Na senda de outros movimentos associativos constitui-se, em 1895, por iniciativa exclusiva dos operários da Fábrica, a Cooperativa de Responsabilidade Limitada – Sociedade de Crédito e Consumo do Pessoal da Fábrica da Pólvora de Barcarena. Esta organização surge com a evolução natural da Associação de Socorros Mútuos – Caixa dos Operários da Fábrica da Pólvora, aprovada por Alvará de 23 de Agosto de 1894, que tinha como função a assistência médica e a concessão de subsídios.
A Cooperativa contou com oitenta sócios-fundadores, incluindo alguns militares de serviço na Fábrica, e os seus estatutos, aprovados a 22 de Outubro de 1895, regulamentavam todos os assuntos ligados à actividade da sociedade. O capital social, no valor de 500 réis, foi constituído pelas verbas resultantes das quotas, da venda de cadernetas e estatutos, de juros de empréstimos e de lucros de exploração. A quota era semanal e tinha o valor de 50 réis.
De acordo com os estatutos, podiam fazer parte da Cooperativa todos os trabalhadores da Fábrica maiores de 14 anos, no activo ou na reforma, e as viúvas de operários. Contudo, a Assembleia-Geral, a quem competia eleger o conselho fiscal e a direcção, era interdita a mulheres e a menores de 14 anos.
Esta Cooperativa funcionava segundo um regime de cadernetas e senhas e tinha como fim o fabrico, ou a aquisição, para o fornecimento aos seus associados, de artigos de consumo, a concessão de empréstimos e a ajuda na aquisição ou construção de casas e outras instalações. Os sócios podiam fazer contratos de consumo a crédito ou contrair empréstimos de dinheiro sendo que, no fim de cada ano, tinham direito a uma percentagem dos lucros líquidos da sociedade, de acordo com o nível de consumo efectuado.
Da sua fundação até 1903, a venda dos produtos efectuou-se nas instalações da própria Fábrica, data a partir da qual se transferiu para um edifício em Barcarena. Aqui passaram a prestar-se diversos serviços, tais como: carvoaria e saboaria, padaria, mercearia, arrecadação de géneros, artigos de retrosaria, fancaria, ferragens e quinquilharia, drogas e tintas, sapataria, vassoureiro, louças (de folha ou barro), artigos de escritório, tabaco, fósforos e papel, artigos de verga e até móveis de armação. Merece um especial destaque a construção da padaria, erguida pela mão dos próprios sócios e pela Associação dos Bombeiros Voluntários Progresso Barcarenense.
Mais do que uma instituição económica, a Cooperativa foi uma forma de organização social, uma colectividade de operários que visava combater as injustiças sociais, impondo a igualdade de acolhimento como um dos seus princípios de actuação. A sua comunhão e ligação à comunidade era de tal modo forte que se tornou um ponto referencial de encontro, para homens e mulheres, ao longo de várias gerações. Na taberna juntavam-se os homens, que discutiam as últimas novidades e conjecturavam as suas reivindicações; ao balcão da mercearia, cruzavam-se as mulheres. Funcionava um pouco como uma família alargada, pois não só congregava a comunidade em seu redor, como conferia segurança e ajuda, tanto no dia-a-dia como em épocas de crise.
Para os sócios que residiam longe da sede, a Cooperativa dispunha de um serviço de distribuição de géneros ao domicílio o que, mais tarde (em 1952), veio a ser colmatado pela criação de uma sucursal que funcionou nas instalações da Fábrica até ao seu encerramento (1988) garantindo, assim, que todos os operários pudessem aceder aos seus produtos e benefícios.
Gerir a Cooperativa não se limitava à execução das contas, ao abastecimento e à manutenção da casa. A direcção tinha um papel importante na angariação de novos associados, chegando a conseguir 320 no final dos anos 40 do século XX.
Na segunda metade do século passado, sobretudo a partir da década de 70, verificaram-se melhorias significativas nas condições de vida da população e uma maior facilidade na procura de novos postos de trabalho fora de Barcarena.A própria Fábrica começou a registar um declínio, agravado com a grande explosão registada em 1972, no edifício das Oficinas a Vapor, que paralisou definitivamente a produção da pólvora negra e conduziu à reforma ou transferência de muitos trabalhadores.
Este esvaziamento da Fábrica fez-se sentir na Cooperativa. Se os tempos de mudança registavam um melhor padrão de vida, começava a ser impossível superar a concorrência.
Numa última tentativa de viabilizar esta sociedade, em 1969, a sua participação alargou-se a toda a comunidade. É assim que surge a Cooperativa de Consumo A Familiar de Barcarena, que não conseguiu a adesão desejada. O fraco consumo não permitia manter a casa aberta e as dívidas foram-se acumulando.
Em 1986, o seu encerramento foi discutido no decorrer de várias assembleias-gerais, tendo ficado decidido entregar o edifício à Câmara Municipal de Oeiras.Através de um edital datado de 25 de Julho de 1989, a Câmara Municipal de Oeiras adquire o edifício.
oeirascomhistoria.blogspot.pt
Sem comentários:
Enviar um comentário