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domingo, 10 de fevereiro de 2019

HISTÓRIA DA GUERRA COLONIAL - OPERAÇÕES ENCOBERTAS - O ASSASSINATO DE AMÍLCAR CABRAL


GUERRA COLONIAL: OPERAÇÕES ENCOBERTAS (5)



AMÍLCAR CABRAL: INFORMADORES DA PIDE “EFECTIVAMENTE IMPLICADOS”

Alguns dos antigos oficiais e antigos diplomatas que conheceram os meandros da operação Mar Verde, sustentam que, no seu emaranhado, pode estar algo de esclarecedor sobre a conspiração que levou à morte de Amílcar Cabral, fundador do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde.

Muito se escreveu ao longo dos anos sobre o assassinato do líder do PAIGC Amílcar Cabral, em especial quem teria (m) sido o(s) autor(es) mandantes. 

No actual estado da investigação surgem muitos traços que ainda permanecem incompletos, por vezes mesmo obscuros, não sobre o papel desempenhado directamente pelas autoridades portuguesas, mas sim na sua “pista interna” da guerrilha e seus apoios internacionais, em especial sobre o grau e extensão de cumplicidades que existiram, eventualmente, por um lado, em parte da estrutura dirigente do próprio PAIGC e, por outro, na Chefia de Estado da Guiné-Conacri.

Da parte portuguesa, as certezas são mais consistentes.

Na pesquisa arquivística da época, um facto parece evidente, o Estado português, em Lisboa e na Guiné-Bissau, planeou, por várias vezes, a liquidação física de Amílcar Cabral. 

        Está documentado oficialmente. 































Era política "clandestina" de Estado o assassinato do líder do PAIGC.

Alguns dos conspiradores guineenses que o interpelaram e abateram, posteriormente, em Conacri, em 1973, tinham ligações à polícia portuguesa (eram considerados, oficialmente, como "recuperados", depois de terem sido guerrilheiros). 

Também está largamente referenciado nos arquivos oficiais. 

Esses "recuperados" saíram de Bissau rumo à capital guineense com o conhecimento das autoridades - governador e PIDE/DGS, e, sob a sua supervisão daquela. 

Levavam a missão de conspirar contra sua liderança. 

E a chefia da PIDE em Bissau estava a par disso. 

O governador e comandante-chefe António de Spínola igualmente estava informado. 

Os relatórios policiais consultados indicam, com frequência, que uma cópia dos mesmos seguia para o seu gabinete.

Aliás, o falecido marechal aprovou uma operação encoberta, a Mar Verde, (ver  descrição anterior) em que um dos objectivos era capturar Cabral, vivo...mas principalmente morto.

E o enquadramento dessa operação apresenta similitude com um projecto de um grupo de extrema-direita francesa, o “Redressement Economique”, que, nos primeiros dias de Abril 1969, o apresentou ao governo português, através do Centro Cultural de Portugal e da embaixada de Portugal em Paris.

O projecto, que veio a chamar-se “Operação Chèvre”, visava, na sua fase inicial, precisamente, assassinar, pura e simplesmente, Amílcar Cabral.

Está largamente documentado no Arquivo da Torre do Tombo e começou num encontro mantido entre o então director do Centro de Portugal em Paris José Augusto dos Santos e um senhor E. Michel, que pertencia ao “Redressement Economique” (RE).




Esse grupo, segundo um documento se auto-apresentava como “um dos organismos de expressão do centro de estudo de investigação e de documentação económico”, estava sedeado no 38, Avenida da Opera, em Paris.


Segundo o mesmo documento, colaboravam com o RE “um certo número de personalidades económicas” gaulesas, cujo nome o grupo transmitia a José Augusto dos Santos a “título indicativo”:

- “O senhor presidente Pellenc, relator geral do Orçamento do Senado

- “Senhor Bokanowski, Maurice , antigo ministro (Indústria)

- “Senhor Nungesseur, Roland, antigo ministro, pertencente à maioria

- “Senhor Gardellini, fiscal de Estado, antigo chefe do gabinete do Ministro da Indústria

- “Senhor Jannes, Henri, inspector-geral da Economia

- “Senhor Piette, director do gabinete do Senhor Guy Mollet, secretário-geral da S.F.I.O

- “Senhor Dusseaux, Roger – deputado, antigo ministro dos Transportes”.

