O impedido de Angela Merkel
Por Ana Sá Lopes, publicado em 16 Ago 2012
Existe a hipótese dramática de Passos Coelho não entender a crise do euro
Nem o mais destituído chefe de governo da zona euro seria capaz de abrir o ano político sem uma referência à crise da moeda única. Mas, na rentrée do PSD, Pedro Passos Coelho não só foi capaz disso, como de muito mais: ignorando olimpicamente o tsunami que ameaça abalroar o euro (e a economia portuguesa), Passos teve o seu momento “anjo Gabriel”, procedendo à anunciação do fim da crise para 2013.
Esta espécie de anunciação não é nova, e tanto Sócrates como vários ex- -ministros cederam à tentação de anunciar o fim da crise. Mas no dia em que o Instituto Nacional de Estatística mostra que o percurso nacional sob a tutela da troika segue em linha paralela com o destino grego (o desemprego na região de Lisboa está nos 17%, números inéditos), como explicar que o primeiro-ministro opte pelo esquecimento da mais grave crise política que atinge a Europa desde a Segunda Guerra (ou ignore a mais terrível crise económica desde a Grande Depressão)? Algumas hipóteses:
1) Passos Coelho quer continuar a explorar politicamente a saga do “regabofe” socrático, apagando por motivos estritamente partidários os cinco anos de crise internacional e a crise dos juros da dívida e da moeda única, como se os gastos de Sócrates tivessem conseguido a proeza de abalar todo o euro. Esta opção serve para nos fazer a todos de parvos, mas colhe algum sucesso entre comentadores encartados e povo avulso;
2) A segunda hipótese ainda seria mais grave: Passos Coelho acredita mesmo numa solução salazarista e preconiza que um “vamos empobrecer orgulhosamente sós” é um destino para o país. Mas, em si, isto é contraditório com uma pretensa saída da crise ou, pelo menos, com o “alívio das famílias”.
3) A terceira hipótese é mais plausível. Passos demitiu-se de ter qualquer voz própria em termos de política europeia, com medo de assustar “os nossos credores”. Acredita sinceramente que a submissão lhe vai permitir obter resultados (flexibilização das metas do défice, por exemplo). Representar o papel de impedido de Angela Merkel é, para o primeiro-ministro, um mal menor, para se distanciar dos gregos (o que os números não estão a provar, mas a boa imprensa sim).
4) Há uma quarta hipótese, mais dramática: Passos não entende a crise do euro e, em nome de um estalinismo económico, opta por oferecer o povo ao sacrifício. Infelizmente, parece absurdo, mas é o que está a acontecer.
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