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Alguns dos artistas plásticos subscritores da carta entregue ao primeiro-ministro em Outubro do ano passado, colocando pertinentes questões sobre o estado das artes visuais em Portugal, convocaram uma reunião. Em substância, propõem-se discutir o modelo de uma Comissão de Aquisições de Arte Contemporânea que faça a gestão do programa anual de aquisição de obras de arte contemporânea anunciado por António Costa, inscrito no Orçamento de Estado com valor inicial de 300 mil euros.
Percebe-se que esse objectivo, com efeitos a curto prazo, seja uma das preocupações dos artistas plásticos, mesmo que uma parte, não despicienda, dos subscritores da carta não esteja excluída das listas de compras públicas e privadas dos últimos anos.
A aquisição de obras de arte é importante mas não é a questão fundamental das artes visuais em Portugal. Será sempre objecto de controvérsias, maiores ou menores, porque é inevitável que essa comissão, por mais esclarecida que seja, vá nas suas decisões cometer injustiças por mais que faça justiça. Deve-se ainda questionar se a aquisição de obras de arte pelo Estado, se a gestão de uma colecção de arte pública, deva ser feita fora dos museus de arte contemporânea.
O que não se percebe nem se compreende é que muitas das questões levantadas na referida carta pareçam ter sido colocadas em planos mais recuados, como se não fossem centrais na definição das políticas culturais. São questões que afectam todos os artistas plásticos, independentemente do seu estatuto, cotação, aceitação crítica e outros parâmetros do mercado das artes que, no estado actual, é quem de facto define a situação dos artistas numa sociedade que faz os detentores de actividades simbólicas descer ao nível da realidade, da dependência directa dos imperativos económicos por já não sentir a necessidade de manter a sua relativa autonomia.
Preocupações justas,
soluções limitadas
Um modelo de apoio às artes visuais de aceitável razoabilidade não parece possível sem colocar em causa as sucessivas e catastróficas fusões a que têm sido sujeitas as estruturas do Ministério da Cultura, o que fez uma razia em todas as áreas e fez entrar em coma profundo as artes plásticas, com a fusão do Instituto Português das Artes do Espectáculo com o Instituto de Arte Contemporânea numa Direcção-Geral das Artes em estado de confusão permanente. Reestruturar o Ministério da Cultura é tão importante como lhe dar maiores meios financeiros, para lhe conferir operacionalidade na definição de políticas culturais, uma inexistência actual. Em relação ao Estado, essa é a questão central.
A fragmentação dos artistas plásticos, sem nenhuma estrutura representativa, bem visível quando a contestação aos concursos da DGArtes congregou várias manifestações de artistas de outras áreas em que a ausência dos artistas plásticos foi uma evidência, não é iludida por esta carta. São justas as suas preocupações, mas mais preocupante é – depois da cobertura mediática do encontro com António Costa – que o silêncio só tenha sido rompido com a convocação de uma reunião em que o ponto aparentemente único é o da forma de concretizar as prometidas aquisições pelo Estado, sabendo-se que actualmente o valor venal do objecto artístico resulta dos trânsitos das actividades promocionais em que a arte é sempre, e só, mercadoria.
Não deve haver ilusões sobre o que representa a arte, as artes, para esta sociedade. Como não deve haver ilusões sobre os impasses, mesmo que dificilmente ultrapassáveis ou mesmo inultrapassáveis, que o seu modelo impõe.
A questão central é como devem ser enfrentados para colocar em igualdade todos os artistas no plano dos direitos sociais, em particular o enquadramento fiscal e a segurança social, e das condições de trabalho, considerando as assimetrias regionais, para depois, com maior ou menor justiça, promover concursos para apoiar projectos. Será sempre uma discussão em aberto.
(publicado no Avante! 2360/21 fevereiro)
Manuel Augusto Araujo
Percebe-se que esse objectivo, com efeitos a curto prazo, seja uma das preocupações dos artistas plásticos, mesmo que uma parte, não despicienda, dos subscritores da carta não esteja excluída das listas de compras públicas e privadas dos últimos anos.
A aquisição de obras de arte é importante mas não é a questão fundamental das artes visuais em Portugal. Será sempre objecto de controvérsias, maiores ou menores, porque é inevitável que essa comissão, por mais esclarecida que seja, vá nas suas decisões cometer injustiças por mais que faça justiça. Deve-se ainda questionar se a aquisição de obras de arte pelo Estado, se a gestão de uma colecção de arte pública, deva ser feita fora dos museus de arte contemporânea.
O que não se percebe nem se compreende é que muitas das questões levantadas na referida carta pareçam ter sido colocadas em planos mais recuados, como se não fossem centrais na definição das políticas culturais. São questões que afectam todos os artistas plásticos, independentemente do seu estatuto, cotação, aceitação crítica e outros parâmetros do mercado das artes que, no estado actual, é quem de facto define a situação dos artistas numa sociedade que faz os detentores de actividades simbólicas descer ao nível da realidade, da dependência directa dos imperativos económicos por já não sentir a necessidade de manter a sua relativa autonomia.
Preocupações justas,
soluções limitadas
Um modelo de apoio às artes visuais de aceitável razoabilidade não parece possível sem colocar em causa as sucessivas e catastróficas fusões a que têm sido sujeitas as estruturas do Ministério da Cultura, o que fez uma razia em todas as áreas e fez entrar em coma profundo as artes plásticas, com a fusão do Instituto Português das Artes do Espectáculo com o Instituto de Arte Contemporânea numa Direcção-Geral das Artes em estado de confusão permanente. Reestruturar o Ministério da Cultura é tão importante como lhe dar maiores meios financeiros, para lhe conferir operacionalidade na definição de políticas culturais, uma inexistência actual. Em relação ao Estado, essa é a questão central.
A fragmentação dos artistas plásticos, sem nenhuma estrutura representativa, bem visível quando a contestação aos concursos da DGArtes congregou várias manifestações de artistas de outras áreas em que a ausência dos artistas plásticos foi uma evidência, não é iludida por esta carta. São justas as suas preocupações, mas mais preocupante é – depois da cobertura mediática do encontro com António Costa – que o silêncio só tenha sido rompido com a convocação de uma reunião em que o ponto aparentemente único é o da forma de concretizar as prometidas aquisições pelo Estado, sabendo-se que actualmente o valor venal do objecto artístico resulta dos trânsitos das actividades promocionais em que a arte é sempre, e só, mercadoria.
Não deve haver ilusões sobre o que representa a arte, as artes, para esta sociedade. Como não deve haver ilusões sobre os impasses, mesmo que dificilmente ultrapassáveis ou mesmo inultrapassáveis, que o seu modelo impõe.
A questão central é como devem ser enfrentados para colocar em igualdade todos os artistas no plano dos direitos sociais, em particular o enquadramento fiscal e a segurança social, e das condições de trabalho, considerando as assimetrias regionais, para depois, com maior ou menor justiça, promover concursos para apoiar projectos. Será sempre uma discussão em aberto.
(publicado no Avante! 2360/21 fevereiro)
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