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sábado, 20 de junho de 2015

LAGOS ANTIGO - A BARCA DAS ARMAÇÕES - A PESCA DO ATUM E OUTROS PEIXES NA COSTA BARLAVENTINA - ALMADRAVAS E ACEDÁRES

- A Barca das Armações

A barca da armação, provida de vela latina fora construída e aperfeiçoada ao longo de anos e, embora preparada para recurso aos remos no caso de não haver vento, foi sem dúvida a vela que mais celebrizou este tipo de embarcação, capaz de navegar tanto à bolina cerrada como à trinca, isto é, com o vento quase de proa. Muito valia, como é óbvio, a mestria dos pescadores que com estes barcos lidavam. O formato do seu casco, um abaulado quase chato, tem explicação na necessidade de vará-los nas praias, onde se situavam os arraiais das armações ou quando os vendavais assolavam a costa, ou ainda quando demandavam a lota de Lagos onde se procedia à venda do peixe, na sua quase totalidade capturado nas armações de Lagos e Sagres. Ora, a barra de Lagos não dava entrada na maré baixa, a qualquer tipo de embarcações, mas estas barcas, com estes cascos, melhores possibilidades tinham de entrar, mesmo com risco de em marés baixas ficarem em seco.
Outros tipos de barcos semelhantes foram construídos e destinados a outros géneros de pesca: as conhecidas canoas, equipadas também com velas latinas, mas com a popa em painel, são disso exemplo.
As barcas das armações tinham as velas à boa volta, quando navegavam de Sotavento para Barlavento e sobre o pau, quando ao contrário. Para maior estabilidade possuíam lastro composto por duas ou quatro lages colocadas em cima do cavername, no fundo da embarcação.
A barca tinha a popa em gume para não orelhar quando, com a vaga, era preciso vará-la nas praias. Obviamente, o leme era retirado quando o barco varava.
Segue-se a nomenclatura específica mais significativa da sua aparelhagem: Na verga, com o penol ( a extremidade), a frente do carro é constituída por duas peças ligadas, denominada chemela; dos cabos constam as amuras, as orças e a escota, que são ligados à vela; o bracel abraça a verga do mastro; o mastro entra numa cavidade denominadacarlinga, é preso ao banco de alvorar e fixado por dois aparelhos, um em cada bordo.

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- A pesca do atum e de outros peixes na costa barlaventina

A Pesca do Atum e de Outros Peixes
na Costa Barlaventina - Almadravas e Acedáres
por José Carlos Vasques
Com o passar dos anos vai ficando esquecida essa importante actividade que foi a pesca do atum e da sardinha no Barlavento do Algarve, nomeadamente de Lagos até ao Cabo de S. Vicente.
A pescaria dos atunídeos no Algarve foi, sem dúvida, aquela que mais riqueza gerou, tanto para o Estado como para os que directamente a exploraram. Conta a História que em todo o Mediterrâneo o atum era pescado em grandes quantidades e também extraordinariamente apreciado a ponto de lhe atribuírem virtudes como alimento saudável. O certo é, que a importância deste peixe foi tal que os povos da antiguidade cunharam, ou melhor, bateram, moeda com a figura do peixe.
Não é possível esquematizar todos os modos usados na pesca do atum durante a antiguidade. Sabe-se que foram usadas linhas providas de anzóis de bronze, e cercos de correr constituídos por embarcações de vários remadores e equipados com redes que cercavam os atuns quando estes atacavam cardumes de peixes menores; o sinal, para estes barcos actuarem, era dado por atalaias situadas em pontos estratégicos da costa que visualizavam o “borborido” dos peixes durante o ataque para se alimentarem.
As almadravas, compostas por redes fixadas por pedras com furos (poitas), ao fundo marinho, eram redes com um compartimento onde o peixe ficava enclausurado, denominado saco, ou buxo.
Os cercos de correr não deixaram na costa barlaventina grande tradição. De facto, ficaram conhecidos mais por estarem ao serviço da pesca de outras espécies e não, particularmente, do atum. Porém, na eventualidade de alguns destes peixes de maior porte caírem nesse cerco eram então arpoados e embicheirados (a forma tradicional de se conseguirem embarcar).
