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quinta-feira, 29 de outubro de 2015

CARTA DO PORTO - O CAIS DO BICALHO - CUIDADO COM A TOLA

Por José Magalhães (107)

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O CAIS DO BICALHO

CUIDADO COM AS TOLAS

A Freguesia de Massarelos, antiga Freguesia de Nossa Senhora da Boa Viagem, terra de maravilhosas encostas sobranceiras ao Douro, era terra de gentes que viviam das pescas no rio e no mar, e se ocupavam também no amanho das poucas leiras existentes à volta da zona ribeirinha. A maioria dos capitães, mestres, contra-mestres, e marinheiros do Porto, vivia nesta Freguesia.

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O Bicalho, zona encostada ao rio Douro, era, pelos finais do século XVIII, um dos limites da cidade do Porto.
Do Porto para Ocidente, nada! A Foz, ficava a “léguas”!


ALAMEDA DE MASSARELOS
ALAMEDA DE MASSARELOS

Antigamente, havia um terreiro, junto à margem do rio, com uma Alameda com árvores já seculares, chamada de Massarelos e hoje de Basílio Teles (escritor, professor, ensaísta, e político republicano – Massarelos- Porto 1856-Porto 1923).
Nesta zona, no século XIII existiram umas salinas (a água do mar chegava até ali).

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No Bicalho, existiu o Frigorífico do Bacalhau, edifício grande, amarelo, datado de 1939, onde o ex-fiel amigo era armazenado. As esculturas, baixos-relevos em granito, por cima das portas, da autoria de Henrique Moreira, representam os pescadores do bacalhau, e ao centro do edifício, podemos ver um escudo com as armas do Estado (Novo) Português.


CAIS DO BICALHO
CAIS DO BICALHO
LUGRES NO CAIS DO BICALHO
LUGRES NO CAIS DO BICALHO

Ali à beira, no cais, pararam, até meados do século XX, os bacalhoeiros. Ainda há quem se lembre bem dos Lugres à vela que ali ancoravam, uns de três, outros de quatro mastros, o Paços de Brandão, o Ana Maria, o Avis, e de todos os outros que quando zarpavam para os mares do Norte, para os Bancos da Terra Nova, demoravam seis meses a voltar, invariavelmente com a carga repleta de bacalhau.
Em frente ao frigorífico, havia um cais, de madeira, onde atracava um veleiro de cada vez, para a descarga do bacalhau, usando, para o efeito, um túnel, hoje tapado. Os restos dos pilares do cais, ainda se vêm a aflorar a água do Douro.


FRIGORÍFICO DO PEIXE
FRIGORÍFICO DO PEIXE
Um pouco para montante, estava o Entreposto Frigorífico (1930), conhecido como “Bolsa do Peixe”, na esquina com a rua D. Pedro V. No edifício, cuja frontaria tem também baixos-relevos do escultor Henrique Moreira, funcionava a Lota do Peixe e estavam os Frigoríficos. Em tempos, o movimento era enorme, mesmo impressionante. As pessoas acotovelavam-se e as camionetas de transporte de pescado competiam no espaço disponível. As traineiras atracavam no cais onde hoje param os helicópteros.
Da mesma forma que no caso do Frigorífico do Bacalhau, existe uma passagem subterrânea que serviam na altura, para as cargas e descargas do pescado. Na década de 1960, o espaço foi vendido à Empresa de Cimentos de Leiria, que o transformou em armazém, e se serviu do tùnel para as descargas dos seus produtos. Hoje, está bloqueada pelos escritórios da companhia que comercializa as viagens turísticas em helicóptero.

Hoje, o Frigorífico do Bacalhau é um prédio de habitação de luxo e o Frigorífico do Peixe, um Hotel. O Cais do Bicalho já lá não está, desaparecido nos anos sessenta, aquando da construção da Ponte da Arrábida.
Mais à frente, a Jusante, fica o cais do Ouro, ou do gás, onde, no largo, já esteve a Fábrica do Gás, o Gasómetro, que fornecia o gás de iluminação à cidade inteira. E mais à frente ainda, os Estaleiros do Ouro.

