1415-1961: Da conquista de Ceuta ao início da luta armada
O apego de Portugal pelas suas colónias durou séculos, mas a partir de 1961 eclode a Guerra do Ultramar. Os movimentos a favor da independência dos territórios ultramarinos acabariam por ganhar força.
Fevereiro de 1961: Início da Guerra Colonial
A 4 de fevereiro, o Movimento Popular e Libertação de Angola (MPLA), que era apoiado pela União Soviética e por Cuba, atacou a prisão de São Paulo, em Luanda, e uma esquadra da polícia. Foram mortos sete polícias. E no norte do território, a UPA (União das Populações de Angola), que se dedica sobretudo à guerrilha rural, desencadeou vários ataques contra a população branca. Angola foi a primeira colónia onde se iniciou a luta armada organizada contra o domínio português.
Março de 1961: Massacres em Angola
São perpetrados massacres nas regiões de São Salvador e Dembos e nos distritos coloniais de Luanda, Kwanza Norte e Uíge, em Angola, depois da agitação da UPA. Fontes da época falam na morte de 1.200 brancos e 6.000 negros. Assistiu-se à destruição de fazendas, postos administrativos e destacamentos da polícia por parte de bakongos. As operações do Exército português contra a UPA prolongaram-se durante oito meses.
Abril de 1961: Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias
Sob os auspícios do rei Hassan II, a Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas (CONCP), criada por iniciativa do MPLA, do PAIGC (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde) e da Liga de Goa, reuniu-se pela primeira vez em Casablanca (Marrocos), de 18 a 20 de abril. O seu objetivo era “coordenar os esforços dos movimentos nacionalistas e estabelecer os meios efectivos para iniciar a luta contra o colonialismo português”. Em Portugal, o mês de abril fica também marcado pela “Abrilada”, a tentativa falhada de golpe militar contra Salazar liderada por Botelho Moniz, ministro da Defesa.
A CONCP voltou a reunir-se em Dar-Es-Salam, em 1965, para a II Conferência (da esq. para a dir.) Agostinho Neto, Gaston Sumialat, Amílcar Cabral, Mohamed Babu, Eduardo Mondlane e Mohamed Meghracui
Junho de 1961: A fuga dos estudantes de Portugal para a luta de independência
Um grupo de 60 estudantes de Angola, Moçambique, Cabo Verde e de outras colónias fogem de Portugal e da ditadura de Salazar para se juntarem à luta de libertação. A fuga clandestina mudou o futuro dos países africanos de expressão portuguesa. Alguns destes nacionalistas viriam a ser presidentes, ministros, generais ou médicos e teriam um papel relevante na condução do destino dos seus países. Os ex-Presidentes de Cabo Verde, Pedro Pires, e de Moçambique, Joaquim Chissano, fazem parte dos jovens que deixam Lisboa, Coimbra e Porto, com o apoio do Conselho Mundial das Igrejas. A fuga passa por Espanha, França e Alemanha.
Agosto de 1961: Perda da Fortaleza de Ajudá
O recém-criado Daomé (atual Benim), antiga colónia francesa na África Ocidental, ocupa a Fortaleza de São João Baptista de Ajudá. Com 4,5 hectares, era uma das colónias mais pequenas do mundo. A fortaleza foi fundada em 1680 pelos portugueses e serviu, sobretudo, como entreposto comercial, nomeadamente de escravos. Portugal só reconheceu a soberania do Benim sobre a fortaleza em 1975. Foi o primeiro território ultramarino em África que Portugal perdeu no século XX.
A Fortaleza de São João Baptista de Ajudá, também conhecida como Feitoria de Ajudá, localiza-se na cidade de Uidá, no Benim
Dezembro de 1961: Fim do domínio português na Índia
Os mais de 450 anos de domínio português na Índia terminam a 18 de dezembro, quando as tropas indianas entram em Goa, Damão e Diu, quase sem resistência. A integração da Índia Portuguesa na União Indiana era exigida pelo primeiro-ministro indiano, Jawaharlal Nehru, desde a independência do império britânico, em 1947. “Não prevejo possibilidade de tréguas nem prisioneiros portugueses, assim como não haverá navios rendidos, pois sinto que apenas pode haver soldados e marinheiros vitoriosos ou mortos”, tinha escrito Salazar numa mensagem enviada ao governador do Estado Português da Índia, General Vassalo e Silva. Porém, os soldados recusam-se a lutar perante o poder militar da Índia.
