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quarta-feira, 22 de agosto de 2012
ESTAÇÕES DA CP - PATRIMÓNIO CULTURAL
ESTAÇÃO DO PINHÃO-PORTUGAL - Azulejos I
A estação de caminhos-de-ferro do Pinhão, em Portugal, assentada no quilómetro 118 da Linha do Douro, é uma das mais famosas estações deste trajecto ferroviário. É famosa pelos seus 24 painéis com paisagens do Douro representativas do serviço vinhateiro da região. Em tons de azul, os azulejos são da autoria de J. Oliveira e foram encomendados à fábrica Aleluia, de Aveiro, em 1937.
Esta vila goza de uma localização privilegiada na margem direita do Rio Douro. O Pinhão é o centro da região demarcada do Vinho do Porto e o local onde estão localizadas as mais famosas "Quintas" produtoras de vinho generoso. A estação dos caminhos de ferro do Pinhão é conhecida pelos seus 24 painéis de azulejos, autênticos postais de Portugal, que retratam paisagens duriense e aspectos das vindimas. A paisagem do Pinhão está classificada pela UNESCO como património cultural da humanidade.
Rota da arte ferroviária
Os revestimentos a azulejo são uma das originalidades da arquitectura ferroviária portuguesa.
Para além dos painéis das estações mais conhecidas, como São Bento ou Aveiro, há uma quantidade impressionante de pequenas preciosidades dispersas ao longo da via, isto para só falar na Linha do Norte.
Uma viagem de Lisboa ao Porto (ou vice-versa) pela Linha do Norte pode ter um outro atractivo: a (re)descoberta dos azulejos de algumas das estações intermédias, terminando no esplendor dos painéis da estação portuense de São Bento.
Se iniciar o passeio em Santa Apolónia (pode também fazê-lo em Entrecampos, Alcântara-Terra ou nalguma das estações intermédias da Linha da Cintura) nem precisa de embarcar nos rápidos ou nos Intercidades. Os suburbanos serão a companhia ideal para este começo de viagem, pois permitir-lhe-ão ir gozando a paisagem e descer onde quiser. A primeira paragem obrigatória é Vila Franca. Os azulejos chamam imediatamente a atenção, distribuindo-se ao longo das fachadas viradas para a gare. A sua colocação remonta a 1939 e o autor é um dos grandes nomes desta área: o pintor Jorge Colaço (1865-1942), responsável, entre outras, pela decoração das estações de São Bento, Marvão-Beirã, Castelo de Vide, Lousã, Évora, etc.
Apesar de terem sido acrescentadas construções recentes em betão, se focarmos o olhar no edifício antigo da gare, facilmente nos apercebemos de como a colocação, quer dos painéis, nomeadamente os do brasão da cidade e logótipo da CP, quer dos frisos, sejam estes à volta das janelas do primeiro andar ou ao nível do rés-do-chão, contribuem para o equilíbrio da fachada. E isto é verdade, quer se observe do lado da linha, quer do exterior.
Os painéis figurativos são nada menos de 20 e correm ao longo de todas as fachadas, embora com predomínio das viradas aos cais. Representam maioritariamente cenas da vida rural ribatejana, de acordo com os estereótipos dos anos 30, desde a colheita dos cereais à criação de touros de lide. Os pescadores tradicionais do Tejo – os avieiros – e suas típicas embarcações a remos também não são esquecidos. A veia historicista de Colaço, tão bem expressa nos painéis de S. Bento, manifesta-se aqui num quadro evocativo da tomada de Goa, situado na fachada exterior da estação.
Da Azambuja a Santarém
É tempo de reembarcar, ainda num suburbano, e andar mais meia-dúzia de quilómetros até à Azambuja, com passagem pelo Carregado, lugar da primeira e aventurosa viagem do comboio em Portugal (28 de Outubro de 1856). Na Azambuja, onde termina o serviço urbano de Lisboa, encontramos mais azulejos para apreciar. Há dois grandes painéis, um em cada topo da gare, e novamente a temática é regionalista: um representa a cultura do trigo na lezíria (com o curioso pormenor de figurar uma das primeiras debulhadoras a vapor), enquanto o outro mostra fragatas e barcos de pesca dos avieiros. Foram feitos em 1935 por Carlos Mourinho, pintor-ceramista da famosa Fábrica de Loiças de Sacavém.
Retomar viagem já implica a utilização de um comboio de maior fôlego, uma vez que os próximos azulejos só aparecerão em Santarém. Quase todos os painéis ficam ao nível da gare, protegidos pelo alpendre, deixando livre a rebuscada fachada, muito ao gosto “português suave”, com águas- furtadas e beirados recurvados. A temática já é mais variada, aliando às representações das actividades agrícolas ribatejanas e seus personagens centrais, como o campino, referências aos principais monumentos da cidade. Deste ponto de vista é particularmente ilustrativa a perspectiva do interior do claustro do convento de São Francisco. Os azulejos remontam a 1927, sendo seu autor J. Oliveira, artista ligado à fábrica aveirense Aleluia.
