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quinta-feira, 23 de junho de 2011

Não fora o Mar ………


23 Jun 2011 /  Sem categoria

Não Fora o Mar! Não fora o mar,
e eu seria feliz na minha rua,
neste primeiro andar da minha casa
a ver, de dia, o sol, de noite a lua,
calada, quieta, sem um golpe de asa.

Não fora o mar,
e seriam contados os meus passos,
tantos para viver, para morrer,
tantos os movimentos dos meus braços,
pequena angústia, pequeno prazer.

Não fora o mar,
e os seus sonhos seriam sem violência
como irisadas bolas de sabão,
efémero cristal, branca aparência,
e o resto — pingos de água em minha mão.

Não fora o mar,
e este cruel desejo de aventura
seria vaga música ao sol pôr
nem sequer brasa viva, queimadura,
pouco mais que o perfume duma flor.

Não fora o mar
e o longo apelo, o canto da sereia,
apenas ilusão, miragem,
breve canção, passo breve na areia,
desejo balbuciante de viagem.

Não fora o mar
e, resignada, em vez de olhar os astros
tudo o que é alto, inacessível, fundo,
cimos, castelos, torres, nuvens, mastros,
iria de olhos baixos pelo mundo.

Não fora o mar
e comeria à mão,
não fora o mar
e aceitaria o freio.

\\\\\\\\ Fernanda de Castro, in “Trinta e Nove Poemas”
( Escritora nascida em Lisboa em 8.12.1900 e falecida em 19.12.1994 )
Louletania

1 comentário:

utopia das palavras disse...

...não fora o mar e o mundo seria muito mais triste!!!
Poema muito bonito com uma ilustração fabulosa!