Os povos europeus, desde os que sofreram a violência direta de duas guerras, até aos nostálgicos de passados nacionais gloriosos, procuram perceber saídas.
É um tempo que exige reflexão e ação. E não discursos esdrúxulos. Mas é, sobretudo, um período em que devemos estar de atalaia contra oportunismos de diversos matizes.
No seu recente livro “For Europe”, Daniel Cohn-Bendit (presidente dos verdes no PE) e Guy Verhofstadt (ex-primeiro ministro belga e líder do grupo liberal do PE), defendem uma hipótese de caminho para a Europa do futuro.
No manifesto que retoma o antigo projeto de uma União Europeia forte e federal, o elemento mais notável da receita não é, contudo, o federalismo, mas a ideia de uma superpotência europeia imperialista. Nesse sentido, os autores dizem ser necessários dois ingredientes: austeridade para os povos e militarismo face ao mundo.
“Precisamos defender enfaticamente os nossos interesses económicos e políticos contra grandes potências do calibre de China, Índia, Brasil, Rússia ou os Estados Unidos Estados”, dizem.
A globalização está a ser fatal para a economia europeia. E, vendo bem as coisas, também para os EUA. O que é paradoxal: foram os seus líderes políticos e económicos que inventaram esta forma de globalização.
A solução estará no confronto com as potências emergentes que têm vindo a conquistar mercados e produções? Sim, dizem eles. Mas, como e porquê? É fácil, dizem: a Europa, seguindo a pista americana, deveria impor a democracia à força. Claro, uma democracia conveniente ao capitalismo neoliberal, que fecha hipocritamente os olhos a tudo quanto é antidemocrático nos países já sob controlo dos empórios!
Daniel Cohn-Bendit já ensaiou os passos desta dança ao atacar no PE a lei húngara de imprensa. Porque, diz ele, não corresponde aos valores da UE! Mas, quais são os valores da UE nesta matéria? Os de Berlusconi e Murdoch?
A Europa por este caminho não vai lá.
E será o federalismo viável numa Europa mergulhada em crise profunda?
O federalismo moderno tem origem política e ideológica dos Estados Unidos. Na sua independência e revolução.
A União Europeia tem-se assumido, desde o seu início, como um projeto económico e ao serviço dos interesses dos mais ricos e poderosos. Esqueceu a vertente identitária europeia e, até, a convergência e a coesão social, económica e territorial, embora fale muito nelas.
Tem caminhado, ao longo de sucessivos Tratados, como um projeto sem nome, marcado pela sua natureza dualista, “oscilando entre uma tendência federal e um impulso interestadual” (Soromenho-Marques, 2012) e, sobretudo, através de metodologias pouco transparentes e democráticas.
A crise atual que, mais do que a Europa, está a fazer perigar o capitalismo ocidental, começou em 2007-2008 nos EUA que é, precisamente, um estado federal.
A Europa é feita de cafés, disse-nos o anarquista platónico George Steiner. O problema é que, de há muito, foram convertidos em agências bancárias.
A construção da Europa deve ser feita “passo a passo”, escreveu Jean Monnet, mas, a cavalgada dos tecnocratas neoliberais dos últimos anos, pô-la a marcar passo.
Embora os estados-nação europeus não sejam idênticos aos brasileiros, russos, ou aos treze da fundação americana, a questão até, talvez, nem seja o federalismo, usado já com êxito em diversas partes do globo.
Entre o “For Europe” e o “Fora da Europa” há que reinventar um modo de estar diferente, um modo de produção novo.
Nota: Este artigo foi publicado no semanário Sem Mais no dia 26 de janeiro
Praça do Bocage
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