A importância da pesca do atum foi tal que a aculturação romana deixou profundas marcas e testemunhos atestados pelos inúmeros pios de salga (cetárias) e pelo profuso tráfego de ânforas. Em Lagos, junto ao mar, e nos locais históricos ocupados pelos povos da antiguidade, por todo o lado, vai a arqueologia revelando construções cobertas pela terra e recuperando materiais que isto testemunha.

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Antes do Infante D. Henrique estabelecer residência em Lagos e investir nas coisas do mar já outros o tinham feito mas, mais na indústria da salga de peixe. As almadravas da Torre Alta e da Torre Altinha, em Lagos, foram exploradas por várias gerações, incluindo a do Infante D. Henrique. Isto não constitui, hoje, novidade histórica.
No terreno que margina a estrada da Ponta da Piedade, do lado da baía de Lagos, pode-se ver os alicerces das duas torres vigias que deram nome às armações. Sem placa nem legenda, aí dormem esquecidas pelo tempo e pelos homens.
Além destas duas almadravas, outras conhecidas, embora mais antigas, situavam-se em: Beliche; Cabo; Baleeira; Zavial; Almádena e Burgau, e daí recebiam o respectivo topónimo identificativo.
Foi lançada, em data imprecisa, uma armação, ao norte do Cabo de S. Vicente que, pelo que se recolheu da tradição oral, não chegou a pescar pois uma forte corrente de mar arrastou-a, impossibilitando a sua recuperação. Deixou no sítio onde foi lançada o topónimo Armação Nova. É local, hoje, muito frequentado por pescadores desportivos. A razão dessa destruição é bem conhecida e radica nas fortes correntes, de vários rumos e mudanças rápidas e difícil previsão. Exemplo de como a natureza ainda impõe os seus mandos e que veio contrariar as veleidades de quaisquer investimentos nessa área.
As armações do atum, como as da sardinha, careciam de autorização real expressa. Como contrapartida, a coroa retirava fartos proveitos, através dos impostos sobre o pescado, que chegaram a atingir a cota de 60% sobre o atum e de 40% sobre a sardinha. Essas concessões reais incidiam sobre todos os bens do mar, incluindo o sal que era monopólio régio, tendo para este efeito, inclusivamente, sido criadas as Casas do Sal.
No séc. XV a abundância do atum era um facto e o investimento nas armações tornou-se negócio muito lucrativo. Para se lançar uma armação o investimento era avultado pois exigia despesas com matérias e muita mão-de-obra envolvida nos serviços de feitura das redes, cordas, flutuadores de cortiça e barris cintados. A matéria-prima, havia-a na região: linho, esparto, cortiça e madeira. Os metais, por serem mais caros, eram substituídos pela pedra, caso das lajes usadas em vez de âncoras de ferro, nas armações mais antigas, segundo diz a tradição oral. Existiam ainda os barcos que apoiavam as armações, com as suas respectivas tripulações; o pessoal que servia nos trabalhos da copejada, e outros em terra que mantinham a arte operacional. No século XV a armação do Beliche tinha ao seu serviço quarenta homens, número normal para a maioria das armações.
O atum de direito é aquele de maior valor, o que vem do Atlântico entrando no Mediterrâneo. Para o capturar tinham as armações que estar orientadas correctamente, e de modo diferente daquelas adoptadas para a captura do atum de revez, o que sai do Mediterrâneo e que, após a desova, vem magro, com menor valor.
Esta pesca foi tão importante no Algarve que constituía uma honra integrar a hierarquia de uma armação. Eis alguns dos cargos: mandador, escrivão, patrão de lancha, contra-mestre e, no fim da cadeia hierárquica, o copejador e o companheiro. A figura máxima era o Provedor das Almadravas do Reino do Algarve.
Para termos uma ideia da importância económica desta actividade basta-nos a constatação de que os arraiais eram protegidos por fortalezas militares devidamente artilhadas. Aí se escudavam do assalto da pirataria que rondava a costa, sob a alçada dos fortes de Burgau, Zavial, S. Luís de Almádena, S. Inácio (destruído pelo sismo de 1755), Vera-Cruz da Figueira, Sagres, S. António do Beliche, e outros mais.
