Em Portugal, andamos distantes daquilo que se passa na política francesa, mas qualquer dia a realidade entra-nos estrondosamente pelos olhos. Porque aquilo que se passa hoje no hexágono terá fortes repercussões na Europa. Tempos intranquilos, estes.
A França política anda inquieta. O Eliseu tem um inquilino inábil em gerir o mais alto cargo de uma nação. François Hollande chega ao fim do seu quinquénio como presidente com índices de popularidade baixíssimos. Por este tempo, fez editar um livro que mais parece uma iniciativa de opositores perspicazes. Durante longos meses, conversou aberta e demoradamente com dois jornalistas sobre os mais diversos tópicos, atirando imponderados vitupérios em múltiplas direções, embora tivesse escolhido como alvo preferencial das suas críticas Nicolas Sarkozy com quem pensava disputar as eleições presidenciais do próximo ano. Os autores da obra elegeram para título dessa insólita publicação "Um presidente não deveria dizer isso" e essa opção tem funcionado como um ricochete no próprio. Até mesmo aquele que se constituiu como mote de todas as censuras já não pertence ao atual xadrez político. François Hollande parece não acertar em nada.
Nicolas Sarkozy vive agora igual tormenta. O partido que refundou, Os Republicanos, expulsou-o impiedosamente de cena no último fim de semana. Na primeira volta das primárias para escolher o candidato do partido de Direita à Presidência, os quatro milhões de votantes optaram por François Fillon (uma verdadeira surpresa) e Alain Juppé (o candidato apontado como preferido) para disputar a segunda fase. O primeiro somou 44 por cento e o segundo 28,5 por cento dos votos. O resultado final do próximo domingo não é difícil de prever, mas isto de diagnósticos eleitorais é um cálculo cada vez mais arriscado. Perante o atual cenário político, é provável que as eleições presidenciais do próximo ano sejam disputadas entre os candidatos dos partidos Os Republicanos e Frente Nacional. E isso não são boas notícias para a Europa.
Com intenções de voto entre os 20 e os 30 por cento, Marine Le Pen impõe-se progressivamente para as urnas gaulesas de 2017. Aqui a incógnita é quem poderá ir com ela a jogo, pois o seu nome converte-se cada vez mais numa certeza em caso de segunda volta. Ora, com um Partido Socialista mergulhado numa colossal dificuldade em apresentar uma candidatura forte, a alternativa terá de surgir da Direita.
As primárias do próximo domingo poderão ditar Alain Juppé, o candidato mais diferenciador de Le Pen, mas com uma idade que não lhe permite grande fôlego e, acima de tudo, com um passado político pouco recomendável, na medida em que foi condenado em 2004 por uso indevido de fundos públicos como poderão impor François Fillon, o candidato de Direita mais conservador que é contra o casamento homossexual, a legalização do aborto e a imigração. Ontem, "L"OBS" apresentava-o como um ultraliberal, próximo das políticas de Trump e amigo de Putin... Marine Le Pen terá certamente dificuldade em distanciar-se deste perfil e o eleitorado também não conseguirá explicar porque votaria num ou noutra...
Há ainda outros candidatos. Emmanuel Macron é aqui o mais bem posicionado. O truculento ministro da economia de François Hollande saiu antecipadamente do Governo para dinamizar o movimento "Em marcha" que já anunciou mais de cem mil adesões. Jogando ao Centro, eis alguém que ambiciona subtrair votos à Direita e capitalizar os que estão ao Centro. Más notícias para Os Republicanos e mesmo para a Frente Nacional. Envolvido numa dinâmica campanha para a sua candidatura ao Eliseu, Macron visitará proximamente Nova Iorque e, a 10 de dezembro, estará em Paris para um grande comício, no dia em que fontes não identificadas do Partido Socialista asseguram o anúncio da recandidatura do atual presidente. Eis uma corrida incerta para todos. E o desfecho do escrutínio ditará igualmente um futuro imprevisível para uma Europa em crise.
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