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terça-feira, 4 de outubro de 2016

AS SUFRAGISTAS – A MULHER E O DIREITO AO VOTO/O voto das mulheres em Portugal

Inserida com direitos iguais na sociedade ocidental, a mulher atual está longe da opressão que sofreu ao longo dos tempos. Leitura, estudo, trabalho, voto, pílula anticoncepcional, ou mesmo o direito de usar calças e biquínis, coisas corriqueiras do cotidiano, foram motivos de longas batalhas femininas.

Durante alguns milênios, a participação da mulher na sociedade foi legada ao princípio da procriação e de coadjuvante do homem. Por séculos não lhes era permitido sequer o aprendizado da leitura, estando elas resignadas aos trabalhos no campo e em casa.
Com a industrialização, a mulher foi obrigada aos poucos, a se lançar no mercado de trabalho, adquirindo mais relevância nas decisões sociais do lugar de onde estava inserida. Direito à leitura, à educação, ao trabalho, ao voto e à sexualidade foram batalhas árduas, com vitórias relativamente recentes na cronologia da história das civilizações.
Uma das maiores vitórias femininas ao longo dos tempos foi o direito ao voto. Uma luta que se travou por quase um século, através de movimentos feministas que foram, no fim do século XIX, chamado de sufragistas. Com vitórias lentas, mas conclusivas, as sufragistas foram, aos poucos, ganhando o direito de voto por todos os países do planeta.
O primeiro país a conceder o direito de voto às mulheres foi a Nova Zelândia, em 1893. Desde então, as sufragistas foram às ruas das principais cidades do planeta, exigindo a participação das mulheres nas decisões políticas dos seus países. Só a partir da década de 1920 é que as nações ocidentais foram, aos poucos, dando direito ao voto às sufragistas. Ainda em pleno século XXI, alguns países de costumes mais conservadores, não permitem o voto feminino, as mulheres locais, continuam uma batalha igual à que viveram as do fim do século XIX e início do século XX.
A Evolução dos Direitos Femininos
Nas civilizações mais organizadas da humanidade, a mulher tinha sempre um papel fundamental dentro da casa, demarcando a sua importância na capacidade de gerar os filhos dos homens, servindo-lhes de alicerce invisível, sem jamais se sobressaírem a eles. Mesmo em civilizações consideradas mais avançadas, como a grega, a mulher era intelectualmente bastante limitada, sendo a sabedoria uma das virtudes tida como impossível ao caráter feminino.
A Revolução Industrial ocasionou um grande êxodo do campo para as cidades. Viver num centro urbano envolvia mais o homem com os problemas políticos do seu país, obrigando-o a ter maior participação nas decisões, até então comandadas por uma minoria milenar. Aos poucos, o homem da era industrial passou a conquistar direitos de sufrágio e trabalhistas que se lhe tornaram perpétuos. Com o colapso dos grandes impérios, a formação de países com governos eleitos, o direito ao voto pelo homem, na escolha de quem o iria governar, passou a ser universal .
Na conquista desses direitos, a mulher foi relevada ao segundo plano, apesar de começar a ser usada como mão-de-obra nas fábricas. Não tinham quaisquer direitos. Já na segunda metade do século XIX, os países mais desenvolvidos como a Inglaterra, tinha uma elevada população feminina solteira, mudando a face do processo matrimonial. As várias guerras travadas pelas nações européias, entre elas a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), obrigaram um número cada vez maior de mulheres substituindo a mão de obra masculina, visto que os homens partiam para os campos de batalha, sendo muitos feridos, mutilados ou mortos.
Esta participação feminina feita quase que compulsivamente às mudanças bruscas dos tempos, aguçou o sentindo de participação da mulher e a vontade de também poder opinar nas decisões civis e na escolha dos governantes. Diante da opressão da sociedade patriarcal, que negavam direitos básicos às mulheres, surgiram os primeiros movimentos feministas do século XIX. Com eles, surgiram as sufragistas, cuja principal reivindicação era o direito ao voto.
Nova Zelândia, Primeiro País a Conceder o Voto Feminino
A luta pelo direito da mulher ao voto só foi possível graças aos movimentos feministas surgidos no século XIX. O ponto inicial desses movimentos foi a Convenção dos Direitos da Mulher, realizada em Seneca Falls, no Estado de Nova York, Estados Unidos, em 1848. Durante o encontro, Susan Brownell Anthony e Elizabeth Cady Stanton, lideraram o início de uma luta pelo fim da escravidão nos Estados Unidos.
