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sexta-feira, 27 de setembro de 2019

LIMITES E RESTOS/ APRENDIZES DE LENINE ?



Limites e restos


No dia de uma grande acção de massas do movimento ecologista, recupero uma sugestiva formulação de George Monbiot: “Não é inteiramente verdade que por detrás de uma grande fortuna esteja um grande crime (…) mas parece ser universalmente verdadeiro que à frente de uma grande fortuna está um grande crime”. Isto é assim, dado que “a riqueza imensa se traduz automaticamente em impactos ambientais imensos, independentemente das intenções dos seus possuidores”.
A evidência empírica de que “os mais ricos estão a cometer ecocídio” acumula-se tão ou mais rapidamente do que a concentração de riqueza. Monbiot faz um bom trabalho a sistematizá-la. Realmente, não é possível começar a resolver a questão ambiental sem limitar o rendimento e a riqueza que é possível acumular: do consumo conspícuo ao bloqueio de soluções cooperativas. Quando pensamos em limites, pensamos pelo menos para lá do capitalismo neoliberal.
A questão social e a questão ambiental estão profundamente articuladas, como também nos indica o Papa Francisco. Os neoliberais sabem que cada vez mais verão as coisas por este prisma e daí o seu ódio de morte aos mensageiros da catástrofe ambiental iminente. A crónica vil de João Miguel Tavares sobre Greta Thumberg é só um exemplo do estado a que chegou o neoliberalismo realmente existente. Um jornal que publica coisas destas pode ser tudo menos referência para o que quer que seja de civilizado. No Público é aliás assim: Manuel Carvalho diz matem e João Miguel Tavares diz esfolem os aprendizes de Lenine. Não resta mais nada aos autointitulados liberais.

Aprendizes de Lenine?



Aparentemente, anda um espectro de novo a pairar por aí: o do revolucionamento que será necessário no modo de produção para enfrentar a catástrofe ambiental iminente. Um economista convencional um dia definiu-a como a maior falha do mercado da história da humanidade. As soluções económicas convencionais – andar a brincar aos mercados de emissões ou às taxas e taxinhas – ou não funcionam ou estão longe de chegar.

Neste contexto, a jovem Greta Thumberg fez um discurso pungente na cimeira sobre a acção climática das Nações Unidas. Apreciei particularmente a sua denúncia do dinheiro como um dos obstáculos à tal mudança. Afinal de contas, lembrem-se dos efeitos do nexo-dinheiro, expostos brilhantemente num Manifesto espectral de 1848.Num editorial com laivos do habitual anticomunismo primário, talvez com efeitos contrários às intenções do seu autor, Manuel Carvalho até confessava ontem no Público ter levado também “um murro no estômago” de Thumberg. Mas a sua “pose e insolência”, o seu radicalismo, fê-lo lembrar, vejam lá do que esta gente se lembra, um “qualquer aprendiz de Lenine do século passado”. Esta gente anda teme “o radicalismo jacobino”.
No fim do arrazoado, Carvalho até acaba a reconhecer que sem este radicalismo, ao qual só falta enfatizar mais a classe e menos a geração, “as soluções equilibradas” não serão possíveis. O medo, sempre o medo da revolução, está na base de uma certa política económica. Irá um dia este neoliberal converter-se ao Green New Deal, um plano que nestes tempos sombrios ainda parece uma utopia de um punhado, ainda que crescentemente influente, de democratas socialistas na América?
Entretanto, aprender com alguns aspectos da vida e obra de Lenine é capaz de não ser mesmo má ideia: organização consequente, análise concreta da situação concreta, avaliação precisa da correlação de forças, valorização da política de classe, identificação dos elos mais fracos da cadeia imperialista, prontidão para aceder ao poder, pugnando por um socialismo que terá de ser igual a sovietes, uma democracia avançada, mais electrificação de todo o país, agora com base em renováveis.
Ou alguém pensa que será possível enfrentar a catástrofe iminente sem uma valorização do comum, sem muito menos desigualdade, sem formas de planificação exigentes, e que implicam controlo público das redes, da banca, das grandes alavancas de investimento, sem uma certa desglobalização dos circuitos económicos, enfim, sem uma nova política económica?

ladroesdebicicletas.blogspot.com

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