Os que trabalhavam nesta faina estavam sujeitos a grandes riscos, quer naturais, quer dos piratas e corsários que nessa época infestavam os mares. Com a perda da Independência e a posse das duas coroas no Rei Filipe II de Espanha, caducou o tratado luso-britânico firmado ao tempo de D.João I e ficou a costa portuguesa sob alvo dos corsários ingleses. Francis Drake, ao serviço de Isabel I, e comandando uma frota de vários navios com cerca de três mil homens, saqueou vários pontos do litoral algarvio. Atacou a fortaleza de Sagres em 1587, destruindo as almadravas da Baleeira, Cabo e Beliche. Saqueou Alvor e Faro e fez avultados prejuízos por toda a costa algarvia. Era frequente o ataque da pirataria logo que as armações começavam a sua temporada de pesca, por volta de Abril ou Maio. Estes ataques eram tão violentos que as populações refugiavam-se no interior, abandonando os seus haveres, as casas e o gado. Os piratas rapidamente abatiam e esquartejavam os animais, transportando-os consigo, encontrando assim uma forma fácil de abastecimento de víveres.
Em Maio de 1620 a armação da Baleeira foi atacada por uma força turca que contava cerca de oitocentos homens, e dez embarcações, mas a fortaleza resistiu.
Em 1631 a armação de Almádena era constituída por quarenta homens e oito barcos pequenos. Em consequência dos frequentes ataques dos magrebinos foi pedida, ao Rei Filipe II, a construção duma fortaleza para a defesa dessa armação.
Nenhum monarca abdicou, alguma vez, do rendimento das armações e por outro lado, o pescado era integrado na ementa das tripulações de toda a navegação oceânica. Afonso V, num acto consciente e generoso, passou a ser fornecedor de linho, esparto, cordame, breu e alcatrão, produtos usados na confecção dos apetrechos das armações. Já D. João II negociou as pescarias com o Conde de Travento, um italiano que aqui estabeleceu negócio considerado, à época, bastante rendoso. Ainda durante o seu reinado outras concessões foram feitas a sicilianos, milaneses e outros que, mercê do êxito alcançado, até mandaram erigir a expensas suas, a ermida de S. Roque, no delta da ribeira de Bensafrim. Daí o nome dado à extensão de praia compreendida entre as duas barras da entrada do porto. Também construíram a Igreja de S. Pedro, situada na Ribeira dos Touros. Ambos os templos foram destruídos pelo terramoto de 1755.
A citada praia de S. Roque conheceu ali um grande arraial de armações, bem como os estaleiros navais. Vivia-se, então, neste local, uma intensa actividade, razão pela qual existia o necessário apoio espiritual materializado na edificação desses templos.
Durante muitos anos esteve visível a caldeira onde se alcatroavam os cabos e as redes. Hoje, tudo jaz debaixo do enorme monte de areia aí depositado, retirado pela draga aquando da construção da actual doca-pesca. Havia, no local, um poço de fina água doce para serventia de quem laborava nesse local. Nesta praia de S. Roque se concentrava uma intensa actividade ligada à construção naval e a sua importância é atestada por mais um aspecto: para sua defesa, se olharmos atentamente, perceberemos nos arcos da rua da Barroca, as rampas para a artilharia.
O Baluarte da Porta de Portugal foi, infelizmente, arrasado, e no seu local foi, depois, implantado o célebre Jardim dos Amuados. Desse baluarte se defendia um outro estaleiro naval e grande parte do espelho de água onde ancoravam as frotas.
Durante as terraplanagens para a construção da estrada para a estação dos caminhos-de-ferro foi encontrado o cais rampeado para o bota-abaixo das embarcações. Hoje, poucos se lembramda existência de um estaleiro nesse local, e do mestre Pedro calafate. Esquecer estes aspectos da nossa história é uma falta imperdoável, pois assim se esquecem esses heróis do mar, esse “nobre povo” tão ingenuamente cantado por bocas que não lhe conhecem o significado.
Viam-se os homens do mar, amiúde, obrigados a enterrar os seus pertences em silos para os poupar aos ataques constantes de corsários e piratas. A esses buracos chamavam “covas de pão”. Foram estes pescadores que povoaram sítios isolados do litoral, foram eles que retiraram do mar a subsistência de comunidades inteiras. Quando a armação desarmava ajudavam nas lides do campo, integrando-se completamente numa sociedade verdadeiramente solidária.
