OLÁ, EU SOU UM MAC. OLÁ, EU SOU A PEPA.
A falhada campanha de publicidade com cinco bloggersde moda que a Samsung promoveu e depois fez desaparecer das redes sociais lembra-me o conto de fadas da Branca de Neve e a sacramental pergunta da Rainha Má: «Espelho meu, espelho meu, há mais bela do que eu?»
«Você é bela, rainha, isso é verdade» – respondeu o espelho. – «Mas a Apple possui mais beleza.»
Toda a gente sabe que a inveja da Rainha só lhe trouxe dissabores e que os planos de roubar o coração da inimiga acabaram por não correr muito bem.
No mundo de fadas tecnológico o desfecho também não é famoso, embora esteja longe de estar encerrado.
SAI DA FRENTE, Ó SAMSUNG
Em agosto do ano passado, um tribunal dos EUA deu razão às queixas da Apple segundo as quais os Galaxy não eram mais do que cópias descaradas do iPhone e do iPad. Alguns dias depois, um tribunal japonês decidiu que a marca sul-coreana não violara nenhuma patente da marca norte-americana.
Esqueçam a tecnologia, as patentes e as nacionalidades dos tribunais: é no mundo da moda que a principal batalha se tem desenrolado – uma batalha pelo direito de fazer parte do vestuário e de ser vista ao nosso espelho como a marca mais bela. «Fazer produtos com sexo», dissera Steve Jobs quando regressou em julho de 1997 a uma Apple quadrada, cinzentona e à beira da falência.
A Samsung portuguesa resolveu portanto reforçar a ideia de que os gadgets da marca também podem ser acessórios de moda tão estilosos como os da Apple.
Dado que contratar publicitários de qualidade custa muito dinheiro e estamos em crise, convidou cinco pessoas com blogues dessa área para dizer umas banalidades em vídeo. Enquanto falavam sobre 2012 e os glamorosos planos para 2013, eram filmadas com unsgadgets no mesmo enquadramento – a estratégia de «product placement» é mais velha que o aspirador Samsung com que a minha avó infernizava as manhãs de domingo.
Infelizmente, uma das bloggers – uma tal de Pepa Xavier – exagerou na vacuidade chique que estas ocasiões proporcionam e apareceu como uma extraterrestre do planeta das tias de Cascais reptilianas. Além de confessar no vídeo que o seu objetivo para 2013 era comprar uma mala da Chanel, conseguiu fazer com a língua portuguesa o que Hélio já tinha feito com o skate.
De quem é a culpa? Dos chicos-espertos da Samsung, claro. Em vez de associar a marca a um modo de vida estiloso mas «terreno» e com quem qualquer pessoa normal se pode identificar, como faz a Apple, associou-se a uma inocente e inócua mulher que transmitiu a ideia de que vive num mundo feliz onde o desemprego e os relatórios do FMI nunca existiram.
Nem uma única pessoa do departamento de Marketing anteviu que no contexto económico em que vivemos, o vídeo da Pepa poderia vir a ser motivo de protestos ou chacotas.
De tanto levar nas orelhas na página do Facebook, a Samsung retirou os vídeos com um envergonhado pedido de desculpas – a mariquice de deixar cair de um dia para o outro uma estratégia de marketing mostra bem a ausência de convicção de quem a aprovou. A total inconsistência da campanha.
A principal vítima desta história foi a pobre Pepa. Porque se queremos condenar alguém à fogueira por futilidade, temos aí quase dois milhões de telespectadores da Casa dos Segredos por onde pegar.
Com o enxovalho público que levou, bem pode a rapariga não aprender nada de socialmente válido e concluir que o mundo dela é melhor por ser mais cordial e inofensivo; ao menos a sua preciosa mala da Chanel nunca lhe dirá que é burra, ignorante, estúpida, anormal ou fútil – estou a citar de memória alguns dos adjetivos escritos pela turba que invadiu a página da Samsung no Facebook.
Ao falar entusiasticamente sobre a felicidade que a compra lhe causaria à alma, Pepa Xavier disse que iria trabalhar e poupar para a conseguir — uma atitude semelhante aos milhares de hipsters da Apple que fazem fila nas lojas sempre que sai uma nova versão da mala Chanel dos geeks, o iPhone.
Inquisições por isto? Deixem lá a inconsequente Pepa que deseja brilhar como uma pepita do «bom gosto» e só influencia quem deseja — às claras ou em segredo — ser aplaudido e tornar-se uma estrelinha do consumismo. Diferentes? Concentrem então a fúria justiceira nos fúteis e insensíveis governantes tecnocratas que louvam relatórios do FMI, desprezando por completo as pessoas.
Bitaites
Bitaites
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