Bate-me, que eu gosto!
“ Fifty Shades of Grey”, da autoria de E.L.James, é actualmente o maior sucesso editorial nos EUA, tendo já entrado para a galeria dos best sellers.
Convém começar por esclarecer que a personagem central do livro (Anastasia) é uma profissional competente e dedicada que trabalha horas sem fim, é líder na sua empresa, toma conta dos filhos, tem um salário elevado que lhe garante independência económica e, no final do dia, o seu prazer não é deitar os filhos e envolver-se numa cena de romântica com o seu companheiro, seja ele permanente ou apenas ocasional. O maior prazer de Anastasia é ser chicoteada.
Livro pornográfico para homens perturbados, estarão a pensar algumas leitoras. Puro engano, minhas caras amigas…
Segundo dados da editora, são as mulheres quem procura este livro com maior avidez. Mais de metade estão dessas leitoras pertence ao escalão etário entre os 20 e os 30 anos, são urbanas e estão integradas profissionalmente.
Confesso que numa altura em que a violência doméstica ocupa o centro de muitos debates, me causa alguma perplexidade o facto de um livro onde a mulher recorre à escravidão física para se satisfazer sexualmente ser um sucesso mas, pensando melhor, talvez não seja assim tão surpreendente...
Um estudo publicado na Psycholgy Today, citado pela revista 2 ( Público ao domingo) responde parcialmente à questão: 31 a 57% das mulheres fantasiam com cenas de violação e de sexo forçado.
“ O eros é um terreno onde a realidade não coincide com aquilo que dizemos”- esclarece por sua vez Daniel Berger , autor do livro “ O que querem as mulheres”cuja publicação está prevista para 2013.
No artigo da 2- cuja leitura recomendo- são adiantadas diversas explicações para o facto de as mulheres apreciarem estas fantasias de submissão e violência física muito para além daquilo que homens ( pelo menos como eu…) possam pensar.
É verdade que há muitos autores, além de Sade, cujos livros têm como tema central a submissão feminina e o masoquismo. No entanto- e escolhendo propositadamente dois autores que estão nos antípodas da construção literária- quer em “A História de O” de Anne Desclos ( escrito sob o pseudónimo de Pauline Réage), quer em “ Onze Minutos” de Paulo Coelho, a submissão sexual e o masoquismo não são livremente assumidos pela mulher.
O que é efectivamente novo em “ Fifty Shades of Grey” é a personagem assumir a necessidade de ser chicoteada, para garantir satisfação sexual. Uma mulher afoita já não é aquela que diz ao parceiro “Fuck me!”, mas sim a que propõe “ I want to be your slave”.
E o que – em minha opinião- é surpreendente, é serem a s mulheres ( maioritariamente entre os 20 e os 30 anos, relembro) a fazer do livro um best seller.
Há aqui qualquer coisa que não bate certo. E o mais grave é que muito provavelmente sou eu, que há muito deveria ter esquecido tudo o que me ensinaram e pensava ter aprendido sobre as mulheres ao longo da vida.
Como diz o povo na sua imensa sabedoria, aprender até morrer e morrer sem saber. Para início de conversa, o melhor é esquecer romances à moda antiga, tudo o que pensava saber sobre as mulheres e começar tudo de novo.
É provavelmente a isso que chamam “mudança de paradigma”
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