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segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Festa do Avante - Um bonito texto de Lúcia Gomes A MINHA PRIMEIRA FESTA! Lúcia Gomes Tinha 14 ou 15 anos, não me lembro bem. Não conhecia o PCP para alémdaquele centro de trabalho onde ia, aos fins de semana, ouvir poesia ejam sessions com a minha irmã, o Tiago e alguns amigos com quem tinhauma banda (o Pedro, o Beto, o Tony). Um dia, o João Gustavo bate-me àporta e pergunta-me se quero ir à Festa do Avante! actuar no CaféConcerto.

Festa do Avante - Um bonito texto de Lúcia Gomes



A MINHA PRIMEIRA FESTA!

Lúcia Gomes


Tinha 14 ou 15 anosnão me lembro bemNão conhecia o PCP para alémdaquele centro de trabalho onde ia, aos fins de semanaouvir poesia ejam sessions com a minha irmã, o Tiago e alguns amigos com quem tinhauma banda (o Pedro, o Beto, o Tony). Um dia, o João Gustavo bate-me àporta e pergunta-me se quero ir à Festa do Avante! actuar no CaféConcerto.
Não percebi muito bem a coisamas pareceu-me bem. Fui trabalhar parajuntar dinheiro para ir e, chegados à data, fui com o Pedro, o baixista,apanhar o comboio a Espinho. “O comboio da Juventude!”. Um comboiointeiro cheio de gente para ir à Festa do Avante. Sento-me, acanhada, num dos bancos do regional e ouvi toda a gente a tratar-se porcamaradaNão percebi porquêNão conhecia nenhum comunista além do João. De repente vejo um rapaz que percorria as carruagens a oferecerbolachas de canela a toda a gente.
Olhou para mim e disse: “Camaradaqueres uma bolacha?”. E eu lembro-me de achar simpático ele oferecer bolachas a toda a gentemas alto e pára o baile que eu não era camarada de ninguém.
Chegada ao recinto, esperei numa fila para ir montar a tenda. Ficámos àsombraMal entrei na Quinta da Atalaia tudo me pareceu irrealTantagentenovavelhaaltabaixaaquele palco incrível ao fundo dadescida, o sorriso e o à vontade de todas as pessoas, os pavilhões decada distritoComo era possível aquilo existir e eu nunca ter ouvidofalar? Passeámos pelos pavilhõesorgulhosos quando passávamos pelodistrito de Aveiro e  fomos até à Cidade da Juventude ver o que nosesperava. O palco era girocom uma espécie de passerelle até às mesas,pinturas e cores por todo o lado.
Fomos jantar. E de repente todas as pessoas levantavam o seu tabuleiro, punham os restos ao lixo, colocavam a loiça e o tabuleiro num sítio paraefeito e o lugar ficava livre e limpoMas afinal que sítio era aqueleonde todos se tratavam por camaradas e se comportavam daquela forma, de sorriso nos lábios. Lembro-me que enquanto pedia a comida todoseram simpáticos e me tratavam por tucomo se me conhecessem desdepequena.
concerto era no sábado, o nosso. Vimos os concertos de sexta e arrepiei-me. Nunca tinha visto um palco tão imponente e toda a gente adançar numa explosão de bandeiras e de saltos ao som de uma músicainstrumental. Gente que descia as ruas e se abraçava e dançava.Apanhada no meionem que não quisesse, também eu saltei e deigargalhadas.
No dia seguinte  fomos. Eu, o Pedro, o João e o Tony actuámos naCidade da JuventudeAinda hoje guardo as fotos dessa meninice. O meunamorado à data surpreendeu-me e apareceu . E assim que apareceu eunão conseguia calar-me para lhe contar desta fraternidade que saía portodos os poros, da alegria que vibrava por todos os cantos daqueleespaço. Fomos comprar coisas para comer e para beber e sentámo-nos,descalços, na relva, a olhar o palco.
Como se aquele sítio fosse nosso desde sempre. E o João disse-me, somosnós que a construímos. E eu achei que não era possível.
No dia seguinte era o dia de ir emboraEnquanto uns diziam, vamoscedonão vamos ficar para a política, pedi que nós ficássemos mais umpouco. E de repente não vi mais nada senão um mar vermelho. Uma corrubra que inundava a Atalaia enquanto se ouvia no palco Carlos Carvalhas, sobre a situação política. Lembro-me de gozar com o sotaquepela primeira vez ouvir, de facto, o que dizia. E de me arrepiar comuma música que entoavam (“Avantecamaradaavante”), seguidadaquela inenarrável e contagiante alegria da Carvalhesa ( lhe sabia onome).
Fiquei triste por ser a hora de ir embora.
Entrei no carro, estava muito calor, e fomos pela nacionalpara ser maisbaratorumo a casaNão abri a boca a viagem toda. Aquela gente, aquelas cores, aquela alegria tinha ficado entranhada na minha peleNãoera possível haver um sítio como aqueleOnde “podes ser quem tu és,ninguém te leva a malonde a gente trata a gente toda por igual”.
Ficou-me entranhada na pele, no sangue. E desde esse diatodos os anosvoltei. Com outras pessoascom famíliacom amigos um ano não fui. E  lamento nunca  ter estado com o meu PaiMas a Festa!, essa, continua aliRubra, de portas abertas, a tratar toda a gente por igual. Ehoje, sou eu quem chama a toda a gente camaradasMesmo quando é asua primeira Festa e os seus sentidos estão tão alerta quanto estavam osmeus.
São três dias que não se encontram em nenhuma parte do mundo, anossa Festa!.  
Até camaradas!


As palavras são armas

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