A partir de 1970, a luta armada dos independentistas intensifica-se. O regime do Estado Novo, a mais antiga ditadura europeia, acabaria por ser deposto a 25 de abril de 1974, abrindo caminho para a descolonização.
Cartaz da FRELIMO publicado por ocasião da "Operação Nó Górdio", com a qual o general Kaúlza de Arriaga pretendia evitar a progressão da luta armada (1970)
1 de julho de 1970
Operação “Nó Górdio” em Moçambique
Lançada pelo general Kaúlza de Arriaga, comandante-chefe das Forças Armadas Portuguesas em Moçambique, a mais dispendiosa campanha militar portuguesa nesta província ultramarina ficou conhecida como operação “Nó Górdio.” Durou sete meses e mobilizou 35 mil militares. Inspirando-se na expressão “cortar o nó górdio”, que significa resolver um problema complexo de forma simples e eficaz, a campanha visava destruir as bases dos guerrilheiros independentistas, numa altura que se intensificava a atividade militar da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO). A operação termina com o desmantelamento de grande parte das bases e dos campos da FRELIMO no Planalto dos Macondes, no norte, mas não elimina o movimento independentista, que expandiu as suas ações mais a sul.
27 de julho de 1970
Morte de Salazar
A 27 de julho, morre em Lisboa, com 81 anos de idade, António de Oliveira Salazar, o principal responsável pelo regime fascista que durou 41 anos em Portugal. Estava doente há cerca de um ano e meio e já não podia desempenhar as funções de Presidente do Conselho de Ministros. No início de julho, o Papa Paulo VI recebeu os dirigentes do Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA), do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e da FRELIMO, respetivamente Agostinho Neto, Amílcar Cabral e Marcelino dos Santos, no termo da “Conferência Internacional de Solidariedade com os Povos das Colónias Portuguesas”, que decorreu em Roma.
Funeral com honras de Estado de Oliveira Salazar. Chegada do féretro à Igreja de Santa Maria de Belém (Mosteiro dos Jerónimos), em Lisboa
1971
Ação Revolucionária Armada
Em março, a Ação Revolucionária Armada (ARA), braço militar do Partido Comunista Português (PCP), liderado por Álvaro Cunhal, destruiu 16 helicópteros e 11 aviões na Base Aérea de Tancos. Em outubro do mesmo ano cometeu um atentado contra o Comando Ibero-Atlântico da NATO (COMIBERLANT) em Oeiras nos arredores de Lisboa. A repressão política continua a aumentar em Portugal. É reforçada a censura à imprensa e realizado um grande número de detenções.
Álvaro Cunhal, conhecido resistente ao Estado Novo, dedicou a sua vida ao Partido Comunista Português (PCP)
Maio de 1972
Encontro de Spínola e Senghor
Depois de uma tentativa falhada de derrubar o Governo da Guiné-Conacri de Saliu Touré, aliado do PAIGC, em 1970, António de Spínola procura negociar com os países vizinhos. Com a autorização de Marcello Caetano, encontra-se com o então Presidente do Senegal, Léopold Senghor. Esboçam um plano que previa a descolonização durante dez anos da Guiné-Bissau sob controlo da ONU, mas o Governo de Lisboa rejeita a proposta e opta pela continuação da guerra. A partir de meados de 1973, o PAIGC ganha supremacia na guerra com a utilização de mísseis terra-ar do tipo SAM-7 (também conhecidos por Strella) que lhe permitiu abater aviões, enfraquecendo, dessa forma, as Forcas Aéreas e a proteção de soldados portugueses no terreno.
O Presidente do Senegal, Léopold Sédar Senghor (à dir.), saúda o Presidente da Tanzânia, Julius Nyerere (à esq.). depois de um encontro em Dakar, capital do Senegal
Agosto de 1972
Novo mandato de Américo Thomaz
O almirante Américo Thomaz é confirmado pela Ação Nacional Popular (ANP) como Presidente da República por mais sete anos. É promulgada a nona revisão da Constituição Política da República Portuguesa aprovada em 1933. Marcello Caetano introduz mudanças referentes ao Ultramar. Para dar maior autonomia aos territórios portugueses em África, o Estado português passa a ter regiões autónomas.