No quadro “das relações que unem as nossas organizações Portugal, permitimo-nos fornecer uma informação interessante ao vosso país, e que você poderá transmitir a Lisboa se achar útil”, refere o documento assinado por E.Michel, que assim inicia, na prática, a operação “Chévre”.

Esse início pressupõe que, “por intermédio de um dos meus conselheiros africanos, ser-nos-á, provavelmente, possível entrar em contacto com o senhor Cabral que se encontra hoje mesmo em Dakar”, conselheiro esse que o citado Michel  dizia “conhecer” o líder do PAIGC “há muito tempo”. 

E assim mostravam a sua disponibilidade para assassinar Amílcar Cabral.

Cerca de dois meses depois, aquele grupo dá maior amplitude à sua acção, propondo que se coloque o projecto de aniquilar Cabral num “Quadro Geral” para derrubar Sekou Touré, com a intervenção da FLNG (Frente de Libertação Nacional Guineense).

Neste último aspecto, a sua aposta era a de mobilizar o sector militar daquele partido da oposição guineense, especialmente o “mais honesto do FLNG (Frente de Libertação Nacional Guineense), que, não é senão, o responsável dos militares”. 

Curiosamente, este “responsável” indicado e acarinhado pelo  RE, vai estar implicado na operação Mar Verde
  
A PIDE, o Presidente do Conselho de Ministros e os Ministros dos Negócios Estrangeiros e do Ultramar, entre outros, estavam a par e sancionaram os primeiros passos daquela operação. 

O inspector daquela polícia Abílio Pires participou em Paris, em Julho desse ano, em reuniões e estabeleceu contactos para pôr em marcha a operação.

O então director da Casa de Portugal em Paris escrevia, a  17 de Julho de 1969, a Moreira Batista, Secretário de Estado da Informação e Turismo e homem de confiança de Marcelo Caetano, relatando todos os passos das negociações, que, numa primeira fase, passariam por atrair Amílcar Cabral à capital francesa, onde seria abatido.

Nos arquivos da PIDE, depositados na Torre do Tombo, não foi possível encontrar documentos que indicassem que a operação “Chèvre” tivesse progredido, pelo lado francês, após Agosto de 1969.

Surgem depois daquela data, indicações de que se estabeleceram contactos com oposicionistas ao regime de Seku Turé, mas ligando-os à Guiné-Bissau, canalizados pelo Ministério do Ultramar em Lisboa. 

O comandante Calvão descreve-os no seu livro “De Conacri ao MDLP”.

Na preparação da operação à Guiné-Conacri, o nome de um inspector da PIDE Matos Rodrigues, com largo cadastro em “acções clandestinas” nas antigas colónias, aparece associado (uns meses após os contactos exploratórios de Paris, onde a polícia política serviu de intermediária e de veículo privilegiado de recolha de informações) a encontros e reuniões com oposicionistas em ligação com o chefe operacional da “Mar Verde” Alpoim Calvão.

Na Europa, as conversações de Alpoim Calvão e Matos Rodrigues com os responsáveis desta Frente no exílio decorreram, precisamente, em Paris e Genebra, e os interlocutores guineenses parecem ser os mesmos que estão envolvidos no projecto da extrema-direita francesa e na estrutura da mesma Operação.

É também o inspector Matos Rodrigues quem dá, em Agosto de 1969, o seu beneplácito à libertação de vários dirigentes e quadros do PAIGC que se encontravam detidos em Cabo Verde (Tarrafal) e na ilha das Galinhas na Guiné-Bissau.

Analisando a documentação que foi possível consultar, verifica-se que essa libertação está assente num projecto de uma acção concertada, cujo objectivo era a desarticulação do PAIGC.

Dos documentos, retira-se que essa libertação teve um seguimento organizacional e a concordância e controlo estreito da PIDE para que os antigos prisioneiros voltassem a militar no PAIGC e a sua posterior ida para Conacri para se aproximar e infiltrar no seu mais estrito grupo dirigente e particularmente chegar a Amílcar Cabral. 

Voltemos à génese. 


