O capitalismo foi introduzido como uma uma força económica hegemónica com fortes indústrias no século XIX em Portugal. Na segunda metade do século XIX o sector industrial português tinha crescido o suficiente para produzir uma classe operária significativa e as primeiras organizações operárias e sindicatos começaram a ser criados. Em finais desse século começaram a aparecer as primeiras tendências socialistas utópicas e também tendências sob influência do marxismo e do anarquismo com a criação do primeiro partido operário (o “Partido Socialista Português”) e o primeiro movimento sindical operário de âmbito nacional. O capitalismo completou a sua ascenção ao poder político com o derrube do feudalismo (da monarquia feudal) em 1910 através da sua revolução burguesa – matando um dos últimos reis, derrubando a monarquia e introduzindo como novo poder uma república democrática-burguesa pela primeira vez.
Entre 1910 e 1926 o movimento operário foi demasiado forte para o gosto do capitalismo e a burguesia e pequeno-burguesia eram demasiado beligerantes entre elas próprias de forma a que pudessem consolidar o poder burguês da forma que os capitalistas desejavam. Então em 1926 um golpe militar fascista resolveu esses problemas do capitalismo de forma violenta, pelo uso da força.
Foi nesse periodo 1910-1926 que os operários e os simpatizantes do marxismo portugueses responderam ao apelo da Revolução de Outubro de criar o Partido Comunista. Em 1917 as notícias da Revolução chegaram a Portugal. Em 1919 a Federação Maximalista Portuguesa (FMP) foi criada principalmente a partir de sindicalistas anarquistas que apoiavam os bolcheviques e a revolução soviética e também por um número reduzido de marxistas do moribundo Partido Socialista Português. Da pequena FMP um pequeno grupo fundou o Partido Comunista Português (PCP) em 1921. Delegados estrangeiros do Comintern, principalmente espanhóis, apoiaram o grupo da FMP ao longo do processo de criação do novo partido, no seu primeiro congresso e na eleição da sua liderança.
Carlos Rates, o primeiro secretário-geral do PCP, tornou-se um fascista depois do golpe de Estado de 1926. Nesses 5 anos (1921-1926) o partido foi liderado de forma pobre e confuse e não teve tempo de criar uma linha política clara. Quando Carlos Rates foi expulso do partido em 1926, por apoiar a aliança do PCP com partidos democrático-burgueses, o PCP não era realmente uma organização unificada e centralizada mas sim uma coleção de grupos locais ou regionais. Bento Gonçalves (que morreu no campo de concentração fascista e assassino do Tarrafal) tentou liderar a primeira reorganização do PCP, ele foi secretário-geral de 1929 a 1937. No entanto o PCP foi reorganizado novamente em 1940-1941, o que significa que o partido não teve uma organização a funcionar de forma estável até então. A questão da liderança é ainda mais grave porque de 1937 a 1961 (desde a morte de Bento Gonçalves até à eleição de Álvaro Cunhal como SG do PCP) não existiu um secretário-geral do PCP oficialmente reconhecido como tal. Tudo isto indica erros de organização, as consequências da repressão fascista e acima de tudo uma dura luta entre esquerda e direita dentro do PCP.
Por outro lado entre a expulsão do traidor Carlos Rates em 1926 e a eleição de Álvaro Cunhal como SG do PCP em 1961 o Partido viveu grandes lutas e (na minha opinião) os seus melhores momentos históricos. Em 1930 os sindicalistas do PCP formaram a Comissão Inter-Sindical (CIS) como membro e apoiante da Internacional Sindical Vermelha (Profintern) rompendo com a então maioritária Confederação Geral do Trabalho (CGT), anarco-sindicalista. Em 1934 o PCP e os anarquistas da CGT tentaram tomar o poder numa insurreição nacional da classe operária mas só na pequena zona urbana industrial da Marinha Grande os operários liderados pelo PCP conseguiram efectivamente tomar o poder, desarmando a polícia local e criando o soviete da Marinha Grande. O soviete da Marinha Grande foi esmagado numa questão de horas. A avaliação interna do PCP sobre a insurreição operária da Marinha Grande foi uma crítica esmagadora, creio que exagerada e injusta. Os líderes do PCP falharam em ver que mais além do momento, mais além da derrota do momento, aquela insurreição operária numa pequena cidade deveria e poderia ser uma inspiração para a futura insurreição operária de Portugal inteiro e o futuro poder operário socialista soviético em Portugal.
