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quinta-feira, 4 de julho de 2019

As pessoas deviam saber


Fotograma de um dos filmes "Guerra das Estrelas"
Ontem assisti à reunião do grupo de trabalho da comissão parlamentar do Trabalho.

Desde 1986 que, como jornalista, assisto a debates parlamentares e, no entanto, aquele fez-me particular impressão. Parecia um recreio de uma escola secundária de meninos mal educados, a mando de pais ausentes da sala.

Sobre a mesa estavam alterações ao Código do Trabalho, propostas pelo Governo, na sequência de um acordo de concertação social sobre combate à precariedade laboral. O acordo foi assinado há cerca de um ano, sem o voto da CGTP, e - ao contrário do que poderia parecer - quem tem feito finca-pé para que a lei do Parlamento corresponda textualmente ao acordo têm sido as confederações patronais, com a CIP à cabeça. E a reunião daquele grupo de trabalho foi exemplar disso.

Primeiro, as votações decorreram a mata-cavalos. Quem presidia à reunião era a deputada social-democrata Clara Marques Mendes, mas era o deputado do CDS António Carlos Monteiro quem imprimia o ritmo. E era para despachar quanto antes.

Não havia debate. Os cidadãos-votantes poderão esperar que, sendo um grupo de trabalho, as reuniões servissem para aclarar pontos dos vista, discutir argumentos, num ambiente de informalidade e abertura. Nada disso. Eram raros os momentos que interrompiam as votações. Caso um deputado - do Bloco ou do PCP - levantasse o braço para se pronunciar sobre um dado ponto, todos os restantes - presidente da mesa, pessoal de apoio, deputados da direita, deputados do PS conversavam para o lado, sonoramente. O deputado mal se ouvia, cumpria o seu dever e calava-se. E mal se calava, todos se calavam também. E as votações prosseguiam, aceleradas.

Os deputados da direita estavam esfuziantes, felicíssimos. O deputado do PS - Tiago Barbosa Ribeiro (TBR), um socialista que costuma intervir sobre assuntos laborais num tom à esquerda - estava na ingrata função que lhe fora dada - propositadamente? - de se abster nas propostas do BE e PCP, para que os votos do PSD e CDS as inviabilizassem, sob a gozação da direita. Eram gozadas como se fossem apenas palavras, jogos, e não medidas que poderiam, um dia, ter efeito na vida de alguém. E sempre a favor de um dos lados.


Uma proposta do PCP, visando impedir o despedimento de um trabalhador caso este tivesse feito antes queixa por assédio, foi gozada pelo deputado Monteiro do CDS. A deputada comunista Rita Rato tentou discutir o conteúdo da proposta e recebeu mais gargalhadas como resposta. "Como é que conseguem dormir?", Dizia ela. E o deputado Monteiro: "Oh Ritinha..." E riam-se.

TBR estava de cara fechada, as suas intervenções eram lacónicas. Foi o que aconteceu numa das propostas em que o PS recuou e deixou cair aquilo que era uma penalização às que empresas que ignorassem a obrigação legal de dar formação aos seus trabalhadores.

Se havia alguma proposta que fugia ao aprovado em concertação social, o CDS e o PSD adoptavam o tom paternalista, pomposo, repleto de argumentário jurídico mal-enjorcado, apenas para camuflar a opção política de acatar o que as confederações patronais tinham manifestado em audições parlamentares: o diploma tinha de respeitar ipsis verbis o aprovado na concentração social.

Fez impressão esta subalternizarão da função de deputado. A chungaria ainda que vestida de blaser a condizer com a pose, os óculos e popa. A pobreza de mundo de quem representa o povo.

Oscar Wilde tinha uma frase engraçada: "O casamento é a principal causa do divórcio". Neste caso, a principal causa do tão mal tratado termo populismo ou do temido avanço da extrema-direita parece cada vez mais estar no uso da democracia por quem merecia apenas estar na 3ª linha de qualquer coisa que não um parlamento. Esperemos pelas legislativas.


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