Quinta-feira, 21 de Julho de 2011
Outras histórias que não a minha
O cinema é o meu maior conforto nas noites solitárias que vivo nesta casa à beira-mar. Deito-me, encosto a cabeça a duas ou três almofadas, estico as pernas e entrelaço as mãos. Antes de carregar no play oiço, tranquilamente, o barulho das ondas e o vento que sopra lá fora. A esse som verdadeiramente embalante, segue-se uma banda sonora que deverá falar pelo próprio filme – se tal não acontecer, risco-o imediatamente da minha lista de obras a rever, um dia.
Depois da música, as imagens. Essas não têm apenas a doçura de uma melodia. Algumas comportam mesmo uma malvadez que, ainda que seja meramente intencional, não deixa de lá estar. Amo e odeio ao mesmo tempo todos os filmes que retratam a vida de um escritor ou de uma escritora, mas, incrivelmente ou não, não consigo deixar de os ver. Invejo tais personagens, porque nelas observo não apenas os momentos de derrota que já tão bem conheço, como também os ápices de glória que me deixam a tremer de desejo. Admiro os lapsos de inspiração, aquela ânsia de agarrar numa caneta, o gesto de acariciar um papel, as suas respirações ofegantes e desesperantes, as folhas tão cheias de marcas que não se apagam, nem com o tempo, nem com nada. Pergunto-me por que tal não acontecerá comigo e certezas, só uma: por mais que odeie certas personagens, também as amo. E é por amá-las que continuo a tomar por companhia estes filmes lentos e penetrantes nas noites frescas de um Verão que teima em não aquecer.
Vejo outras histórias que não a minha, porque não tenho história. Desejo-as pelo mesmo motivo. Venero-as pelo sonho. Enquanto não ganhar as minhas próprias asas, nada mais me resta senão todas essas outras histórias que não são minhas, mas que, por doces e ternos momentos, gostava que fossem.
Depois da música, as imagens. Essas não têm apenas a doçura de uma melodia. Algumas comportam mesmo uma malvadez que, ainda que seja meramente intencional, não deixa de lá estar. Amo e odeio ao mesmo tempo todos os filmes que retratam a vida de um escritor ou de uma escritora, mas, incrivelmente ou não, não consigo deixar de os ver. Invejo tais personagens, porque nelas observo não apenas os momentos de derrota que já tão bem conheço, como também os ápices de glória que me deixam a tremer de desejo. Admiro os lapsos de inspiração, aquela ânsia de agarrar numa caneta, o gesto de acariciar um papel, as suas respirações ofegantes e desesperantes, as folhas tão cheias de marcas que não se apagam, nem com o tempo, nem com nada. Pergunto-me por que tal não acontecerá comigo e certezas, só uma: por mais que odeie certas personagens, também as amo. E é por amá-las que continuo a tomar por companhia estes filmes lentos e penetrantes nas noites frescas de um Verão que teima em não aquecer.
Vejo outras histórias que não a minha, porque não tenho história. Desejo-as pelo mesmo motivo. Venero-as pelo sonho. Enquanto não ganhar as minhas próprias asas, nada mais me resta senão todas essas outras histórias que não são minhas, mas que, por doces e ternos momentos, gostava que fossem.
Sara Gonçalves
BLOG HORIZONTE DO SER
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