O esmagamento da insurreição da Marinha Grande em 1934 custou as vidas de dezenas de operários e comunistas durante o enfrentamento armado e no campo da morte lenta do Tarrafal. Mas é interessante que foi nas vésperas do VII Congresso da Internacional Comunista de 1935 que apoiou a política de alianças do tipo Frente Popular (basicamente uma aliança anti-fascista entre comunistas e sociais-democratas). O efeito imediato particular do VII Congresso da IC no PCP foi dissolver a já ilegalizada (e duramente reprimida) Comissão Inter-Sindical (CIS) e começar a infiltração nos sindicatos fascistas que eram os únicos permitidos pelo regime fascista português.
Um esboço da história do Partido Comunista Português (PCP) – segunda parte
A presença de camaradas portugueses na Guerra nacional revolucionária de Espanha (1936-1939), a morte de Bento Gonçalves em 1937 (assassinado pelos fascistas) e uma suspeita bastante séria que presumíveis agentes do Estado fascista estavam infiltrados no comité central antes da reorganização de 1940-1941 foram estremecendo o partido pelos altos e baixos desses anos. Pouco tempo antes da reorganização de 1940-1941 o PCP foi colocado fora do Comintern (algo que não tinha acontecido nem nos anos de Carlos Rates apesar da sua traição). Porém, apesar destas fraquezas, o partido estava a crescer e a tornar-se numa organização em constante expansão e com uma linha ideológica fixa desde que Álvaro Cunhal se tornou líder da juventude comunista em 1935 (ano em que chega a secretário-geral da Federação das Juventudes Comunistas) e participou no VII Congresso da Internacional Comunista.
A peculiar história do PCP de 1935 a 1974 é acerca de criar uma espécie de frente popular sem elementos chave da frente popular: não existem partidos organizados aparte do PCP e o partido fascista governante, não existe partido da social-democracia e não existe possibilidade de fazer política parlamentar. O que resultou desta situação foi que o PCP se concentrou em infiltrar os sindicatos fascistas e em criar alianças anti-fascistas dentro deles que foram muito facilmente e obviamente dominadas pelo PCP uma vez que era o único partido realmente existente dentro dos sindicatos (para além do partido fascista). Por outro lado o PCP deu algum apoio de forma mais ou menos crítica a uma oposição burguesa muito desorganizada (baseada mais em personalidades do que em organizações) que participou nas “eleições” fraudulentas fascistas como forma de recrutar a classe média intelectual e de forma a pescar na “popularidade” do momento.
De 1949 a 1960 Álvaro Cunhal – visto como sucessor natural de Bento Gonçalves – esteve nas prisões fascistas, junto com muitos dos melhores quadros do PCP. O PCP em finais dos anos 1950s era não oficialmente mas de facto liderado por Júlio Fogaça que guiou o partido para o eurocomunismo e para as teses inteiras de Khrushchev sobre a via pacífica para o socialismo. Em 1960 um grande grupo junto com Álvaro Cunhal escapou da prisão de alta segurança, o Forte de Peniche, e imediatamente depois derrubou a liderança de Júlio Fogaça dentro do PCP. A crítica a Júlio Fogaça não se esquivou de questionar elementos das teses de Khrushchev, mas ao mesmo tempo aceitou essas mesmas teses num possível contexto diferente – não haveria transição pacífica do fascismo para a democracia burguesa mas quanto à “transição pacífica da democracia burguesa para o socialismo” a postura é ambígua, coloca todas as hipóteses como possíveis (incluindo este última transição) e chega a ser mesmo elogiosa das teses de Khrushchev.