Esplendor Aveirense
E é justamente para Aveiro que seguimos pois nos quase 200 km de linha que se seguem não há outras curiosidades arquitectónicas a assinalar. Esta estação é das mais notáveis da rede ferroviária lusa, quer pela sua integração urbana (rematando o topo norte da Avenida Dr. Lourenço Peixinho), quer pela sua exuberante decoração. Os painéis cobrem toda a fachada, quer do lado da cidade, quer do lado dos cais, e sobem desde o rés-do-chão ao telhado, Um prodígio decorativo da autoria de dois artistas locais, ligados à Fábrica Fonte Nova: Francisco Pereira e Licínio Pinto (1916). Necessidades funcionais levaram à construção doutros edifícios ao lado da antiga gare que, mesmo assim, se destaca, pintada de branco e com o azul dos azulejos a brilhar ao longe.
Os painéis são nada menos de 28 e evocam paisagens da região, cenas do quotidiano e monumentos da cidade, como é o caso do Convento de Jesus que alberga o Museu Regional e o túmulo da princesa Santa Joana. Até uma evocação da Aveiro setecentista pode ser apreciada nas paredes da estação. A isto se juntam representações de figuras populares, como peixeiras e pescadores, ou embarcações tradicionais de pesca.
O âmbito dos desenhos alarga um pouco, quer do ponto de vista geográfico, quer do ponto de vista temático. É assim que surge uma vista do Palace Hotel do Buçaco, relativamente distante de Aveiro e que a própria engenharia ferroviária também merece destaque, como é o caso do desenho da famosa ponte do Poço de S. Tiago na Linha do Vale do Vouga, perto de Sever do Vouga.
Curiosa é a forma como os azulejos se integram na fachada, procurando acompanhar ou enquadrar pormenores da mesma, sejam beirais, varandas ou janelas. Se o registo dos painéis é fotográfico, quase hiper-realista, as molduras que os rodeiam são de um rebuscado quase barroco.
Quatro paragens até à Beira-Douro
No troço final da viagem, ou seja, nos cerca de 60 km que falta percorrer até ao Porto, justifica-se uma série de paragens, pelo que os comboios regionais ou suburbanos podem voltar a ser opções interessantes.
A primeira surpresa é a estação de Avanca, profusamente decorada com 18 painéis dos mesmos autores da estação de Aveiro (1929). Da forma do edifício à inserção dos quadros, tudo lembra a estação que acabámos de deixar. A temática é semelhante, muito embora os artistas tenham apostado mais completamente na representação da vida local, com retrato de alguns personagens populares, das leiteiras a um cantador popular. Fora isso, são sucessivas imagens de fontes, trechos da ria, barcos tradicionais e, curiosamente, a própria estação, vista de fora e, na altura, não rodeada pelo casario.
Ovar, a estação decorada seguinte, tem a curiosidade de uma parte dos painéis representarem locomotivas a vapor. Da autoria de Licínio Pinto remontam ao período compreendido entre 1915 e 1919. Modernamente foram acrescentados painéis representando comboios eléctricos, desenhados num registo semelhante.
A pequena estação da Granja, alguns quilómetros a norte de Espinho, na zona onde a linha corre mais perto do mar, é interessante, tanto pela arquitectura, como pela decoração. Mistura elementos de inspiração arte nova e modernistas na composição da fachada exterior. Já a decoração a azulejo, que remonta a 1914, é da autoria dos nossos já conhecidos Francisco Pereira e Licínio Pinto. Tem o interesse de representar uma paisagem ribeirinha já desaparecida, fortemente transformada por décadas de crescimento urbano.
Imediatamente a norte e servindo outra antiga estância balnear, a pequena estação da Aguda tem desenho assumidamente modernista. No entanto, os dois painéis de azulejos que a decoram, cada um em sua extremidade, têm uma aparência bastante mais clássica. No entanto, um segundo olhar identificará um registo quase hiper-realista na representação da praia durante a época balnear. A obra é de J. Oliveira (1941), pintor ceramista ligado à Fábrica Aleluia e cuja obra mais conhecida são os azulejos da estação do Pinhão, na Linha do Douro.
E é aqui, com o Douro já poucos quilómetros a norte que termina esta viagem pelos azulejos da Linha do Norte. A chegada, dir-se-ia apoteótica faz-se na estação de São Bento, decorada pelas obras-primas de Jorge Colaço (1922). Mas a estação central portuense daria, por si só, tema para uma nova visita e um novo artigo.
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