A greve que protege os emigrantes e o país
MARIANA MORTÁGUA
Ao avançar para a requisição civil, o Governo veio reconhecer que a TAP não é uma empresa como as outras.
Em quantas empresas não estratégicas é que o Governo decretou a requisição civil? Em nenhuma, claro.
E essa é a maior prova, por um lado, da centralidade da empresa para a economia e, por outro, dos perigos
decorrentes da sua privatização.
O mesmo governo que avança para a requisição civil na TAP, alegando a sua importância estratégica para a
economia e para os emigrantes que "não têm alternativa para se deslocarem a Portugal", quer privatizar a
operadora aérea nacional e não tem pejo em colocar em causa a presença da TAP junto das comunidades
portuguesas.
Não julguem que é exagero ou cliché. Nem é preciso irmos muito longe. Olhemos aqui ao lado, para o que
aconteceu depois da privatização da Iberia. Uma das primeiras decisões dos novos donos foi a supressão de
rotas históricas, essencialmente na América Latina. Olhemos para trás. Se, no início da década, Guterres
tivesse vendido a TAP à Swissair, hoje a TAP faria parte de uma empresa falida.
Diz o Governo que avança com uma requisição civil, de contornos legais mais do que duvidosos, para
assegurar a tranquilidade do natal de milhares de famílias. E a reunião familiar natalícia no próximo ano,
quem a protege se a empresa for privatizada a um qualquer fundo abutre? E no ano seguinte? E daqui a 10
anos? Quem é que a protege? Os trabalhadores em greve.
Os argumentos do Governo não se aguentam dois segundos porque o interesse desta privatização, feita à
pressa e quando o Governo está em fim de mandato, não tem nada a ver com critérios económicos, de
eficácia ou gestão. É o fanatismo ideológico de quem é contra tudo o que é público e aí encontra uma
oportunidade de negócio.
Nunca é demais lembrar a importância da TAP. É a companhia que fala a nossa língua onde quer que
estejamos. É a companhia que junta o continente às ilhas e o país todo aos seus emigrantes. É a companhia
que, sempre que há portugueses em risco em qualquer canto do mundo, os vai resgatar em segurança.
Isto acontece porque é uma empresa nacional de capitais públicos.
Todos estes serviços estarão em causa com a privatização da empresa. Que interesses manterão os capitais
sabe-se lá de onde na ligação às ilhas ou aos países onde temos comunidades emigrantes?
Aí já não interessa o Natal e o impacto dos emigrantes na economia nacional?
Claro que o Governo nos vai dizer que, no fabuloso acordo de serviço público que irá assinar, vai garantir
que os interesses dos cidadãos vão ser acautelados. Na verdade já disse isso com a ANA ou com os CTT.
O que é que aconteceu? No primeiro caso as tarifas aéreas subiram várias vezes num ano,
aumentando 33%, enquanto os correios se entretêm a tentar impingir créditos ao consumo com juros
abusivos e insustentáveis.
O governo tenta intoxicar a opinião pública, apresentando-se como o defensor da reunião familiar contra os
madraços dos trabalhadores apresentados como inimigos dos interesses nacionais. Nada mais falso.
O governo é responsável pela emigração, sim. Mas quem protege o que é nosso, e o nosso futuro como
entidade coletiva, são os trabalhadores da TAP que se unem em greve. Merecem o nosso respeito. E apoio.
: http://expresso.sapo.pt/
1 comentário:
Artigo muito bom, devia ser de bitola a este (des)governo, para ter em conta outras privatizações que já concretizou e que em nada melhoraram os serviços, pelo contrário, pioraram e encareceram, ainda por cima com despedimentos.
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