1962: Criação da FPLN
No decurso da I Conferência de Forças da Oposição, a decorrer em Argel, em dezembro, é criada a Frente Patriótica de Libertação Nacional (FPLN), organização de inspiração comunista e de luta armada. É a partir de Argel que emite a Rádio Voz da Liberdade, emissora clandestina da FPLN dirigida por Piteira Santos e Manuel Alegre (foto), que teve um papel importante na luta contra o colonialismo português. No norte de Angola, os portugueses constroem os primeiros aldeamentos estratégicos para controlar melhor a população indígena, que é obrigada a abandonar as suas terras e é concentrada em novas aldeias vigiadas pelos militares. A estratégia é repetida nos anos seguintes noutras colónias.
1963: Luta armada alarga-se à Guiné
A 23 de janeiro de 1963, face à intransigência do regime fascista português, a luta armada nas colónias portuguesas alarga-se à Guiné-Bissau. A guerra inicia-se com o ataque do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) ao quartel de Tite, no sul do país. O PAIGC conta com o apoio da Guiné-Conacri, independente desde 1958.
1964: Batalha da Ilha do Como na Guiné-Bissau
A Ilha do Como torna-se num dos símbolos da luta do PAIGC devido à operação realizada, no início de 1964, pelas tropas portuguesas que pretendiam reocupar a ilha. A maior batalha das guerras africanas de Portugal durou 72 dias. Os combatentes do PAIGC conseguiram impedir o regresso dos militares à base estratégica na ilha.
Setembro de 1964: Início da guerra em Moçambique
Perante a intolerância do regime português, a FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) inicia a luta armada em Moçambique (foto) em 25 de setembro de 1964 com o ataque a Chai, em Cabo Delgado. Antes desta primeira ação armada, a guerrilha tinha já iniciado a sua propaganda política, especialmente entre os macondes, etnia de religião animista que ocupa aquela zona. A Organização da Unidade Africana (OUA) reconhece o MPLA como “único representante legítimo do povo de Angola” e concede-lhe auxílio diplomático e logístico. No mesmo ano, é criada em Genebra, na Suíça, a Ação Socialista Popular (ASP), que elege Mário Soares como secretário-geral.
Outubro de 1964: MPLA abre Frente Leste
Depois da independência da Zâmbia, o MPLA abre a Frente Leste, aumentando, desta forma, a sua zona de influência. Antes operava principalmente em Cabinda e a norte de Luanda. Já a FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola), outro movimento independentista, tinha a sua área de atuação no norte de Angola, junto à fronteira com o Zaire (atual República Democrática do Congo). O MPLA abandonará a Frente Leste em 1973 devido a problemas de abastecimento.
Fevereiro de 1965: Assassinato de Humberto Delgado
No dia 13 de fevereiro, o general Humberto Delgado é raptado e assassinado pela PIDE, os serviços secretos portugueses, em Vila Nueva del Fresno, perto de Badajoz, Espanha, com a colaboração da polícia política do regime fascista de Franco. O “general sem medo” tinha regressado clandestinamente a Portugal para participar numa reunião que alegadamente se destinava a preparar um novo golpe militar contra o regime de Salazar.
A transladação dos restos mortais de Humberto Delgado para o Panteão Nacional aconteceu a 5 de outubro de 1990
Junho de 1965: ONU endurece posição
Com o agravamento da situação em Angola, na Guiné-Bissau e em Moçambique, aumentam as condenações da política colonial portuguesa por parte da Assembleia-Geral, Conselho de Segurança e Comissão de Descolonização da ONU. No dia 10 de junho, a Comissão passa a falar em “territórios sob dominação portuguesa” e reconhece a legitimidade das lutas de libertação nacional. Aos Estados é pedido que não forneçam armas a Portugal enquanto o país mantiver a sua política colonial.
Apesar de alguns estudos para expandir a guerra a Cabo Verde, o PAIGC prefere manter a luta no continente na Guiné-Bissau devido ao difícil acesso às ilhas.
Apesar de alguns estudos para expandir a guerra a Cabo Verde, o PAIGC prefere manter a luta no continente na Guiné-Bissau devido ao difícil acesso às ilhas.
Janeiro de 1967: Salazar aceita reivindicações de Pequim
Depois de confrontos em Macau entre o Exército português e manifestantes influenciados pelo Governo da República Popular da China, Salazar cede e aceita as reivindicações de Pequim. Liberta todos os presos políticos, proíbe no território atividades do Governo de Taiwan e aceita reconhecer a soberania chinesa. A República Popular da China usa Macau como porta de entrada e saída de divisas e opõe-se à sua descolonização.
