Maria Lucília Estanco Louro
(1922-2018)
Uma antifascista que foi professora e activista política. Cidadã por inteiro, muito prestigiada, com 96 anos, a sua energia e a grande abertura intelectual impressionam quem acaba de a conhecer.
Atravessou o fascismo estando presente em todos os combates, com o mesmo ânimo, a mesma boa disposição e a serenidade com que a encontramos em iniciativas do tempo presente.
Professora e activista política
Nasceu em Beja em 27 de Janeiro de 1922, filha de Albertina Emília Freire e de Manuel Francisco Estanco Louro. Pertence a uma geração única que em tempos sombrios soube, corajosamente, conciliar a docência e a intervenção cívica com o combate militante à ditadura do Estado Novo.
Maria Lucília Estanco Louro é licenciada em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em 1944, com a tese Paul Gauguin visto à luz da Caracterologia – Vida e Obra (que suscitou polémica por ser a primeira a versar sobre Arte, considerada então uma parente pobre da História).
Fez parte da direcção da «Associação Feminina Portuguesa para a Paz» (AFPP) entre 1940 e 1944. Com Cândida Ventura, colega da Faculdade de Letras de Lisboa, colaborou na mobilização de artistas, escritores, actores e poetas para intervirem nas sessões culturais e pacifistas que a AFPP promovia[1].
Participou, no início da década de 1940, nos passeios de barco no “Liberdade”. Passeios culturais e políticos realizados no rio Tejo[2].
Posteriormente, já professora do Liceu, apoiou a campanha de Humberto Delgado (1958) e subscreveu as listas da Oposição Democrática.
O seu empenhamento profissional (pedagógico-didático) não é menos intenso e relevante. Em 1948 fez Exame de Estado no Liceu Pedro Nunes com a tese Filosofia – Valores Éticos e Estéticos. Leccionou nos Liceus de Faro, Beja, Évora, Oeiras, Lisboa (D. Leonor, D. João de Castro, Passos Manuel e Pedro Nunes) e na Escola do Magistério Primário de Évora. Foi orientadora de Estágios Pedagógicos nos Liceus de Oeiras, Pedro Nunes e Passos Manuel, entre 1973 e 1976.
Grupo num dos históricos passeios no Tejo no barco «LIBERDADE» (1942). Vêem-se Alves Redol, Lopes Graça, Francisco Pulido Valente, Alfredo Soeiro Pereira Gomes, Sidónio Muralha, Maria Luccília Estanco Louro, Manuel Lima, Arquimedes da Silva. (Maria Lucília está de lado, na direcção do mastro)
Na parte de trás do barco que está em primeiro plano, sentados, estão Manuel da Fonseca (de chapéu), Sidónio Muralha e Maria Lucília Estanco Louro. Em pé está um dos tripulantes. Ao lado da Maria Lucília está o Carlos Alberto Lança.
Participou nos Colóquios de História e de Filosofia realizados em 1959, no Liceu Pedro Nunes, que pela ousadia da sua promoção e pelo prestígio dos intervenientes[3] representavam uma luta pela actualização e dignificação dos conteúdos pedagógicos e informativos dos ramos abrangidos. Dentro do mesmo combate ao ensino orientado pelo Estado Novo e veiculado pelos compêndios fascizantes, participou nas reuniões de professores progressistas (1970 a 1974), realizadas na semi-clandestinidade na Escola Francisco Arruda[4]. Frequentou os Cursos de Aperfeiçoamento Profissional orientados pelo Professor Rui Grácio no Sindicato dos Professores; e cursou, em 1975, o 10.º Curso de Pós-Graduação em História de Arte, instituído pelo Professor José Augusto França na Universidade Nova de Lisboa.
Continua no combate politico depois do 25 de Abril
Após o 25 de Abril, interveio activamente, com diversos outros docentes, numa Comissão presidida por Maria Emília Diniz com o intuito de acabar com os velhos programas e actualizá-los com tudo o que tinha ocorrido na investigação e na metodologia. Estes novos programas foram divulgados em cadernos de apoio editados pelo Ministério da Educação, substituindo os antigos compêndios do 6.° e 7.° anos (julgados demasiadamente revolucionários, foram entretanto abolidos).
