício “abandonado”, como era descrito nos anúncios, facilmente podia transformar-se num hotel, um serviço bastante necessário num bairro de rápida gentrificação.
No entanto, o Santos Lima era e é casa de 16 famílias que há mais de um ano lutam contra um senhorio que apenas procura o despejo. Em 2018, as empresas Buy2Sale e Preciousgravity Lda, donas do prédio, fizeram um pedido na Câmara Municipal de Lisboa (CML) em que alegavam que o edifício corria risco de ruir e que os inquilinos precisavam de ser desalojados para que as obras pudessem avançar.
Mas a CML, após uma vistoria ao Santos Lima, intimou os proprietários a realizarem obras sem ter de proceder à desocupação. Estes tentaram impugnar o relatório, sem sucesso. Foi-lhes dado 90 dias úteis para que as obras começassem, mas tal ainda não se verificou. A esperança dos inquilinos é que a Câmara tome posse administrativa do imóvel, permitindo-lhes assim passar mais alguns anos nas casas onde alguns nasceram e esperam acabar os seus dias.
Das 17 famílias que residiam no Santos Lima em 2017, restam 16. Um dos inquilinos, face à pressão por parte dos donos do prédio, decidiu sair. Desde ameaças de que o edifício seria demolido, de cortar a água e a luz ou de que os mais idosos seriam colocados em lares, muitas foram as estratégias usadas para forçar a desocupação do imóvel nesta zona de rápida gentrificação. Só em 2018, o preço médio das casas em Marvila subiu cerca de 80% e parece ser objectivo da Buy2 Sale a venda rápida do imóvel e não a sua reabilitação.
Apesar de a decisão camarária ter sido uma vitória, o futuro é ainda incerto para as quase 40 pessoas que fazem do Santos Lima a sua casa.
Um pouco por toda a cidade há casos assim e este trabalho documental procura servir de memória futura às mudanças que afetam Lisboa agora.
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