Ao lado, Amílcar com Rafael Barbosa, no início do PAIGC. Na outra fotografia, Cabral, com o primeiro grupo de guerrilha formada na China, onde se encontra Nino Vieira.

É, precisamente, em Agosto de 1969 que o governador António de Spínola encena em Bissau uma cerimónia de libertação mediática de alguns dirigentes do PAIGC, entre os quais o seu antigo Presidente Rafael Barbosa.

A PIDE elabora a lista de prisioneiros a libertar provenientes dos “campos de concentração” do Campo de Chão Bom (Tarrafal), Cabo Verde, Angola e ilha das Galinhas (Guiné-Bissau) 

Entre os libertados, apresentados como "recuperados", estão Mário Mamadu Turé, que foi membro do Comité Central até 1963, altura da sua prisão, e Aristides Barbosa, que, posteriormente, vão “fugir” em conjunto para a capital da então República Democrática da Guiné.

Na cerimónia de libertação, Rafael Barbosa, que fora o primeiro Presidente do PAIGC, preso em 1963 em Bissau, afirmou alto e bom som, dirigindo-se a António de Spínola: 

“Eu lhe prometo que serei tão bom português como Vossa Excelência”, acrescentando: “o futuro o confirmará”.


Ficou sempre em contacto com a PIDE/DGS.

Alguns dos libertados fazem constar junto de amigos e conhecidos que aquilo fora tudo encenação.

A PIDE regista e transmite para Lisboa, em relatórios secretos, o que se está a passar, sem qualquer indício de preocupação ou alerta.

Numa mensagem cifrada, com data de 2 de Agosto de 1969, véspera da cerimónia de libertação, onde discursou Rafael Barbosa, enviada de Bissau para o seu director em Lisboa, Matos Rodrigues dava conta de todos os passos que iam ocorrer no dia seguinte, sublinhando que era uma planeada “acção contra propaganda IN”. 

Apresentava a lista de libertados e sustentava: “todos se afiguram recuperados”, terminando a sua informação com “respeitosos cumprimentos”.

Dos relatórios, retira-se que há controlo, constante, no terreno. 

Os “homens” de Rafael Barbosa e ele próprio “vão prestando contas”.

A integração dos antigos quadros e dirigentes independentistas, na estrutura de Bissau do PAIGC, como Mário Mamadu Turé e Aristides Barbosa, está referenciada. 


Os “movimentos” até ao Senegal e Conacri também. 

A PIDE conhece todos os passos que conduziram ao assassínio de Amílcar Cabral em 1973.

Os relatórios da PIDE, que se encontram no ANTT e que foi possível consultar, fazem um acompanhamento constante da actividade de Rafael Barbosa e de outros “recuperados” sempre a partir da “casa” daquele ou dos que lhe estão próximos.

Assim, a polícia política sabe que “Momo” Turé é o número 1 do PAIGC, na chamada Zona Zero (a zona urbana de Bissau) e que o mesmo Mário Turé, juntamente com alguns militantes e outros controlados pela PIDE, seguira para Conacri a 16/17 de Setembro de 1971.

Em 19 de Junho de 1972, a polícia política dá ênfase num relatório de um informador, que frequenta ou vive na casa de Rafael Barbosa (naturalmente o próprio Barbosa, cifrado para despistar possíveis desconfianças), que existem “sérias divergências no seio do PAIGC” e que “as divergências acentuaram-se a partir da chegada de Momo Turé a Conacri”. 

(A polícia política portuguesa conseguira aliciar, pelo menos, um alto dirigente do PAIGC para seu informador. De seu nome Marcel de Almeida, existem documentos da sua ligação aquela estrutura policial na Torre do Tombo).

A mesma PIDE sabe que um grupo que esteve ligado à Marinha do PAIGC e recebeu instrução na Base de Potche, no Mar Negro, na antiga União Soviética, se constituiu em “fracção” contra Amílcar Cabral.

E cita-os: Inocêncio Kanié, Inácio Soares da Gama,  Julião Lopes, Djaban Mané e Rui Nola, assinalando que após o regresso da Rússia, o grupo entrou em contacto com Momo Turé e outros.





