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segunda-feira, 28 de maio de 2012


Cavaco Silva poderá estar quase tão senil como se pensa

Não seria a primeira vez que Portugal teria um chefe de Estado com parafusos a menos. Nem a segunda. Bom… nem a terceira (sem referir as insanidades prováveis, mas nunca oficialmente comprovadas). Recordem-se os casos da rainha D. Maria I, que não recebeu o desagradável epíteto de “a louca” por ser a pessoa mais normal do seu bairro, de D. Afonso VI, que irrompia em gritos histéricos sempre que via uma cebola e tentou contrair matrimónio com a torre esquerda da Sé de Lisboa, de Américo Tomás, que fazia questão de inaugurar obras majestosas que apenas existiam na sua cabeça, ou de Costa Gomes, que passou os seus dois anos como presidente convencido de que orientava os destinos da Checoslováquia e fazendo bolhas de saliva com a boca sempre que alguém lhe falava na Cortina de Ferro.
Se a loucura de líderes passados poderá ter alguma graça, a senilidade do Presidente da República actual será mais preocupante, sobretudo porque os indícios não param de se suceder. Segue-se uma listagem sucinta dos sintomas da presidencial sandice.
§ O primeiro sintoma, que despertou a atenção dos portugueses para o comportamento bizarro de Cavaco Silva, foram as declarações ao país. Diferindo por completo do primeiro-ministro que pedia para o deixarem trabalhar, mostrando-se alérgico às interacções comunicativas e falando aos cidadãos apenas se tivesse mesmo de ser, Cavaco Presidente começou por interromper o horário nobre televisivo para comentar o estatuto político dos Açores, batendo o recorde de irrelevância política até então na posse de Charles de Gaulle (em 1967, convocou os jornalistas ao Eliseu para informar que decidira mudar a sua cor preferida de azul para verde). Depois das eleições legislativas, quando o país desesperava por saber se era ou não verdade que o primeiro-ministro teria ordenado escutas ao Presidente, Cavaco volta a enfrentar as câmaras para, numa diatribe de dez minutos, não esclarecer a suspeita original e levantar outras quatro ou cinco. A propósito do casamento entre pessoas do mesmo sexo, novo comunicado ao país para explicar que o Presidente não acha bem que se chame “casamento” a tal união, mas isso não o impedirá de promulgar o diploma, lamentando a inexistência de consenso político capaz de evitar clivagens desnecessárias (como as que existiriam, por exemplo, se, numa questão polémica, um presidente em exercício esquecesse a imparcialidade e tomasse partido).
§ No cumprimento das suas funções oficiais, Cavaco tem-se mostrado confuso com as personalidades que recebe. Há muito que Passos Coelho vem manifestando a colaboradores próximos o desconforto por constatar que o Presidente insiste em tratá-lo por “Marques Mendes”. Outras figuras se têm queixado discretamente do mesmo. Sempre que se encontram, o Presidente chama “Santana Lopes” a Durão Barroso. Por outro lado, nos contactos esporádicos com o legítimo Santana Lopes, o antigo autarca lisboeta e figueirense, primeiro-ministro, presidente do Sporting e secretário de Estado da Cultura aceita com dificuldade que Cavaco lhe chame “Sr. Barbosa” e lhe peça para ir lá a casa tirar medidas para uma marquise.
§ Apesar de ocupar o mais alto cargo da hierarquia política portuguesa, nada indica que Cavaco Silva corra grandes riscos quando se desloca a pé entre populares. Mesmo assim, reforçando um hábito antigo, o presidente rodeia-se sempre por um cordão de segurança apertado, fazendo pensar que receia o contacto com os cidadãos a que preside. Nada mais falso. De acordo com alguns antigos guarda-costas, não é o receio do contacto com os portugueses que leva o presidente a insistir na segurança reforçada, mas sim o pavor que sente de enguias voadoras imaginárias que diz pretenderem invadir-lhe as narinas.
§ Bento XVI viu-se forçado a conter o espanto quando, ao chegar a Portugal, o presidente português lhe apresentou a esposa, o cardeal-patriarca e o seu amigalhaço, Jesus Cristo. Manifestando admirável caridade cristã, o papa alinhou no delírio e estendeu a mão ao jarrão de malmequeres que Cavaco apontava.
§ Respondendo a uma proposta para abrir os jardins do Palácio de Belém ao público, o Presidente da República considerou que tal seria perigoso, já que os mesmos se encontram infestados por uma praga de gnomos canibais.
§ Quando passa férias no seu Algarve natal, Cavaco exige vigilância apertada e um perímetro de segurança alargado em torno da sua propriedade, proibindo-se a circulação a todos os veraneantes com nomes começados por F ou que vistam peças de roupa de cor amarela. Quem cumprir em simultâneo os dois requisitos deverá ser imediatamente detido e libertado apenas depois de envolto em papel de embrulho com motivos natalícios, ordem que os guarda-costas têm tido a sensatez de ignorar na maior parte das ocasiões.
§ Sempre que ouve a palavra “défice”, o Presidente da República tem de cantar cinco vezes seguidas o hino do PSD e lavar abundantemente as mãos com água morna e sumo de maracujá. Por enquanto, tem conseguido adiar a compulsão para momentos de recato, mas não se sabe quanto tempo durará. De igual modo, sempre que Cavaco vê Manuel Alegre, sente-se obrigado a dar estalos com os dedos e a repetir “Fonte de Boliqueime” até alguém lhe enfiar discretamente um comprimido na boca. (Curiosamente, sempre que vê Cavaco, Manuel Alegre sente-se igualmente obrigado a cofiar a barba enquanto improvisa rimas com “liberdade”, “pátria” e “democracia”.)
E como reagem os portugueses à possível senilidade do seu presidente? De acordo com sondagem inÉpcia-Retrosaria Tancredo dos Botões, 60% dos inquiridos não se importam “que o Mário Soares esteja xexé desde que continue a falar bem às pessoas”; 25% preferiam que fosse de outra forma, mas, se não puder ser, paciência; 8% gostaram muito da visita de Sua Santidade, o papa, e esperam que volte depressa; e 7% não podem responder porque têm de ir para casa apagar o fogão que o tacho já deve ter levantado fervura.
Para os analistas internacionais, as mudanças provocadas no país pela senilidade presidencial oscilarão entre “nenhumas”, “imperceptíveis” e “insignificantes”, pelo que os portugueses são aconselhados a assobiar para o lado e esperar que alguém venha apagar a luz.

inércia.com

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