Susan Brownell Anthony tinha como idéia inicial inserir na luta a aprovação de uma emenda que desse o direito de voto às mulheres. A sua proposta sofreu grande dificuldade para ser aceita, fazendo com que as mulheres só assumissem a luta pelo fim da escravidão. Durante a Guerra Civil, Susan liderou a campanha que angariou quatrocentas mil assinaturas dos cidadãos norte-americanos, culminando com o a aprovação da emenda que extinguiu a escravidão naquele país. Foi a primeira vitória de um movimento feminino.
Em 1869, o território do Wyoming tornou-se pioneiro em permitir o direito ao voto feminino nos Estados Unidos. Três outros estados norte-americanos seguiriam o exemplo e, posteriormente, aprovariam o direito das mulheres ao voto, sendo eles Utah, em 1870; e, Colorado, em 1893. A aprovação não foi um consenso nos Estados Unidos. Quando o Wyoming foi elevado de território à Estado, parte da União exigiu a abolição do direito. O governo local declarou que preferia retardar cem anos a entrada do Wyoming para a União do que retardar os direitos políticos femininos. 
Susan Brownell Anthony, Lucy Stone e Elizabeth Cady Stanton concentraram a sua luta através da Associação Nacional Americana pelo Sufrágio da Mulher (National American Woman Suffrage Association), surgida em 1890, promovendo frenéticas campanhas pelo direito de votar. Nenhuma das três assistiriam em vida à aprovação do voto feminino. Lucy Stone faleceria em 1893; Elizabeth Cady Stanton, em 1902; e, Susan Brownell Anthony, em 1906. Ainda no século XIX, o Estado do Idaho aprovaria o voto feminino, em 1896.
Enquanto a luta feminina pelo voto nos Estados Unidos percorria um tumultuado caminho, um país da distante Oceania, a Nova Zelândia, tornava-se, em 1893, o primeiro do mundo a conceder o direito de voto à mulher, reafirmando os direitos políticos que elas tinham no âmbito municipal desde 1886.
As Sufragistas Britânicas
Paralelamente às lutas feministas nos Estados Unidos e na Oceania, na Europa os movimentos pelo direito da mulher ao voto foram intensos na Grã-Bretanha. Em 1866, o filósofo e jurista John Stuart Mill, apresentou ao Parlamento uma emenda assinada em conjunto por Sarah Emile Davis e por Garret Anderson, que dava direito às inglesas ao voto. A emenda foi derrotada por ampla maioria. Em 1884, uma nova emenda foi apresentada e novamente rejeitada.
O conservadorismo dos ingleses impedia que se aprovasse a emenda do voto feminino, apesar dele ser consentido para mulheres que fossem proprietárias, consideradas de forma legal como os homens. A luta tornou-se mais contundente, quando em 1897, a educadora Millicent Garret Fawcett e Lydia Becker fundaram a União Nacional de Sociedade de Sufrágio Feminino (National Union of Women’s Suffrage Societies – NUWSS).
A NUWSS, era uma associação de movimento inicialmente pacifista, mas a falta de resultados fez com que mudassem de estratégia. No início do século XX, as inglesas assistiram a outro país da Oceania a conceber o direito ao voto às mulheres, desta vez a Austrália, em 1901.
Espelhadas nos exemplos da Nova Zelândia e da Austrália, as inglesas radicalizaram. Em 1903, Emmeline Pankhurst rompeu com a NUWSS, criando a União Social e Política das Mulheres (Women’s Social and Political Union – WSPU), que por suas manifestações táticas de violência e sabotagem, passaram a ser chamadas pejorativamente de “suffragettes”, ou sufragistas. Elas promoviam incêndios a estabelecimentos públicos, ataques a casas de políticos e membros do Parlamento. Seus atos de protestos geraram uma violenta repressão por parte do governo, culminando com constantes prisões de suas líderes. Encarceradas, elas iniciaram uma greve de fome, interrompida pela administração carcerária com uma brutal alimentação à força. Os maltratos infringidos às sufragistas nas prisões, levaram a opinião pública a questionar a forma violenta do sistema carcerário britânico da época.
As manifestações públicas das sufragistas britânicas tornaram cada vez mais intensas e perigosas. Culminou com a atitude desesperada de uma das suas militantes, Emily Wilding Davison, que em junho de 1913, atirou-se na frente do cavalo do rei durante uma prova hípica, tornando-se a primeira mártir da luta pelo direito do voto feminino. O enterro da sufragista resultou em violentos protestos, causando quase que uma guerrilha urbana.