A mesma polícia tem conhecimento que o grupo da Marinha foi disperso por diversas frentes e bases do PAIGC, após haver suspeitas da existência de complô contra o falecido líder do movimento independentista e que alguns estiveram presos em Conacri e foram libertados na véspera do assassinato de Cabral.

João Tomás Cabral, o mais influente na morte de Amílcar, era considerado e referenciado como um informador da polícia portuguesa até pelos próprios pelos dirigentes de topo do PAIGC, mas mesmo assim continuou nas fileiras partidárias.

Luís Cabral, que sucedeu a Amílcar na liderança e foi o primeiro Chefe de Estado da Guiné-Bissau até 1980, ano em que foi afastado pelo general Nino Vieira, argumentou - em declarações ao autor -  que o seu irmão acreditava na recuperação de quadros que estiveram muitos anos ao serviço do PAIGC e que vacilaram em certa ocasião.

Segundo o relato oficial conhecido, tornado público na altura, os conspiradores, que conheciam os movimentos do líder, actuaram a 20 de Janeiro de 1973, abordando o secretário-geral do PAIGC Amílcar Cabral na estrada de Ratoma, Conacri, e pretenderam prendê-lo. 

Perante a resistência do líder, abateram-no. Foi João Tomás que o mandou "liquidar". 

O primeiro alto dirigente daquele partido que apareceu junto do líder assassinado foi o membro do secretariado Osvaldo Vieira, que morreu em finais de 1973. 

Estava em divergências com Cabral e tinha contactos com os conspiradores.

Aqueles dirigiram-se depois ao Palácio Presidencial de Seku Turé, procurando o seu beneplácito, como se soubessem que havia uma "canal" junto daquele que dera autorização para o acto.

Por seu turno, relata a PIDE, na versão de um informador, que aquele lhes respondeu que “era um abuso matar um dirigente no seu país, dando ordens imediatas a um coronel do seu Exército para os mandar deter, e ordenando ainda à Marinha de Boké para interceptar os barcos do “PAIGC” que levavam preso Aristides Pereira (o secretário-geral adjunto), o que aconteceu ao largo de Quitafine”.

Luís Cabral confidenciou ao autor que foram na realidade unidades navais da Marinha Soviética, que estavam estacionadas na Guiné-Conacri, após a operação “Mar Verde” que impediram, a pedido de Seku Turé, os revoltosos de chegar à Guiné-Bissau com Aristides Pereira.

Turé enviou directamente os conspiradores presos para o interior do território.

Não quis ser ele a investigar mais profundamente o sucedido. 

Um acto que o primeiro Presidente do Conselho de Estado da Guiné-Bissau considerou estranho, mas que disse compreender que Turé não quisesse ser, eventualmente, acusado de parcialidade no diferendo.

Luís Cabral referiu que o secretariado do partido - o que restava na altura - (que ficou desarticulado) só soube dessa transferência dos conspiradores e assassinos do seu irmão, depois de eles terem chegado ao interior da Guiné-Bissau.

“Não houve julgamento. Ao chegarem às diferentes frentes foram mortos, alguns barbaramente. Houve muita desorientação naquela altura e alguma quebra da cadeia de comando. Apenas um grupo foi interrogado na Frente onde estava Fidelis Cabral de Almada, que era formado em Direito”, disse, em várias conversas mantidas com o autor, o ex-Presidente da República guineense.

Luís Cabral admitiu que pudessem haver “cumplicidades” no topo do Partido. 

E sugeriu, mesmo, o nome de Osvaldo Vieira. 

“Mas tenho de afirmar: apenas suspeitas, pois nunca existiram provas reais”, fez questão de acrescentar. 

Mas, confirmou que Osvaldo Vieira nunca mais exerceu qualquer cargo no PAIGC até à sua morte.

(Em conversa informal, referiu que a altura era difícil para "aprofundar" todas as implicações, pois o "partido estava dividido e desorientado".)

O antigo Chefe de Estado guineense garantiu que o PAIGC desconhecia que o falecido dirigente daquele partido Marcel de Almeida fosse um informador da polícia política portuguesa. 

“Foi para nós uma completa surpresa. Só soubemos da sua ligação à PIDE depois do 25 de Abril de 1974”, disse.