Ao mesmo tempo surge a cisão do PCP do grupo maoísta formado sob a liderança de um quadro de topo anteriormente bastante próximo de Álvaro Cunhal. O grupo maoísta não acrescenta muito ao contexto político a não ser a defesa imediata da luta armada (outros assuntos como as críticas ao Khrushchev rapidamente se esquecem). O PCP responde aos maoístas e a pressões de dentro do partido arrastando os pés até à fundação da Acção Revolucionária Armada (ARA) em 1970 (activa até 1973). De qualquer forma os pequenos grupos armados anti-fascistas existentes não tiveram um papel principal no derrube do fascismo em 1974 – derrube que aconteceu por acção de oficiais de hierarquia militar intermédia do exército fascista (atolados numa guerra contra os movimentos de libertação das colónias africanas sob domínio português desde 1961) que estavam fartos de serem mortos numa guerra sem esperança que ia ser perdida.
peloantimperialismo.wordpress.com
A presença de camaradas portugueses na Guerra nacional revolucionária de Espanha (1936-1939), a morte de Bento Gonçalves em 1937 (assassinado pelos fascistas) e uma suspeita bastante séria que presumíveis agentes do Estado fascista estavam infiltrados no comité central antes da reorganização de 1940-1941 foram estremecendo o partido pelos altos e baixos desses anos. Pouco tempo antes da reorganização de 1940-1941 o PCP foi colocado fora do Comintern (algo que não tinha acontecido nem nos anos de Carlos Rates apesar da sua traição). Porém, apesar destas fraquezas, o partido estava a crescer e a tornar-se numa organização em constante expansão e com uma linha ideológica fixa desde que Álvaro Cunhal se tornou líder da juventude comunista em 1935 (ano em que chega a secretário-geral da Federação das Juventudes Comunistas) e participou no VII Congresso da Internacional Comunista.
A peculiar história do PCP de 1935 a 1974 é acerca de criar uma espécie de frente popular sem elementos chave da frente popular: não existem partidos organizados aparte do PCP e o partido fascista governante, não existe partido da social-democracia e não existe possibilidade de fazer política parlamentar. O que resultou desta situação foi que o PCP se concentrou em infiltrar os sindicatos fascistas e em criar alianças anti-fascistas dentro deles que foram muito facilmente e obviamente dominadas pelo PCP uma vez que era o único partido realmente existente dentro dos sindicatos (para além do partido fascista). Por outro lado o PCP deu algum apoio de forma mais ou menos crítica a uma oposição burguesa muito desorganizada (baseada mais em personalidades do que em organizações) que participou nas “eleições” fraudulentas fascistas como forma de recrutar a classe média intelectual e de forma a pescar na “popularidade” do momento.
De 1949 a 1960 Álvaro Cunhal – visto como sucessor natural de Bento Gonçalves – esteve nas prisões fascistas, junto com muitos dos melhores quadros do PCP. O PCP em finais dos anos 1950s era não oficialmente mas de facto liderado por Júlio Fogaça que guiou o partido para o eurocomunismo e para as teses inteiras de Khrushchev sobre a via pacífica para o socialismo. Em 1960 um grande grupo junto com Álvaro Cunhal escapou da prisão de alta segurança, o Forte de Peniche, e imediatamente depois derrubou a liderança de Júlio Fogaça dentro do PCP. A crítica a Júlio Fogaça não se esquivou de questionar elementos das teses de Khrushchev, mas ao mesmo tempo aceitou essas mesmas teses num possível contexto diferente – não haveria transição pacífica do fascismo para a democracia burguesa mas quanto à “transição pacífica da democracia burguesa para o socialismo” a postura é ambígua, coloca todas as hipóteses como possíveis (incluindo este última transição) e chega a ser mesmo elogiosa das teses de Khrushchev.
Ao mesmo tempo surge a cisão do PCP do grupo maoísta formado sob a liderança de um quadro de topo anteriormente bastante próximo de Álvaro Cunhal. O grupo maoísta não acrescenta muito ao contexto político a não ser a defesa imediata da luta armada (outros assuntos como as críticas ao Khrushchev rapidamente se esquecem). O PCP responde aos maoístas e a pressões de dentro do partido arrastando os pés até à fundação da Acção Revolucionária Armada (ARA) em 1970 (activa até 1973). De qualquer forma os pequenos grupos armados anti-fascistas existentes não tiveram um papel principal no derrube do fascismo em 1974 – derrube que aconteceu por acção de oficiais de hierarquia militar intermédia do exército fascista (atolados numa guerra contra os movimentos de libertação das colónias africanas sob domínio português desde 1961) que estavam fartos de serem mortos numa guerra sem esperança que ia ser perdida.
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