O Direito ao Sufrágio Feminino Espalha-se Pelo Mundo
Sem grandes manifestações ou protestos, outros países do mundo foram concedendo o voto feminino ao longo das primeiras décadas do século XX. Os países nórdicos da Europa foram os primeiros: a Finlândia, em 1906; a Noruega, em 1913; e, em 1915, a Dinamarca e a Islândia; sendo a Suécia o último país escandinavo a conceder o voto feminino, em 1918.
A Primeira Guerra Mundial levou os homens europeus para os campos de batalhas, obrigando as mulheres a exercerem os seus trabalhos nas fábricas. Tornando-se provedoras essenciais da família, as mulheres adquiriram maiores direitos, obrigando os governos de seus países à concessão do direito do voto a elas. Assim, o poder político foi tomando consistência. O voto feminino chegou à Holanda, em 1917; à Rússia, após a Revolução Bolchevique, em 1917; à Alemanha, em 1918; à Irlanda, em 1922; à Áustria, à Polônia e à Tchecoslováquia, em 1923.
A batalha árdua das sufragistas britânicas só teria a sua grande vitória em 1918, já no fim da Primeira Guerra Mundial, quando uma lei eleitoral foi promulgada, permitindo o voto às mulheres maiores de 30 anos. O direito pleno só viria dez anos depois, em 1928, quando foi promulgada a lei “Equal Franchise Act”, dando direito ao voto a todas as mulheres maiores de idade.
Nos Estados Unidos, alguns estados foram, através de consultas populares, permitindo o voto às mulheres: Washington, em 1910; Califórnia, em 1911; Arizona, Kansas e Oregon, em 1912; Montana e Nevada, em 1914. Em 1917, Jeanette Rankin foi eleita a primeira congressista norte-americana pelo Estado do Montana. Somente em 1920, seria aprovada a emenda constitucional que daria direito de voto às mulheres em todo o território americano.
Curiosamente, os países europeus de origem latina foram os últimos a conceder o voto feminino. Em Portugal, excepcionalmente, em 1911, a médica e viúva Carolina Beatriz Ângelo, contornando as leis, foi a primeira mulher a votar. O direito ao voto feminino da portuguesa só viria em maio de 1931, com várias limitações impostas, sendo só permitido plenamente após a Revolução dos Cravos, em 1974.
A Espanha permitiria o voto feminino em 1931. A França e a Itália somente após a Segunda Guerra Mundial, em 1945. A Suíça em 1971.
Na América Latina, o primeiro país a conceder o voto feminino foi o Equador, em 1929. Na Argentina, o voto feminino só viria em 1947, conseguido através de uma campanha liderada pela então primeira dama do país, Eva Perón.
O Sufrágio Feminino no Brasil
Sem a efervescência dramática das feministas européias e norte-americanas, o movimento pelo voto da mulher no Brasil foi uma luta bem mais branda, curiosamente iniciada por um homem, o intelectual César Zama, que em setembro de 1890, propôs o sufrágio universal, incluindo o feminino, durante a elaboração da primeira constituição da República.
Em 1891, Almeida Nogueira, outro constituinte, voltou a defender o voto feminino. Em janeiro daquele ano, 31 constituintes assinaram uma emenda ao projeto de Constituição, concedendo o voto à mulher. A rejeição à emenda foi imediata, tão violenta, que foi retirada. Se tivesse sido aprovada, o Brasil teria sido o primeiro país do mundo a conceder o voto feminino, antecipando-se à Nova Zelândia, que o faria em 1893.
No despertar do século XX, o desejo da mulher brasileira em votar manifestava-se em casos isolados como em Minas Gerais, em 1905, onde três mineiras alistaram-se e votaram.
A baiana Leolinda de Figueiredo Daltro é considerada a pioneira da luta feminina pelo voto no Brasil. Em 1910, ela fundou a Junta Feminina Pró-Hermes da Fonseca, em apoio à candidatura do mesmo à presidência do país. Quando o seu candidato saiu vitorioso, intensificou a sua campanha para que se concedesse o direito de voto da mulher.
No correr do século, o então deputado Maurício Lacerda apresentou por duas vezes, em 1917 e em 1920, emendas à Constituição que instituíam o voto feminino, sendo ambas rejeitadas. Dois projetos de lei, um elaborado no senado em 1919, e outro na câmara em 1924, também não vingaram.
