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domingo, 29 de novembro de 2015

AZEITES - O Alentejo está diferente. Em pouco mais de uma década, os searões de cereal deram lugar às florestas de oliveiras.



Azeites
Paulo Barriga
O Alentejo está diferente. Em pouco mais de uma década, os searões de cereal deram lugar às florestas de oliveiras. 
De celeiro da nação, o Alentejo, em especial o território onde chega a água do Alqueva, passou a lagar da Europa. O verde impôs-se ao amarelo doirado. Ao deserto sucedeu o oásis. 
O Alentejo está diferente. Mas será que o Alentejo da azeitona é assim tão diferente do Alentejo do bago de trigo? Nalgumas aspetos, sim, noutros… É evidente que o incremento do olival propiciou uma amável euforia ao nível das empresas agrícolas. 
Obrigou a investimentos como nunca até aqui se tinham visto nem imaginado. E, se nalguns casos ainda não está a ser, promete ser generoso no retorno do empreendimento feito. Isto em termos financeiros, claro. Pela primeira vez Portugal é autossuficiente nalguma coisa de real valor e essa coisa é o azeite. 
O clima, a água e a qualidade dos solos ajudam. Até os mercados têm dado uma mãozinha. Na cor com que se pinta, o Alentejo está realmente diferente. A monocultura da oliveira trouxe tonalidades pouco vistas nestes campos ao nível da confiança, do atrevimento, do risco, da esperança, quase da euforia. 
Mas esta toada entusiástica pode esconder, está a esconder, algumas zonas de sombra. Uma delas é sem dúvida a posse e o uso da terra. A quantidade e sobretudo a qualidade extraordinária do azeite aqui produzido têm proporcionado boas e modernas práticas agrícolas, mas também têm sido chamariz para muitos aventureiros cujo objetivo único é o lucro fácil e apressado. 
Em Espanha existem exemplos pouco dignificantes de como a soberba e o aventureirismo podem matar em poucos anos a galinha dos ovos de ouro. Se, por um lado, a pressão agrícola desregrada nos olivais pode ferir de morte o ambiente, por outro, a pressão financeira e económica pode abalar de forma empenhada o tecido social. 
Não vale a pena continuar a encobrir o que está à vista de todos. As campanhas da azeitona estão a transformar-se em autênticos mercados de escravos. Por muito que as polícias redobrem a atenção e intensifiquem as suas atuações, multiplicam-se os casos de tráfico humano nos olivais do Sul. 
Por esta altura há gente aos magotes a viver em condições desumanas, amontoada em cubículos insalubres, subnutrida, explorada até ao tutano. Gente que sobrevive do rabisco não das oliveiras, mas dos contentores do lixo dos supermercados e das aldeias. Como é óbvio, nem todos os produtores têm as mãos sujas. 
E cabe precisamente a estes, aos que respeitam as boas práticas ambientais e laborais, o dever da denúncia. A subcontratação de mão-de-obra não prova nem justifica o desconhecimento e muito menos o silêncio. Neste momento, podemos ter, do ponto de vista organolético, o melhor azeite do mundo. 
Mas está maculado com trabalho escravo. Mesmo tratando--se de azeite, neste ponto, parece não haver virgens e muito menos virgens-extra quando o que escorre do aperto das azeitonas é o néctar da desumanidade. 
O Alentejo está diferente, mas se calhar nem tanto quanto isso.

1 comentário:

José Gonçalves Cravinho disse...

Eu,filho de pobres trabalhadores do campo e um simples operário emigrante na Holanda onde resido desde 1964 e já velhote,91 anos de idade,digo que os intermediários que »contratam» os escravos plebeus,dum modo geral,são também da classe plebeia tal como a maior parte dos Polícias que protegem os Poderosos e espancam o Povo.A pulhice humana não tem limites.