Carta a cavaco (aberta)
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Eis xelentíssimo senhor:
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Portugal tem um longo historial de dignitários portadores orgulhosos das mais diversas taras do foro psíquico: loucos varridos como D. Pedro I ou D. Maria I, simples idiotas como D. Afonso V ou D. José, ou mesmo rotundos imbecis como D. João VI ou Américo Tomás.
D. Pedro I, por exemplo, além de gostar muito de um certo escudeiro (segundo o grande Fernão Lopes, “mais do que se deve aqui dizer ") mandou "cortar-lhe aqueles membros que os homens em maior apreço têm" porque o infeliz “dormiu com uma mulher casada”. Além disso D. Pedro tinha uma curiosa ideia da celeridade na justiça: para não atrasar a aplicação das sentenças, punia com pena de morte a prática da advocacia (o que decerto terá desvanecido até às lágrimas a alma lúgubre do advogado Júdice que, numa espécie de “vingança poética”, privatizou o nome do monarca e da sua amada espanhola criando, na sua quinta de Coimbra, a muito exclusiva marca registada “Pedro e Inês”).
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Contudo hoje vivemos numa república, isto é, temos o privilégio de eleger quem nos representa e o direito, e até a responsabilidade, de o destituir quando o seu comportamento, por grosseria ou omissão, passa as marcas do civicamente aceitável.
Receio que se trate do seu caso, senhor presidente. Há muito que a sua alma penada dá mostras de uma estupidez malévola, de um cinismo acanalhado e de uma torpeza de espírito tão mais notórios pelos seus silêncios cúmplices de uma vasta casta de iniquidades como por uma incontinência verbal que se aproxima, à vista grossa, da insanidade ou da idiotia.
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Como não vejo nenhum sobressalto cívico que vise a sua destituição por indecência e fraca figura, sinto-me obrigado, como modesto cidadão no seu direito à livre opinião, a tornar público que me sinto profundamente envergonhado e repugnado por me ver representado por um imbecil.
Recentemente, em visita a um país árabe, como caixeiro viajante da gloriosa tarefa auto-atribuída de vender o país ao estrangeiro, voxelência declamou (alarvemente como é seu hábito e esquecendo-se, concerteza por lapso, das vaquinhas e das cagarras) “cavalos, mulheres bonitas, até aviões” na longa lista de “bens transaccionáveis” ainda disponíveis em Portugal.
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Xelentíssimo senhor:
sou filho de uma mulher portuguesa. Casei com outra e sou pai de outra. Sinto-me por isso moralmente obrigado a declarar-lhe que não estão à venda. Não porque sejam "feias". Ou “minhas”. Mas porque não são “propriedade”; nem tudo na vida obedece à lógica dos “mercados”, sabe – como deduzo no entanto que este seja um conceito demasiado subtil para o seu obtuso discernimento, permito-me enunciá-lo em linguagem que decerto entende: há bens que não são “transaccionáveis”- que-não-se-compram–nem-se-vendem porra, ponto.
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Por isso mesmo, e com o respeito devido ao “primeiro magistrado da nação”, permito-me humildemente sugerir-lhe, e a quem se sinta representado por si, que venda as suas: a sua mulher, a sua filha, as suas netas, se as tiver e, porque não, até a puta que o pariu.
Pode ser que alguém lhe dê algum por elas.
Depois (ou antes) demita-se. Por mim não receberia nem um tusto de pensão (aqui entre nós, o lucro da venda desses “activos que não desvalorizam” e os rendimentos que conseguiu a 140% ao ano no BPN deveriam bastar-lhe para viver confortavelmente o tempo que lhe sobra).
De seguida, sugiro-lhe que faça como as andorinhas: desloque-se para um qualquer país do sul. Pode ser a Guiné Equatorial. Ou o Dubai. Desapareça. E não volte.
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Sem consideração,
Fernando campos
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P.S. –E se por acaso por lá lhe acontecer outro episódio, vagal ou concreto, trate-se no sistema nacional de saúde local. É igualzinho ao que o seu governo, com a sua prestimosa colaboração, tem cuidado de instalar em Portugal.
ositiodosdesenhos.blogspot.pt
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