Os movimentos femininos afloraram no Brasil. Em 1922, Bertha Lutz fundou no Rio de Janeiro, a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, desenvolvendo uma importante campanha para que se fosse implantado os direitos eleitorais e políticos da mulher.
Em 1928, o Rio Grande do Norte tornou-se o Estado pioneiro em conceder o direito de voto à mulher. Naquele ano, as potiguares Celina Vianna Guimarães e Julia Barbosa foram as primeiras mulheres alistadas como eleitoras brasileiras. Ainda no Rio Grande do Norte, em 1928, a votação histórica no município de Lages, deu vitória a Alzira Teixeira Soriano, primeira prefeita do Brasil, eleita pelo Partido Republicano. A prefeita não terminaria o seu mandato, pois a Comissão de Poderes do Senado Federal, analisou as eleições naquele estado nordestino, pedindo a anulação de todos os votos que foram dados às mulheres.
O direito ao voto feminino no Brasil só seria obtido em 24 de fevereiro de 1932, através do Decreto nº 21.076, instituído no Código Eleitoral Brasileiro. O voto só era concedido às mulheres casadas e com a autorização do marido, limitando as viúvas e as solteiras, que só poderiam exercer o sufrágio se tivessem renda própria. As restrições só seriam eliminadas no Código Eleitoral de 1934, que ainda assim, não tornava o voto feminino obrigatório. Somente em 1946, com a promulgação de uma nova constituição naquele ano, o voto feminino perdeu totalmente às restrições, passando a ser obrigatório.
Ainda hoje, em pleno século XXI, as mulheres são minorias na vida política brasileira, com um número irrisório a ocupar cargos políticos. Mesmo diante deste desequilíbrio, têm os mesmos direitos que os homens. No mundo, algumas já se tornaram presidentes e ministras dos seus países. Já se distancia a época em que as sufragistas eram presas, faziam greve de fome ou atiravam-se em frente a um cavalo. Em contrapartida, muitos países no mundo, como o Kuwait, ainda negam o sufrágio às suas mulheres.
jeocaz.wordpress.com

O voto das mulheres em Portugal

Carolina Beatriz Ângelo, a primeira mulher a votar em Portugal, contra a vontade dos dirigente da I República portuguesa

A I República portuguesa não permitiu o sufrágio feminino. Lembre-se que o regime republicano concedeu, em 1911, o direito aos portugueses com mais de 21 anos que soubessem ler e escrever e aos chefes de família, sem especificar o sexo dos eleitores. Esse argumento foi utilizado por Carolina Beatriz Ângelo, que era viúva e chefe de família, para votar, mas, a partir de 1913, o regime republicano especificou que só os «chefes de família do sexo masculino» podiam eleger e ser eleitos.
Curiosamente, foi o regime de ditadura militar surgido do golpe de 28 de Maio de 1926 que atribuiu à mulher portuguesa «chefe de família» o voto nas eleições para as juntas de freguesia – não para as câmaras municipais –, sendo a sua capacidade eleitoral determinada unicamente em função da chefia da família. Em 1931, o Decreto n.º 19 694, de 5 de Maio, estipulou que «as mulheres, chefes de família viúvas, divorciadas ou separadas judicialmente e tendo família a seu cargo, e as mulheres casadas cujo marido está ausente nas colónias ou no estrangeiro» podiam pertencer a corporações administrativas inferiores.
Ao entrevistar António de Oliveira Salazar, o recém-nomeado presidente do Ministério, em 1932, António Ferro quis saber a opinião do ditador sobre os protestos femininos contra o voto familiar – concedido exclusivamente ao «chefe da família» e não a homens e mulheres enquanto indivíduos. Salazar respondeu que as portuguesas não tinham razão de queixa, pois o «estatuto constitucional» lhes reconhecia, «com as possíveis restrições, igualdade de direitos e, até, em certas condições, o direito ao voto» Em 1933, foi concedido o direito de voto para as juntas de freguesia às «solteiras, maiores e emancipadas, com família própria e reconhecida idoneidade moral e para as câmaras também a emancipada com curso secundário e superior e não só a maior de idade, o que também acontecia para as eleições presidenciais» (Decreto-Lei n.º 23 406, de 27 de Dezembro). Note-se que a capacidade eleitoral das mulheres, tal como a dos homens era determinada em função da chefia da família.