As armações, sendo artes piscatórias, deparavam com grandes adversidades, como os fortes vendavais que surgiam inesperadamente e faziam a armação submergir por acção da forte “aguagem”. Amainando o tempo as bóias voltavam a ficar visíveis e era necessário, então, reparar os estragos. Do mar, tudo era de esperar, alimento e desgraças. Não se podendo, hoje, fazer ideia do que tudo isso terá sido. Apenas os ecos orais dessas histórias perduraram no tempo.
Sabe-se que os governadores da Praça Forte de Lagos terão dispensado auxílios, mandando tropa para suas defesas, e que os próprios reis autorizaram o porte e utilização de armas para defesa dos pescadores. Até mesmo quando alguns inimigos naturais das espécies pescadas as atacavam, como os roazes corvineiros e os de bandeira, os pescadores pediam ao Governador da Praça para mandar fazer alguns tiros de peça para os afugentar da costa.
Sujeitos ao barómetro das políticas mais desastrosas do nosso país, os pescadores foram também vítimas indefesas. Como se disse, a perda da nossa independência, a guerra da sucessão e a luta entre liberais e miguelistas constituíram acentuados períodos de decadência das armações.
No Termo de Lagos, durante a época filipina, operavam oito armações de atum mas grande parte delas desarmaram; só a armação da Torraltinha vigorou durante todo esse período. Há razão lógica para isso. A capacidade defensiva da Praça Militar de Lagos. Durante a vigência dos Filipes assistiu-se, efectivamente, ao acentuado declínio das armações, nomeadamente das que laboravam na área do Cabo de Sagres. Até a hierarquia das armações mudou: provedor das almadravas; recebedor das almadravas; escrivão das almadravas; mandadores (dois em cada almadrava); atalaia; praguiceiros (dois por cada mandador); a companhia (companheiros); capelão e escrivão. O atalaia das armações operava em terra, sendo vigia, com a missão de assinalar a presença do peixe e sinalizando-a ao som de apito.
No início deste período existiam, entre Lagos e Sagres, as seguintes armações de pesca ao atum: Torralta; Torraltinha; Burgau; Almádena; Zavial; Baleeira; Cabo e Beliche. Algumas destas já existiam antes da vinda do Infante D. Henrique para Lagos. Em 1632, e durante alguns anos, não se armou a almadrava da angra da Mareta devido a dificuldades e excessos cometidos pelo Capitão do Castelo de Sagres, um castelhano.
As leis criadas pelos nossos monarcas, anteriores aos Filipes, nunca foram integralmente cumpridas. Uma dessas leis estipulava que todo o peixe vendido em lota o seria com o dinheiro na mão, para evitar a fuga aos impostos e garantir os pagamentos de materiais vários e aos próprios pescadores.
Não eram só os atuns que entravam nas armações, estas capturavam também outras espécies: albacoras, golfinhos (toninhas), corvinas, sarrajão, pargos, e uma grande variedade de peixes brancos (apreciados para alimento dos doentes). Porém, o atum, o mais apreciado e abundante na época migratória, tinha uma classificação destacada das outras espécies. Tratava-se de um peixe corpulento, pesando mais de cem quilos, dando um aproveitamento quase total (o que não se destinasse à alimentação era aproveitado para adubação, especialmente das vinhas). Era utilizado fresco, salgado, curtido pelo sal, fumado, de todas as formas tinha lugar na mesa do rico ou do pobre. Com a introdução da cultura da batata a sua aplicação culinária ganhou maior variedade.
Portanto, as armações de pesca, quer de peixe grado como de peixe miúdo, foram uma enorme fonte de riqueza, tanto para o Estado, como para as comunidades onde mobilizava intensa e variada mão-de-obra na sua faina e em misteres relacionados: cordoeiros, tanoeiros, tecedeiras de linho, redeiras, ofícios rurais (apanha do esparto e cultura do linho).
Para serem colocadas no mar, as armações exigiam avultados investimentos de capital, pessoal especializado na sua faina, e mestres de barcos pois existiam vários tipos de embarcações envolvidos: o batel, com coberta e cabrestante; os barcos das portas e das gachas; e outros para auxiliar na copejada e no transporte para terra. Cada armação podia envolver entre quarenta a setenta homens. Tratavam-se, pois, de empresas de dimensão considerável.