Nos arquivos, com data de 13 de Junho de 1973, está um relatório da PIDE/DGS da Guiné para os seus superiores, com informações - uma carta - que o responsável local referiu serem de Marcel de Almeida sobre o que se estava a passar no interior da direcção do PAIGC após a morte de Amílcar Cabral.

“A reunião do Conselho Superior de Luta para a escolha do novo secretário-geral do PAIGC estava marcada para o dia 30Abr73, tendo sido adiada para data a designar devido a ARISTIDES MARIA PEREIRA se encontrar ausente em MOSCOVO, onde está a receber tratamento.

“ARISTIDES PEREIRA está quase paralisado dum dos lados devido à forma como foi tratado por ocasião da morte de AMILCAR CABRAL. ARISTIDES PEREIRA já esteve na RDA a receber tratamento, tendo sido transferido, recentemente, para a URSS.

“Os principais autores do *complot* contra AMILCAR CABRAL, após o terem assassinado, dirigiram-se ao palácio de SEKOU TOURÉ, a quem consideravam um grande amigo da facção constituída por terroristas originários da Guiné Port., tendo-o posto ao corrente do acto que tinham acabado de praticar, SEKOU TOURÉ ordenou que fossem presos pelo exército guineense, tendo, em seguida, mandado desarmar todos os terroristas guinéus, ao mesmo tempo que eram presos muitos indivíduos. SEKOU TOURÉ, com receio de represálias contra a sua pessoa, mandou entregar todos os presos ao PAIGC para que fossem julgados de acordo com as leis do partido”. Está escrito no relatório de Almeida.

funeral de Estado em Amílcar Cabral em Conacri

Osvaldo Vieira era o primeiro dirigente negro na hierarquia do PAIGC, que pertencia ao Conselho Superior de Luta.

Luís Cabral desvendou algo mais:

“Sobre Osvaldo Vieira, o secretariado tinha só indícios. Mas ficamos mais alertados quando um dos participantes no assassinato de Amilcar, João Tomás Cabral, ao ser levado para o interior, escreveu uma carta a Osvaldo, que lhe foi retirada, a dizer-lhe que ficava a aguardar instruções. Foi a partir desta carta que começamos a desconfiar, mas profundamente e fizemos algumas conexões”.

Mas, não quis alargar mais o seu pensamento. Nem o que realmente sabia.

/Numa conversa posterior, mais informal, disse uma frase enigmática: "o golpe de 1980 (que o afastou da Chefia do Estado na Guiné-Bissau)teve muito a ver do que então se passava"/.

João Tomás Cabral tinha, portanto, a noção de que não ia para o interior para ser morto. 

Esperava a actuação de Osvaldo, e de quem mais? 

Luís Cabral disse que o inquérito interno nada determinou.

Osvaldo Vieira era parente de Nino Vieira.

"Tivemos muitas cautelas com o Nino, mas ele estava no interior e verificamos que já há bastante tempo não contactava com Osvaldo, nem com os principais autores da morte de Amílcar", frisou.

 Osvaldo foi, no entanto, suspenso de todas as actividades no Congresso do PAIGC que teve lugar após a morte de Cabral e colocado em residência fixa em Kundara, precisou Luís Cabral.

Veio a morrer, posteriormente, depois de ter sido operado.

Luís Cabral frisou que Osvaldo Vieira sofria de cirrose do fígado em estado muito avançada, tendo sido aconselhado pelos médicos a não beber. 

Foi tratado, mas não seguiu as prescrições médicas. 

Quando foi operado, sucumbiu. 

Nino Vieira, então comandante da Frente Leste, acompanhou a evolução da doença, segundo Luís Cabral.

Osvaldo Vieira foi o primeiro comandante da Frente Norte do PAIGC. 

Luís Cabral referiu que Vieira “se degradou como pessoa” e teve de ser afastado desse cargo ainda nos anos 60. 

Manteve-se, no entanto, com funções de relevo, mas entrou em divergências com Amílcar Cabral.

Inocêncio Kanié, um dos assassinos do líder do PAIGC, foi adjunto de Osvaldo Vieira, quando este comandou a Frente Norte do PAIGC.