Mas voltando a Massarelos e ao Bicalho, ali havia também a fábrica de Massarelos, de fundição de ferro. O actual Mercado Ferreira Borges, foi lá fundido. Também o Elevador Hidráulico da Alfândega, a estátua de D. Afonso Henriques (obra de Soares dos Reis, em Guimarães) e a Ponte do Pinhão, saíram das forjas da Fundição de Massarelos.


CENTRAL TERMO-ELÉCTRICA DE MASSARELOS
CENTRAL TERMO-ELÉCTRICA DE MASSARELOS

Em Massarelos existe o Museu do Carro Eléctrico. Este Museu funciona onde outrora, após 1915, funcionava a Geradora de Massarelos. A Geradora era uma central eléctrica que veio substituir a Central Eléctrica da Arrábida. Esta Geradora, Central Termo-Eléctrica de Massarelos, fornecia a energia necessária para que os eléctricos da “cidade e arredores” funcionassem. Com a excepção da Chaminé, entretanto demolida, o edifício mantém as suas características.


MUSEU DO CARRO ELÉCTRICO
MUSEU DO CARRO ELÉCTRICO

Por volta de 1854, já muita pedra aparelhada, extraída da pedreira da Torre da Marca (nas traseiras do Palácio de Cristal, onde hoje fica a rua da Restauração) se ia acumulando junto ao rio. Iria servir para a construção da Estrada Municipal que, da Porta Nobre, se dirigiria para poente, até à Foz.
As léguas de distância que o Porto distava da Foz do Douro, diminuíam.

Os eléctricos, a linha 1, iam da Ribeira até Matosinhos.
Era uma viagem épica, onde o cheiro a peixe das peixeiras, os ditos engraçados e picantes e a beleza da paisagem, extasiava qualquer um. No Bicalho, o eléctrico passava rente à parede da escarpa. Tão perto que o “condutor” gritava para os passageiros que muitas vezes iam com as cabeças do lado de fora das janelas:
– Cuidado com as tolas!


CUIDADO COM AS TOLAS
CUIDADO COM AS TOLAS

De imediato os ditos brejeiros surgiam, e o “- Ai a minha tolinha” e , “- Inda fico co’a tola entalada” eram os mais suaves. Até ao Gás, ou mesmo até ao Passeio Alegre, os ditos iam-se repetindo, cada vez mais espaçadamente, até que, outro qualquer motivo de interesse ocupasse as atenções.
A alegria era usual naquelas viagens, muito por “culpa” das pessoas que, mesmo com rudimentares capacidades económicas, gostavam de viver.

Encalhado ente o Museu do Carro Eléctrico e o Frigorífico do Bacalhau, por cima da rua do Bicalho, ficava o restaurante da Legião. Que bem que se comia, com o rio a nossos pés. E que barato que era! Foi lá que almocei sozinho pela primeira vez. Comi uma maravilhosas tripas, num Domingo de Primavera. Comida caseira, gente simpática e bom ambiente. A nave do restaurante, no primeiro andar, enorme, não causava impressão. O barulho de dezenas e dezenas de pessoas a falarem e a comerem, não incomodava. Tudo gente simples, dos mais variados extractos sociais. Partilhava-se o prédio com outras gentes, mais pobres, que, no andar de baixo, comiam também, com a mesma qualidade, com as mesmas vistas, mas sem que pagassem a refeição. Eram ajudados, dessa forma, pelos que podiam pagar.

Os caminhos do Romântico, ficam logo ali, vindos de cima, da escarpa do Bicalho, desde a rua da Pena, passando pela rua do Gólgota. Mas sobre eles, falaremos noutra altura.

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