As armações foram artes de pesca de grande produtividade mas, também, muito contingentes à abundância ou à escassez do pescado.
As dádivas a instituições sempre foram apanágio dos reis. De um documento de 1575 se traduz esta passagem, referente ao pagamento adiantado de um serviço a prestar: “Mandado da rainha D. Catarina para o feitor da armação dos atuns da cidade de Lagos, Francisco Correia, dar ao clérigo de missa Francisco Antunes 10.000 réis de que a mesma senhora lhe faz mercê pelas missas que há-de dizer na capela da armação de Beliche aos seus armadores, a 02/04/1575”.
Infelizmente, as administrações das armações descuraram a constituição do suporte financeiro dando origem a ocorrências, algumas verdadeiramente desastrosas, que contribuíram para a sua decadência.
O terramoto de 1755, e consequente maremoto, desfechou o golpe de misericórdia nas armações. Pouco há, escrito, que nos permita uma avaliação concreta sobre a destruição provocada nas armações do atum e da sardinha do Barlavento algarvio bem como das repercussões negativas para a economia da região. Embora nesse 1 de Novembro a maior parte das armações não se encontrasse em laboração, era nas praias e recantos abrigados do litoral que se encontravam os arraiais e as residências associadas. O violento e rápido maremoto, originado pelo intenso sismo, tudo arrastou. Praias houve que ficaram desprovidas de areia, tornando muito difícil puxar e varar os barcos e outros materiais recuperáveis. Podemos ter uma imagem da violência do acidente ao verificarmos a destruição das sólidas fortalezas que ficaram completamente em ruínas. Até algumas das pesadas peças de artilharia foram parar ao mar. Refira-se, a título de exemplo, a Fortaleza de S. Luís da Ponta de Almádena, e o forte de S. Inácio que foi substituído, mais tarde, pelo novo e pequeno Forte do Zavial. E o pior foram as perdas de vidas humanas.
Havia que tomar medidas, isto é, tentar repor o esplendor desta actividade que fora a grande indústria da pesca e cujo comércio estava a cair na mão de estrangeiros. Foram, então, criadas a Companhia das Reaes Pescarias com constituição de fundos de accionistas, e leis que incrementavam a pesca, dando novo alento a esta actividade.
No entanto, outra grave crise atingiu o sector: a guerra entre liberais e miguelistas. A região do Cabo de Sagres foi palco de grandes confrontos, alguns sangrentos, dando origem ao desinteresse por parte dos investidores. Este factor veio acentuar a decadência da actividade.
No período Pombalino foi tomada a medida de atribuir salários, moderados, aos que trabalhavam nas armações. Não obstante todos esses esforços, as agruras iriam subsistir e ensombrar todas as tentativas de relançamento da actividade. Uma vez mais, os conflitos bélicos assumiram-se como o principal revés. Em 1797, as batalhas entre uma esquadra espanhola e outra inglesa, em frente à Praia da Salema, envolvendo cinquenta e um navios com três mil quinhentas e quarenta e oito peças de artilharia tornaram impraticável a pesca mercê dos afundamentos aí ocorridos.
Outros conflitos navais entre liberais e miguelistas mantiveram a perturbação social e económica na faixa litoral entre a Salema e Sagres. A Batalha de 1833 foi, segundo alguns historiadores, decisiva para a vitória do liberalismo em Portugal pois ali foi derrotada a esquadra miguelista.
De uma pesquisa subaquática realizada há alguns anos, resultou a recolha de vasto espólio que incluía várias peças de artilharia de inequívoco valor histórico que, como sempre, foi parar a Lisboa. E a Salema nada tem que recorde esse passado e a importância desses acontecimentos. Com o passar do tempo tais factos deixam de fazer parte da memória colectiva do lugar e das suas gentes. Seria conveniente, ao menos, que fosse executada uma lápide ou um memorial a evocar esse acontecimento histórico. Talvez até, juntando-lhe uma dessas peças de artilharia. É que dos dinossauros ainda lá existem pegadas, agora das épocas dos homens é que tudo é delapidado.

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