Pélvico
Tinha sido muito simpática a iniciativa daquele embaixador português, numa certa capital europeia, de oferecer um cocktail de despedida ao seu colega que estava acreditado junto de uma organização internacional, na mesma cidade, e que ia regressar a Lisboa. Algumas dezenas de amigos tinham sido convidados para a ocasião, que tinha muito de genuína, porque os dois diplomatas tinham, de facto, uma saudável e muito boa relação entre si.
Chegada a hora dos discursos, o dono da casa foi pródigo em elogios ao colega que partia, sublinhando, com ênfase, a relação de grande proximidade que ambos mantinham. O que ninguém estava à espera é que, no entusiasmo das palavras, lhe tivesse saído, a certo passo, a frase: "Nós os dois temos uma proximidade pélvica!".
A sala estacou de surpresa. Que diabo! "Uma proximidade pélvica"? O homenageado cofiou a barba e manteve o sorriso, nesse momento um pouco mais amarelo, evitando olhar para os circunstantes, muitos dos quais abafavam gargalhadas e trocavam divertidos e surpreendidos olhares entre si. Mas, com o prosseguimento das palavras, o efeito da expressão foi-se diluindo e, mantendo-se a estranheza, a maioria dos presentes logo esqueceu o episódio.
No dia seguinte, um dos diplomatas da casa, mais ousado e próximo do embaixador, não resistiu a perguntar-lhe: "O senhor embaixador desculpará, mas ontem, na receção, não percebi bem o que quis significar, ao dizer que tinha uma "proximidade pélvica" com o seu homenageado".
O embaixador olhou-o do alto dos seus óculos, com a cara grave habitual, que quase sempre não significava qualquer zanga mas apenas um estilo, e lá esclareceu: "Não percebeste? Essa agora! Quis dizer que nós temos uma grande proximidade, que as nossas peles têm uma idêntica sensibilidade, uma proximidade "pélvica", de pele...
Realmente, a língua portuguesa é muito traiçoeira.
Publicado por Francisco Seixas da Costa
http://duas-ou-tres.blogspot.com/
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