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quarta-feira, 23 de maio de 2012


BAPTISTA-BASTOS

Portugal faz falta a quem?

por BAPTISTA-BASTOSHoje
"Portugal faz-me falta." É uma frase comovente e bela pela sua clara genuinidade. Proferiu-a um professor de Música, de nome Fernando (desculpem, não fixei o apelido), há vinte e sete anos imigrado na Suíça. Ouvi-a anteontem, no programa Opinião Pública, primeira edição, SIC-Notícias. "Se as condições em Portugal fossem outras, ia para lá hoje mesmo." Não são: são piores. E Fernando vai ficar, iluminando a tristeza dos nossos males, que alguns banalizam, inculcando-nos a tese de que são históricos e inevitáveis.
Não creio que Passos Coelho ou Miguel Relvas (agora enredado em novas encrencas), paladinos infatigáveis de mandar portugueses para fora do País, tivessem conhecimento deste desabafo d'alma. São criaturas de recursos curtos e insistentes, resultantes dessa simbiose milagrosa e casual que tem transformado a mediocridade num desaforo e a ignorância numa carta-de-guia.
Este Fernando precisa de Portugal porque sim. A sensação confusa e dorida que nos prende "a esta nesga de terra / debruada de mar" [Torga] - e que designamos de saudade, à falta de melhor explicação, faz parte da nossa retórica sentimental. Essa emoção já me tocou no batente quando vivi na Grécia e no Brasil. Estamos lá sem nunca deixarmos de estar aqui: é mais uma forma abstracta de ser, e uma fragilidade propícia a servidões momentâneas. Uma coisa fora do tempo, um pouco reaccionária e acaso tonta, cujo aproveitamento, ao longo da história das nossas tiranias, tem feito mossa à colectiva maioridade de que necessitamos.
"Portugal faz-me falta." A grandeza emocionada desta confissão confronta-se com a pequenez insultuosa daqueles dois nomeados. "Agora, Estar", escreveu o poeta Pedro Tamen, um dos mais belos livros sobre o Portugal liberto, repleto de uma autenticidade que não tardou em empalidecer. Os senhores da força sem razão remeteram para a ruína anónima aqueles aos quais Portugal fazia falta e que ambicionavam estar, apenas para ser. Passos Coelho e Miguel Relvas são parte dessa herança espúria. Levam a sua capacidade paradoxal ao ponto de nos indicarem a fronteira, por incapacidade de nos reter aqui. 815 portugueses por dia perderam o emprego no primeiro trimestre deste ano. A pátria despovoa-se dos seus jovens e o número de suicídios cresce. Os velhos são um embaraço improdutivo para este Governo que, além de desempregar pessoas, desempregou a generosidade e a compaixão.
Podemos viver nesta aridez de espírito, neste caucionar da agressão sem limites, neste vazio e neste coração oco, ostensivo, incoerente e fatal? A pergunta ainda não saiu dos círculos concêntricos das nossas inquietações quotidianas. Vamo-nos animando com os escândalos diários, e remetemos, para os fojos, a preparação de novos conceitos e de novas resistências.
Agora, ir?
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Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o Novo Acordo Ortográfico

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