Luís Cabral admitiu que haviam divergências entre Seku Turé e Amílcar Cabral, sublinhando, inclusive, que o ex-Chefe de Estado guineense “se portou mal no funeral” do seu irmão, chegando a dizer que “ele (Amílcar) tinha perdido a confiança dos seus homens”, mas – ressaltou –  “nada prova que ele tenha sido cúmplice directo na morte”.

“Todas as provas apontam para a Guiné-Bissau. Os homens que levavam Aristides confessaram-no, outros também o fizeram”, frisou. 
        
      A 21 de Março de 1973, o inspector Fragoso Allas, o chefe da delegação da PIDE/DGS, em relatório secreto enviado para os seus superiores em Lisboa, referia que Mário Momo Turé “está efectivamente implicado no assassinato de Amílcar Cabral e possivelmente já foi fuzilado”.
            
      O inspector da PIDE, chefe da delegação em Bissau, escrevia este relatório ainda antes de se conhecer os resultados finais da comissão de inquérito internacional que interrogou 465 pessoas, das quais 43 que estavam ligadas à conspiração, 9 de cumplicidade e 42 apenas suspeitos.
            
      Num outro documento do inspector Allas, com data de 13 de Março de 1973, remetido para Lisboa, intitulado “relatório de interrogatório” (a PIDE disfarçava muito bem os seus informadores) de um “professor do PAIGC”, de nome  Rui João António Nola (o indívíduo acima citado estava metido no complô), natural de Teixeira Pinto, manjaco de etinia, que viera de Conacri, (o responsável policial afirma que se “apresentou em Piche em 281200FEV73), cujo “exemplar nº 7” foi enviado para “QG/COMCHEFE/GUINÉ _ REP INFORMAÇÕES”, descreve-se com pormenor o assassinato.

       (O que significa que estava perto).

       “O primeiro elemento (João Tomás)  dirigiu-se ao *secretário-geral* dizendo que o vinham prender, pelo facto de não estar a orientar o *partido* convenientemente. AMILCAR CABRAL respondeu que não podia ser preso e que se julgavam má a sua orientação, seria melhor dirigirem-se todos para o gabinete do Secretariado Geral onde o assunto seria discutido, acrescentando que preferia morrer a ser preso.
            
    "JOÂO TOMÁS, em face desta resposta, virou-se para o INOCENCIO e disse que se ele queria morrer, que morresse, tendo INOCENCIO abatido a tiro o secretário-geral. Em seguida, INOCENCIO NANYE foi a casa de ARISTIDES PEREIRA que se rendeu e foi conduzido para os barcos do PAIGC que se dirigiram para o mar em direcção ao QUITAFINE. JOÃO TOMÁS e os outros elementos prenderam BUSCARDINI; ANA CABRAL, mulher de Amilcar, HENRIETTE TAVARES e muitos cabo-verdeanos, homens e mulheres, que foram encarcerados na prisão da MONTANHA.
            
       “Estes elementos dissidentes dirigiram-se a SEKOU TOURÉ, informando-o do que tinham feito, tendo este respondido que era um abuso matar um dirigente no seu país, dando ordens imediatas a um coronel do seu exército para os mandar deter, e ordenando à Marinha de BOKÉ para interceptar os barcos do *paigc*, o que aconteceu ao largo de QUITAFINE.
            
          “O apresentado – escreve Allas que estava ligado a Inocencio Kanye – teve conhecimento que foram também presos JULIÃO LOPES, QUEMO MANÉ, OSVALDO MÁXIMO VIEIRA, PAULO CORREIA e alguns dirigentes do PAIGC em CONAKRY, tendo sido libertados posteriormente”.

           Com infiltrações, com políticas de Estado de assassinatos de dirigentes dos antigos movimentos de libertação das ex-colónias portuguesas, com explorações de divergências que surgem sempre onde há luta política, o que é certo é que a História segue sempre o seu caminho.

          E no caso da guerra colonial portuguesa, os dirigentes do Estado português da altura estavam no lado errado da mesma. 

          Perderam, e não vale a pena dizer que foi por causa disto ou  daquilo. 

          O facto histórico está registado. É necessário tirar lições, até para o nosso presente, e ainda mais para o nosso 
Publicada por 
tabancadeganture.blogspot.pt

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