Se ao menos o pai os tivesse comido ao pequeno-almoço
Comer criancinhas não começou como prática comunista. Foi, sim, consequência da política bolchevique de confisco de grão e cereais aos agricultores russos, que, com a guerra civil e a seca, levou à grande fome de 1921. Desesperados e famintos, os russos tiveram de recorrer a extremos desumanos: foi a fome, o canibalismo e a morte de seis milhões de russos que estiveram na origem da expressão "os comunistas comem criancinhas". Uma reputação de que nunca se livraram.
Mas será apenas reputação sem fundamento ou tratou-se mesmo de uma prática reiterada, posteriormente encoberta por camadas de desinformação mediática e académica, justapostas pelos mesmos esquerdistas que nos impingiram o darwinismo, o ateísmo, o neorrealismo e o festival de músicas do mundo de Sines?
Mesmo não se conhecendo casos concretos e documentados de criancinhas comidas ao pequeno-almoço por comunistas, a sabedoria popular, ao explicitar claramente que não há fumo sem fogo, deixa uma porta aberta à investigação. Ou seja, se toda a gente diz que os comunistas comiam criancinhas ao pequeno-almoço, não se dará o caso de haver mesmo fogo?
Foi este o ponto de partida do trabalho Ecossistemas Clandestinos - Um Estudo dos Padrões Alimentares do Homem Novo, de duas antropólogas subsidiadas pela Fundação de Ciência e Tecnologia: Mariana Tréguas e Marta Heitor, elas próprias escapadas por um triz ao pequeno-almoço comunista - nasceram em 1972 e 1973 e devem a vida à pronta intervenção da DGS que, na época, tinha por missão proteger crianças separando-as dos pais comunistas.
No estudo (entretanto misteriosamente desaparecido dos arquivos da FCT) a explicação para este bizarro comportamento alimentar anticristão parece estar relacionada menos com o mal e as suas hordas - ainda que os comunistas delas façam parte como é do conhecimento dos mercados - e mais com a sobrevivência do grupo. Dizem as investigadoras que "... não podendo proporcionar segurança e estabilidade aos filhotes que nasciam na clandestinidade, e não os querendo abandonar nos bosques que passam a salto, nem os afogar nos riachos que cruzavam, os comunistas tinham o hábito de os refogar logo pela manhã, poupando-lhes dias difíceis e tornando-os úteis à causa como alimento militante..."; mais à frente as autoras concluem: "... não é muito diferente do que acontece com outras espécie quando não há condições para que o grupo sobreviva."
Condições que, finalmente, se verificariam com a liberdade, a democracia e os supermercados.
Desde 1974 que não há um único registo de criancinhas comidas ao pequeno-almoço por comunistas; outros comportamentos nocivos ainda mantêm - em particular a obsessão em coletivizar o alheio - mas criancinhas como dieta matinal foi hábito que se perdeu logo em Abril. Há quem diga que a decisão de as substituir por all-bran, cornflakes e pela velha torrada com manteiga foi tomada coletivamente no comité central e não passou (nem passa) de uma manobra temporária destinada a tomar o poder pelo aumento do número de comunistas.
Talvez seja verdade. Talvez seja essa a razão pela qual a esquerda está hoje cheia de filhos prontos a abraçar a história dos progenitores como um legado e uma obrigação. Muitos dos que hoje militam, lutam, vociferam e, agora, negoceiam, são bons filhos de comunistas dedicados ao negócio de família: a luta. Tivesse esta gente sido comida tenra, como era da tradição, e porventura teríamos, para sempre, um governo de portugueses genética e imanentemente nascidos para mandar. Assim é possível que venhamos a ter um governo de filhos da luta.
Mas toda a história tem um lado tenro e um lado terno e esta não é exceção. De um lado, gente que nasceu com o destino do leitão e da petinga, mas que hoje se senta, ainda tenra, na Assembleia da República. Do outro lado a ternura de quem mudou a dieta pela causa.
Não deve ter sido fácil ao pai comunista mudar os hábitos enraizados por anos de clandestinidade. Eu sei do que falo porque sei o que me custou substituir torradas com manteiga por maçadores cereais sem glúten. Imagine-se uma suculenta criancinha. E quantas vezes, com criancinhas barulhentas em casa a querer ver desenhos animados checoslovacos com o volume no máximo, não terá o pai comunista tido vontade de os fritar para acabar o desassossego e ler em paz o seu Soeiro Pereira Gomes ou o seu Saramago?
Pai é pai, e não há pai que não tenha tido, por uma vez, vontade de estrangular as crianças que não se calam, ou mandá-las com os ciganos que passam na aldeia, como se ameaçava no Alentejo. Mas os pais comunistas resistiram às ânsias de pequenos-almoços substanciais, porque resistir é o seu modus operandi, e, com sacrifício e fé milenarista, mudaram a dieta. Talvez imaginando o dia em que os seus filhos, agentes adormecidos da causa coletiva, ocupassem lugares-chave da sociedade - diretores de jornais do regime, por exemplo, ou secretários-gerais de moderados partidos da governação - e acordassem para a revolução com um tradicional pequeno-almoço comunista de galão, criancinhas e pão.
Deus nos livre. E guarde as criancinhas.
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