Realizou inúmeras palestras, participou em colóquios, escreveu artigos e colaborou em publicações. Redigiu várias entradas no Dicionário de História de Portugal, dirigido pelo Professor Joel Serrão, e a convite deste.
Dos muitos escritos dispersos, é de mencionar “O Jovem Piteira” (Fernando Piteira Santos), publicado no Jornal de Letras, por se referir “a alguém cuja inteligência, sólida formação cultural (especialmente política) e fulgurante lucidez e poder de comunicação marcaram os jovens da sua geração, seus colegas na Faculdade de Letras de Lisboa nos anos 40”.
A sua competência, profissionalismo, dedicação e intervenção cívica, quer sob condições políticas adversas, quer após a Revolução de Abril, podem ser testemunhados pelos seus antigos alunos, muitos dos quais tornadas figuras públicas[5].
Partido e Movimentos a que pertence
A partir dos anos 70, entrou para o Partido Comunista Português; tornou-se sócia da Associação de Amizade Portugal-Cuba; e membro do Conselho Português para a Paz e Cooperação.
Pertence a uma geração única que dedicou décadas da sua vida na luta contra a ditadura e, coerentemente, continua, dentro das suas possibilidades, a manifestar o mesmo empenho político e cívico.
O Movimento Cívico Não Apaguem a Memória (NAM) homenageou-a no ano do seu 90º aniversário, por ocasião do «5 de Outubro» de 2012.
Fotografia da homenagem que lhe foi feita pelo NAM no Teatro da Academia de Santo Amaro, em 2012.
NOTAS
[1] Na sede da Associação, na Rua D. Pedro V, ao Príncipe Real, organizavam pequenos pacotes com cigarros e géneros que mandavam, em colaboração com o “Socorro Vermelho Internacional”, para os prisioneiros nos campos de concentração. Ainda no âmbito das actividades da AFPP, no dia 9 de abril, data da Batalha de La Lys, costumavam, depositar ramos de flores no monumento aos mortos da Grande Guerra.
[2] Esses passeios contavam com (entre muitos outros): Alves Redol, Soeiro Pereira Gomes, Lopes Graça, Sidónio Muralha, Campos Lima e Álvaro Cunhal.
[3] Professores Delfim Santos, Vieira de Almeida, Rui Grácio, Joel Serrão (entre outros).
[4] Foram os Grupos de Estudo (GEPDES) que vieram a estar na origem dos sindicatos de professores nascidos em 1974.
[5] Entre os seus alunos contam-se: Ana Maria Magalhães; António Damásio; António Torrado; Diogo Freitas do Amaral; Guilherme de Oliveira Martins; Joaquim Benite; Joaquim Letria; Joel Hasse Ferreira; Jorge Martins; José Meco; José Viana da Mota Brandão, Maria Beatriz Ruivo; Miriam Halpern Pereira; Maria Ângela de Sousa; Maria José Moura; Mário Vieira de Carvalho; Norberto Barroca; Rui Vieira Nery.
[2] Esses passeios contavam com (entre muitos outros): Alves Redol, Soeiro Pereira Gomes, Lopes Graça, Sidónio Muralha, Campos Lima e Álvaro Cunhal.
[3] Professores Delfim Santos, Vieira de Almeida, Rui Grácio, Joel Serrão (entre outros).
[4] Foram os Grupos de Estudo (GEPDES) que vieram a estar na origem dos sindicatos de professores nascidos em 1974.
[5] Entre os seus alunos contam-se: Ana Maria Magalhães; António Damásio; António Torrado; Diogo Freitas do Amaral; Guilherme de Oliveira Martins; Joaquim Benite; Joaquim Letria; Joel Hasse Ferreira; Jorge Martins; José Meco; José Viana da Mota Brandão, Maria Beatriz Ruivo; Miriam Halpern Pereira; Maria Ângela de Sousa; Maria José Moura; Mário Vieira de Carvalho; Norberto Barroca; Rui Vieira Nery.
Dados biográficos:
- Biografia publicada por João Esteves no blogue “Silêncios e Memórias”
- António Aniceto Monteiro – Centenário do seu nascimento
https://www.jornaltornado.pt
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