Américo Thomaz (à dir.) foi o décimo terceiro Presidente da República Portuguesa, último do Estado Novo português
Novembro de 1972
ONU reconhece legitimidade da luta armada
Numa resolução aprovada a 14 de novembro, a Assembleia Geral da ONU (foto) reconhece a legitimidade da luta armada em África contra Portugal. “Os movimentos de libertação nacional de Angola, da Guiné-Bissau e Cabo Verde e de Moçambique são os representantes autênticos das verdadeiras aspirações dos povos destes territórios”, afirmava. Portugal repudia a resolução. Países ocidentais como a Alemanha Ocidental (RFA) continuam a apoiar Portugal, mas cresce a pressão de grupos de defesa dos direitos humanos. Os representantes dos movimentos nacionalistas das colónias portuguesas já tinham sido recebidos pelo Conselho de Segurança, em fevereiro, altura em que esteve reunido pela primeira vez em África. Foi também autorizado o envio de uma missão de visita às regiões libertadas na Guiné-Bissau.
A legitimidade da luta armada contra Portugal em África é reconhecida pela Assembleia Geral da ONU a 2 de Novembro de 1972
Dezembro de 1972
Massacres em Moçambique
Depois do massacre perpetrado em Mucumbura, perto de Tete, em 1971, o Exército português leva a cabo os massacres de Chawola, Wiriyamu e Juwau, em Moçambique. Ficam para a História como três dos massacres mais graves ocorridos durante a guerra colonial. Em Wiriyamu foram assassinados 400 civis, entre os quais muitas mulheres e crianças. O padre inglês Adrian Hastings, que denunciou o ocorrido nas páginas do jornal britânico The Times, apresentou detalhes dos acontecimentos perante o Comité de Descolonização da ONU. Durante a sua visita a Londres, o chefe do Governo português, Marcello Caetano, é recebido com manifestações de protesto contra a guerra colonial. No final de 1972, um grupo de católicos progressistas e de não católicos inicia uma vigília e uma greve de fome na Capela do Rato, em Lisboa, e aprova uma moção que critica o envolvimento da Igreja Católica na guerra, que condenam.
Os massacres do Exército português em Moçambique ficam para a História como alguns dos mais graves ocorridos durante a guerra colonial
20 de janeiro de 1973
Amílcar Cabral é assassinado
Amílcar Cabral (foto), líder do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), é assassinado em Conakry a 20 de janeiro em circunstâncias não esclarecidas. O fundador do PAIGC defendia a união entre Cabo Verde a Guiné-Bissau, o pan-africanismo e uma linha africana do socialismo. Nesse ano, na cidade da Beira, surge o Grupo Unido de Moçambique (GUMO), criado por negros da classe média como alternativa à FRELIMO. Pede maior autonomia e o fim da discriminação racial.
9 de setembro de 1973
Fundação do Movimento dos Capitães
Numa reunião clandestina no Monte Sobral (Alcáçovas) é fundado o Movimento dos Capitães, que daria origem ao Movimento das Forças Armadas (MFA). Um dos motivos para a sua criação foi o descontentamento crescente no seio da elite “tradicional” com as novas regras para as promoções nas Forças Armadas, que tornaram mais fácil ascender na carreira militar. Em Portugal também teve lugar em setembro a primeira reunião importante entre o Partido Socialista (PS) e o Partido Comunista Português (PCP). Em comunicado conjunto, os dois partidos (na ilegalidade) declaram a necessidade de “liquidação da ditadura fascista, conquista das liberdades democráticas, fim da guerra colonial e negociações com vista à independência completa e imediata dos povos de Angola, Guiné-Bissau e Moçambique.”
Vasco Lourenço, que mais tarde seria um dos líderes do Movimento das Forças Armadas (MFA), na Guiné-Bissau (foto do ano de 1969)
24 de setembro de 1973
Guiné-Bissau proclama unilateralmente independência
No dia 24 de setembro de 1973, o PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde) proclama unilateralmente a independência da Guiné-Bissau nas matas de Madina Boé, uma das regiões libertadas no leste do país. O novo estado é reconhecido internacionalmente por muitos países, mas não por Portugal, que continua com a guerra. No dia 2 de novembro, a Assembleia Geral da ONU saúda a independência numa votação que teve 93 votos a favor, 30 abstenções e apenas sete votos contra (Portugal, Brasil, Espanha, África do Sul, EUA, Grã-Bretanha e Grécia).
Reunião do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) com a população guineense
22 de fevereiro de 1974
Spínola contesta política colonial
O general António de Spínola publica o livro “Portugal e o Futuro”, onde advoga que a continuação da guerra do Ultramar, que se prolongava há já 13 anos, não é a solução para o problema colonial. Além de contestar a política colonial, o ex-governador da Guiné-Bissau defende ainda a criação de uma federação da qual fariam parte, além de Portugal, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Após a publicação da obra, Marcello Caetano chegou a pedir a demissão ao Presidente da República, mas este não a aceitou. No dia 9 de abril, as Brigadas Revolucionárias (BR), grupo de luta armada, colocam uma bomba a bordo do Niassa, navio que transportaria soldados para a Guiné-Bissau.
