AVISO

OS COMENTÁRIOS, E AS PUBLICAÇÕES DE OUTROS
NÃO REFLETEM NECESSARIAMENTE A OPINIÃO DO ADMINISTRADOR DO "Pó do tempo"

Este blogue está aberto à participação de todos.


Não haverá censura aos textos mas carecerá
obviamente, da minha aprovação que depende
da actualidade do artigo, do tema abordado, da minha disponibilidade, e desde que não
contrarie a matriz do blogue.

Os comentários são inseridos automaticamente
com a excepção dos que o sistema considere como
SPAM, sem moderação e sem censura.

Serão excluídos os comentários que façam
a apologia do racismo, xenofobia, homofobia
ou do fascismo/nazismo.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Duzentos ex-políticos acumulam, sem limite, subvenções vitalícias e reformas


Há décadas que antigos políticos beneficiam de uma falha na lei. Juízes falam num "enredo" legal que deve ser clarificado.
Um "enredo" legislativo com cerca de três décadas permite a antigos políticos acumularem, sem limite, pensões mensais vitalícias com pensões de reforma ou aposentação. Trata-se de uma lei que remeteu durante oito anos para uma legislação que afinal estava revogada.

O alerta está há um ano numa auditoria do Tribunal de Contas que aconselha o Parlamento a esclarecer a legislação para que não fiquem dúvidas, algo que ainda não foi feito.

O Parlamento acabou em 2005 com as subvenções mensais vitalícias, mas os juízes sublinham que o problema deve ser clarificado pois "podem ainda existir titulares de cargos políticos em situação de elegibilidade para requererem o direito à subvenção".
som audio

Segundo dados oficiais, 14 anos depois do fim destas subvenções existem 322 beneficiários de subvenções mensais vitalícias para antigos políticos, sendo que, destes, 216 têm uma acumulação de 'pensão+subvenção' superior ao salário do cargo de ministro (o tal limite que sem se perceber bem porquê esteve revogado durante oito anos).
Os números são do final de novembro de 2018 e foram enviados à TSF pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social que tutela a Caixa Geral de Aposentações (CGA).

Lei prevê limite, mas limite desapareceu

A história é difícil de explicar, daí serem os próprios juízes que falam num "enredo jurídico complexo, originado pela fragilidade do processo legislativo", uma classificação pouco comum do poder judicial (tribunais) em relação ao poder legislativo (parlamento).

A auditoria em causa tem como foco os ex-deputados da Assembleia Legislativa da Madeira. No entanto, fonte oficial do Tribunal de Contas adiantou à TSF que"as conclusões e observações, de índole geral, relativas aos regimes legais de atribuição da subvenção mensal vitalícia e sua acumulação com pensões de aposentação ou reforma, aplicam-se a todos os titulares de cargos políticos".

O problema começou em junho de 1987 quando o Parlamento alterou o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos prevendo, claramente, um "limite" para o conjunto da subvenção mensal vitalícia com as pensões de aposentação ou de reforma.
O problema é que esse limite, equivalente ao ordenado de um ministro, estaria previsto em dois decretos de lei que tinham sido revogados quinze dias antes.
O vazio legal de um limite previsto mas cujo valor desapareceu da legislação durou até 1995 quando uma nova lei voltou a colocar no ordenado do ministro o limite da acumulação. Contudo, a falha na lei que durou oito anos ainda hoje tem consequências, pois, como responde o Tribunal de Contas à TSF, quem já tinha direito à subvenção vitalícia sem limite continuou a ter esse direito.

180 mil euros por ano, só na Madeira

O problema passou despercebido até que em 2014 a Secção Regional da Madeira do Tribunal de Contas avaliou as subvenções vitalícias pagas aos deputados regionais e concluiu que o legislador sempre quis aplicar um limite e que este devia ser o que está nos decretos de lei revogados: a remuneração dos ministros.

Só entre os antigos deputados regionais madeirenses existiam, em 2011, 16 a beneficiar deste vazio, recebendo, em conjunto, mais 180 mil euros por ano do que deviam receber se o limite do ordenado de um ministro fosse aplicado.

Um "enredo" de leis

Na auditoria de 2018 o Tribunal de Contas dá razão à interpretação que CGA faz da lei, mas arrasa a forma como a legislação foi feita classificando-a como "complexa" e dando argumentos aos dois lados: a quem defende que há ou não há limites às subvenções mensais vitalícias para políticos.

Os juízes sublinham que não é por acaso que uma mesma entidade, o Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, avaliou duas vezes o assunto (em 1991 e 2016) com conclusões completamente diferentes.

"A divergência de interpretação pela mesma entidade só vem reforçar a teoria de que estamos perante um enredo jurídico complexo, originado pela fragilidade do processo legislativo".

Parlamento deve clarificar lei

"Estamos perante um limite estabelecido mas não quantificado e, por isso, impossível de efetivar", defende a auditoria que faz uma recomendação ao Parlamento: "considera-se de toda a utilidade que a matéria em apreço seja objeto de clarificação, por via legal, por forma a não subsistirem possíveis dúvidas de qual a norma aplicável quanto à sujeição ao limite na acumulação da subvenção mensal vitalícia com pensão de aposentação ou reforma".

A lei extinguiu a figura da subvenção mensal vitalícia em 2005, mas "podem ainda existir titulares de cargos políticos em situação de elegibilidade para requererem o direito à subvenção".

Parlamento começou, agora, a avaliar

Desde o início de 2019 que a TSF tenta saber o que aconteceu à recomendação do Tribunal de Contas supostamente enviada em junho de 2018 ao Parlamento (era isso que dizia, nas conclusões, a auditoria).

Fonte oficial do gabinete da presidência da Assembleia da República começou por adiantar que como sempre a auditoria foi encaminhada para a Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa, aconselhando a falar com a respetiva presidente, Teresa Leal Coelho, que durante meses nunca respondeu aos pedidos de esclarecimento.

Recentemente, com a insistência da TSF, a presidência do Parlamento detetou que, afinal, a auditoria nunca tinha sido enviada à Assembleia da República, tendo-a requerido ao Tribunal de Contas que a encaminhou rapidamente pelas vias formais (o documento está há um ano disponível no site do Tribunal). 

A auditoria, entretanto, já chegou e foi encaminhada para as três comissões que se cruzam com o assunto. O Parlamento vai começar, agora, a avaliar se vale ou não a pena clarificar a lei como recomenda o Tribunal de Contas.

www.tsf.pt

Sem comentários: