Poeta, autor dramático, cientista e historiador, nasceu a 24 de novembro de 1906, na cidade de Lisboa, e aí morreu a 19 de fevereiro de 1997, na sequência de uma operação cirúrgica delicada.
Personalidade multifacetada e homem de apurada cultura, licenciou-se em Ciências Físico-Químicas, na Universidade do Porto, e foi professor liceal para além de cientista, divulgador científico e investigador da História das ciências.
Com o seu nome próprio, Rómulo de Carvalho é autor de numerosos volumes de divulgação da cultura científica, publicados, nos anos 50 e 60, na coleção "Ciência para gente nova", da Atlântida nos anos 70, nos "Cadernos de iniciação científica", da Sá da Costa, a que seguiriam nas décadas posteriores vários manuais escolares. No domínio da História da ciência em Portugal, são marcantes estudos como História dos Balões e A Astronomia em Portugal no Século XVIII. Elaborou também a obra História da Educação em Portugal.
Já com cinquenta anos de idade, começou a publicar literatura, sob o pseudónimo de António Gedeão. É contemporâneo da geração de "Presença", mas só se revelou na segunda metade do século, sendo saudado, no momento da sua revelação, por David Mourão-Ferreira como uma voz "inteiramente nova" no panorama poético dos anos 50 (cf. Vinte Poetas Contemporâneos, 2.a ed., Lisboa, Ática, 1980, pp. 149-153). Para essa originalidade concorriam, entre outros traços, a incorporação das tradições do primeiro e segundo modernismos, a opção por um estilo rigorosamente cadenciado e ritmado, a expressão da inquietação e angústia coletivas do Homem do pós-guerra ou o recurso frequente a uma terminologia ou imagística provenientes do domínio científico. Jorge de Sena (cf. estudo introdutório à segunda edição de Poesias Completas, Lisboa, Portugália, 1968) e Fernando J. B. Martinho (cf. Tendências Dominantes da Poesia Portuguesa da Década de 50, Lisboa, Colibri, 1996, pp. 428-433) assinalam na poesia de António Gedeão a recorrência de dispositivos retóricos que permitem considerar no âmbito de um neobarroquismo a poesia do autor de Movimento Perpétuo.
Os poemas alcançaram grande popularidade, pela linguagem simples mas emotiva e carregada de uma inteligente sensibilidade, sempre atenta aos valores humanistas. É uma poesia que funde meios de expressão tradicionais com uma visão moderna do mundo, abordando a temática do sentimento da solidariedade, da denúncia do sofrimento e da própria solidão humana. Todo o ser do poeta se ergue num protesto denso de substância vital, e, sob este aspeto, a sua poesia deixa transparecer um compromisso direto, imediato e espontâneo com o drama social do homem e o segredo do mundo.
Vários dos seus poemas foram também divulgados através da música como, por exemplo, Calçada de Carriche, Fala do Homem Nascido, Lágrima de Preta e a canção Pedra Filosofal, composta e cantada por Manuel Freire, que teve um sucesso invulgar.
Por ocasião do seu nonagésimo aniversário, em 1996, Rómulo de Carvalho foi alvo de homenagens em vários pontos do país. Por decisão ministerial, a data do seu aniversário, 24 de novembro, passou a ser assinalada como o Dia da Cultura Científica.
Fontes: Infopédia
wikipedia (imagens)
Pedra Filosofal
Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.
Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.
Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.
Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.
Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.
Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.
Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.
António Gedeão, in 'Movimento Perpétuo'
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