Julho de 1967: Rádio Libertação do PAIGC inicia emissões
Em julho, o PAIGC inicia as emissões da sua Rádio Libertação na Guiné-Bissau. A emissora foi um dos vários meios criados pelo partido fundado por Amílcar Cabral para difundir informação. Para divulgar os seus objetivos e êxitos militares, o PAIGC também criou boletins informativos e estabeleceu contactos com a imprensa internacional.
1968: Novo Governo em Portugal
Aos 79 anos, Salazar sofre um acidente ao cair de uma cadeira e é afastado do Governo. É substituído no cargo por Marcelo Caetano (foto), antigo ministro das Colónias (1944-47) e fervoroso ativista do “Estado Novo”. Em 1962 tinha defendido uma tese federal para as colónias como “Estados Unidos Portugueses”. Esta nomeação cria a expectativa de uma possível solução política para a questão ultramarina, mas não houve mudanças fundamentais. O general António de Spínola assume o comando militar na Guiné, onde inicia uma operação político-militar designada “Para Uma Guiné Melhor”. O objetivo era conquistar a simpatia dos habitantes através da sua promoção socioeconómica e, dessa forma, acabar com a sublevação que tinha transformado a Guiné-Bissau na colónia militarmente mais difícil para os portugueses.
Marcelo Caetano apresenta o seu governo ao Presidente da República, Américo Tomás, após a substituição de Oliveira Salazar (1968)
Fevereiro de 1969: Assassinato de Eduardo Mondlane
Em 3 de fevereiro, Eduardo Mondlane (à dir. na foto), um dos fundadores e primeiro presidente da FRELIMO, é assassinado em Dar-es-Salam, Tanzânia, ao abrir uma encomenda que continha uma bomba. Apesar das circunstâncias da sua morte nunca terem sido esclarecidas, acredita-se que a PIDE, a polícia política portuguesa, tenha sido a autora do ataque. Mondlane estudou antropologia e sociologia nos Estados Unidos e trabalhou para as Nações Unidas. O seu sucessor é Uria Simango, que será substituído na liderança do partido por Samora Machel em 1970. Simango abandona então a FRELIMO e junta-se ao Comité Revolucionário de Moçambique (COREMO), criado em 1964 e com bases na Zâmbia.
Eduardo Mondlane (à dir. na foto), primeiro presidente da FRELIMO, na II Conferência da CONCP, em Dar-Es-Salam (1965)
Abril de 1969: Marcelo Caetano visita colónias
Em abril desse ano, Marcelo Caetano (foto) visita Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. Durante o seu Governo, Salazar nunca chegou a sair da Europa. A Acção Nacional Popular (ANP), o partido único, vence as eleições de 26 de outubro para a Assembleia Nacional. Caetano faz campanha a favor da manutenção das colónias e nega qualquer negociação com os movimentos independentistas: “Portugal não pode ceder, não pode transigir, não capitular na luta que se trava no Ultramar.” O nome da polícia política portuguesa muda de PIDE para DGS.
Marcelo Caetano no seu programa semanal "Conversas em Família", transmitido pela Radiotelevisão Portuguesa (RTP)
Setembro de 1969: Início da construção de Cahora Bassa
O consórcio hidroelétrico do Zambeze (ZAMCO) inicia a construção de Cahora Bassa, na província de Tete. Um dos objetivos da barragem é tornar o rio Zambeze impermeável, evitando o avanço da FRELIMO para o sul. No consórcio participam empresas de Portugal, Suíça, África do Sul, França, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos da América. Seria a maior barragem em África e uma das maiores do mundo com uma potência de 3000 MW. A albufeira de Cahora Bassa começaria a encher em dezembro de 1974.
BIBLIOGRAFIA:
Afonso, Aniceto/Gomes, Carlos de Matos, Os Anos da Guerra Colonial - 1961.1975, Lisboa, Quidnovi, 2010.
Cervelló, Josep Sánchez, A Revolução Portuguesa e a sua Influência na Transição Espanhola (1961-1976), Lisboa, Assírio & Alvim, 1993.
Marques, A. H. Oliveira, Breve História de Portugal, Lisboa, Editorial Presença, 2006.
Rodrigues, António Simões (coordenador), História de Portugal em Datas, Lisboa, Temas e Debates, 2000 (3ª edição).
Agradecimento especial:
Casa Comum (Fundação Mário Soares)
www.dw.com
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