No momento em que nasce, cada português já está a dever ao Estado perto de 20 mil euros.
No momento em que nasce, cada português já está a dever ao Estado perto de 20 mil euros. A inesperada herança resulta, de forma simbólica, das últimas contas de divisão da dívida total do país por todos os cidadãos. Há quase 40 anos, as mesmas contas resultariam numa factura bem mais leve, mil euros, o que traduz o progressivo endividamento do país e da herança dos portugueses. Dentro de alguns anos, quando entrarem no mercado de trabalho, estes mesmos portugueses serão chamados a pagar mais (e agravadas) contas, desde impostos sobre o seu rendimento até contribuições para a segurança social.
E, quando chegar o momento de se aposentarem, estes portugueses esperam que, quem estiver então no activo, possa pagar as suas reformas e garantir o acesso a serviços públicos mínimos, cumprindo assim o sistema de retribuição que suporta o Estado Social. Isto, claro está, se o Estado Social ainda existir nessa altura. Uma missão que parece cada vez mais impossível de cumprir quando as variáveis desta equação aparecem invertidas: enquanto o universo de contribuintes encolhe, o de beneficiários não pára de aumentar ano após ano. De um lado, estão cada vez mais trabalhadores sem emprego e empresas em apuros que contribuem cada vez menos.
Do outro estão cada vez mais aposentados e beneficiários de apoios sociais a aumentar a factura do Estado. E, como nenhum sistema sobrevive eternamente pagando mais do que recebe (basta olhar para as contas de Portugal...), parece óbvio que só há dois caminhos: a reforma ou a morte. Em ambos os casos, o Estado Social está condenado: ou se transforma ou desaparece de vez. Pedro Passos Coelho avisou ontem que "estamos condenados a ser bem-sucedidos neste processo de reforma do Estado".
É bom que seja assim. E que saiba bem como a vai conseguir. E, se quer que os portugueses acreditem nesta sentença de absolvição, não pode continuar a agravar-lhes a pena por pecados antigos e reincindentes, impondo mais impostos, mais cortes, mais contribuições, penalizando mais quem menos pode. Os portugueses que nascem condenados a carregar uma dívida pública que não criaram, também não podem continuar a ser condenados a pagar por uma compensação que pode acabar.
Há países com cargas fiscais igualmente elevadas na Europa, como a Noruega (43% do seu PIB), Suécia (46%), Dinamarca (48%) ou Holanda (39%). A diferença em relação a Portugal é que cada um destes Estados mantém sistemas sociais, de apoio e incentivo à educação, saúde ou natalidade, à prova de bala ou de crítica. Só se assim se entende que os noruegueses - que mantém uma das taxas de natalidade mais altas da Europa - tenham recusado recentemente qualquer redução da carga fiscal, para poderem manter os apoios e benefícios pelos quais pagam. O Governo tem muitos exemplos para se inspirar e muitos caminhos que pode seguir. Está, por isso, condenado a discutir e a reformar. Só não pode condenar o país a mais um falhanço.
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