No ano seguinte, nova lei possibilitou o sufrágio feminino e a elegibilidade para a Assembleia Nacional e para a Câmara Corporativa às mulheres com mais de 21 anos, às solteiras com rendimento próprio ou que trabalhassem, e às chefes de família e às casadas com diploma secundário ou que pagassem determinada contribuição predial (Decreto-Lei n.º 24 631, de 6 de Novembro de 1934). Assim, 1934 foi o ano da eleição das três primeiras deputadas à Assembleia Nacional, Maria Guardiola, Domitília de Carvalho e Cândida Parreira, e também o ano em que o Estado Novo se tornou o primeiro regime português a abrir a mulheres a porta do Hemiciclo e a conceder o voto a algumas mulheres, embora tivesse continuado a persistir uma desigualdade entre eleitores e eleitas.
Essa situação prendeu-se com a forma como a ditadura portuguesa encarou na época o voto feminino. Havia a noção – e a esperança –, no seio do regime, de que «se as mulheres votassem, Salazar e o seu governo ganhariam sempre as eleições». Cândida Parreira explicou por que é que o «chefe» tinha entendido permitir o sufrágio feminino e a elegibilidade de algumas mulheres:
«Salazar pressentiu que para tal combate (contra a desmoralização) seria necessária energia superior à do homem. Onde iria encontrá-la? Só uma solução! A Mulher Cristã! [...] a Mulher Portuguesa! Salazar não hesita [...]. Escolhe as que podem colaborar, pela sua profissão, quanto à Família, Assistência e Educação. E abre-lhes as portas da Assembleia Nacional [...]. A política é só para os homens, dizem. Porquê? Só se é por ela ser feminina, já que tantos por ela se apaixonam. A política tem muitas afinidades com a mulher: diplomata, subtil, ora submissa ora voluntariosa [...]. O facto de haver pela primeira vez mulheres no Parlamento não quer dizer que só hoje haja mulheres políticas. A nossa história de oito séculos está cheia [...]. O auxílio da mulher tornava-se mais que necessário, tornava-se indispensável. Assim o entendeu o Chefe, assim o decretou!» (subl. nossos).
O voto feminino não foi, assim, conquistado pelas mulheres mas «decretado» pelo «Chefe», que o concedeu não por considerá-lo um direito mas porque pensou que algumas mulheres escolhidas, da elite estado-novista, serviriam os propósitos do regime nos campos estritamente a elas reservados: a assistência e a educação. No fundo, as mesmas razões que levaram a República a recusar o voto feminino, possibilitaram a sua concessão nos anos trinta, para servir a luta pela «moralização» e pela «recristianização». Este objectivo também foi partilhado pela Igreja Católica, cuja imprensa enalteceu, aliás, a intervenção das deputadas na Assembleia Nacional.
O Código Administrativo de 1936, que regulamentou as normas para as freguesias e câmaras, considerou «chefe de família» o «cidadão português com família legitimamente constituída vivendo em comunhão de bens e de habitação» e a «mulher portuguesa, viúva, divorciada ou judicialmente separada de pessoas e bens, ou solteira, maior ou emancipada, de reconhecida idoneidade moral, que viva inteiramente sobre si e tenha a seu cargo descendentes, ascendentes e colaterais». Em 1945, o Decreto-Lei n.º 34 938, de 22 de Setembro, reafirmou, no seu art. 4.º, os pressupostos do Decreto-Lei de 1933 segundo o qual só as mulheres com curso secundário ou superior podiam votar. A Lei n.º 2015, de 28 de Maio de 1946 alargou o corpo eleitoral feminino, considerando eleitoras para a Assembleia Nacional e para a Presidência da República as mulheres maiores e emancipadas, com curso geral dos liceus, do Magistério Primário, das Belas-Artes, do Conservatório Nacional e do Conservatório de Música do Porto e dos institutos comerciais e industriais, as chefes de família (divorciadas, viúvas, judicialmente separadas e solteiras) que soubessem ler e escrever ou pagassem ao Estado quantia não inferior de 100$00 por impostos directos, e as casadas alfabetizadas ou que pagassem contribuição predial não inferior a 200$00. Eram eleitores os homens que soubessem ler e escrever ou que pagassem pelo menos 100$00 por ano ao Estado.
Ainda durante o regime ditatorial português, já no período da chefia do governo por Marcello Caetano, a Lei Eleitoral n.º 2317, de 26 de Dezembro de 1968 tentou diminuir a discriminação sexual, com o alargamento do número de votantes a todos os que soubessem ler e escrever.

No entanto, só depois do 25 de Abril de 1974, com a lei n.º 621/74 de 15 de Novembro, o direito de voto se tornou universal em Portugal.
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