"Portugal e o futuro", livro da autoria de António de Spínola, ex-governador da Guiné-Bissau, foi publicado pela Editora Arcádia no dia 22 de Fevereiro de 1974
25 de abril de 1974
Revolução dos Cravos
A 25 de abril de 1974, um golpe de Estado conduzido pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), composto na sua maior parte por capitães que tinham participado na guerra colonial, depõe o regime do Estado Novo, a mais antiga ditadura europeia, no poder desde 1933. A população adere em massa ao golpe. O general António de Spínola preside à Junta de Salvação Nacional, a quem é entregue o poder político até à formação de um Governo Provisório Civil. Democratizar, descolonizar e desenvolver são os objetivos principais do programa apresentado pelo MFA. A Revolução dos Cravos abriu, assim, caminho para a independência das então províncias ultramarinas.
O Movimento das Forças Armadas (MFA) liderou o golpe de Estado que depôs o regime do Estado Novo a 25 de abril de 1974
15 de maio de 1974
Spínola nomeado Presidente da República
A 15 de maio, o general Spínola é nomeado Presidente da República e Adelino da Palma Carlos assume o cargo de primeiro-ministro. Spínola defende que o destino do Ultramar teria de ser decidido “por todos aqueles que chamam e chamaram aquela terra sua”. O PAIGC propõe negociações, desde que Portugal reconheça a independência da Guiné-Bissau. Poucos dias depois, representantes de Portugal e do PAIGC começam a dialogar em Londres. As delegações são chefiadas por Mário Soares e Pedro Pires. Spínola não consegue impor-se e a descolonização avança.
Tomada de posse do I Governo Provisório. O Presidente da República, António de Spínola, com os membros do Governo liderado por Adelino da Palma Carlos
6 de junho de 1974
“Abraço de Lusaka”
Lusaka, na Zâmbia, é palco de um encontro entre as autoridades portuguesas e a FRELIMO, que abriu caminho para um acordo de descolonização. O encontro ocorrido no dia 6 de junho ficou conhecido como “abraço de Lusaka” depois do abraço trocado entre Mário Soares, na altura ministro dos Negócios Estrangeiros do primeiro Governo português provisório, e Samora Machel, futuro Presidente de Moçambique e líder da FRELIMO. Mário Soares volta à Zâmbia três meses meses depois para a assinatura dos Acordos de Lusaka entre o Estado português e a FRELIMO a 7 de setembro de 1974.
Samora Machel (esq.) e Mário Soares em Lusaka, onde em junho de 1974 se iniciaram as negociações com a FRELIMO para a independência de Moçambique
25 de junho de 1974
Proclamação da independência da República Popular de Moçambique
25 de junho de 1975 é a data escolhida para a proclamação da independência da República Popular de Moçambique. Samora Moisés Machel, que será o primeiro Presidente do páis, faz o pronunciamento. Marcelino dos Santos, também da FRELIMO, assumiu o cargo de Vice-Presidente.Mas Portugal ainda não reconhece a independência de Moçambique. Ainda em junho, as negociações das autoridades portuguesas com o PAIGC prosseguem em Argel. Portugal e a UNITA chegam a acordo para pôr fim às hostilidades em Angola. Um total de 8.290 soldados portugueses morreram nos 13 anos de guerra colonial nas varias regiões da África lusófona.
Pintura alusiva a fundação da República Popular de Moçambique no centro de Lichinga, na província nortenha do Niassa
BIBLIOGRAFIA:
Afonso, Aniceto/Gomes, Carlos de Matos, Os Anos da Guerra Colonial - 1961.1975, Lisboa, Quidnovi, 2010.
Cervelló, Josep Sánchez, A Revolução Portuguesa e a sua Influência na Transição Espanhola (1961-1976), Lisboa, Assírio & Alvim, 1993.
Marques, A. H. Oliveira, Breve História de Portugal, Lisboa, Editorial Presença, 2006.
Rodrigues, António Simões (coordenador), História de Portugal em Datas, Lisboa, Temas e Debates, 2000 (3ª edição).
Agradecimento especial:
Agradecimento especial:
Casa Comum (Fundação Mário Soares)
www.dw.com
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