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sábado, 29 de novembro de 2014

ANTIGOS CONTOS POPULARES - O COMPADRE DA MORTE



O COMPADRE DA MORTE

UM lavrador pobre tinha tantos filhos que não sabia a quem convidar para padrinho dos recém-nascidos. Quási todos na aldeia eram compadres dele. Nascendo-lhe mais um filho, fico atrapalhado para saber quem levasse a criança ao batismo. Estava pensando no caso quando passou por êle um homem muito alto, magro, vestido de branco, que parou e o cumprimentou amavelmente. O lavrador perguntou se êle aceitava ser o padrinho do seu filho mais moço.
 Sabes quem sou eu?
 Naô senhor! Mas me parece ser homem honrado e bom!
 Sou a Morte e aceito ser teu compadre. Acompanhou o lavrador à igreja, ficando seu
compadre. Quando voltaram a casa, a Morte disse:
 Escute lá. Não tenho dinheiro nem fazenda para o meu afilhado, mas posso fazer o meu compadre tornar-se um homem rico.
 Como será isso, meu compadre?
 Preste atenção! Diga a todos que é medico e vá atender aos doentes. Quando lá chegar me verá. Se eu estiver no lado da cabeça do enfermo, dê o que quiser e êle curar-se-á, mas se eu estiver aos pés da cama, o homem’está perdido.
 Pois é caso entendido, meu compadre.
Começou o lavrador, que era desempenado e afoito, a dizer-se curandeiro e visitar doentes por toda a vizinhança. Quando via a Morte perto da cabeceira do doente, punha-o sadio em poucos dias. Quando via a Morte aos pés do enfermo, receitava umas águas simples, cobrava o dinheiro e se ia embora, desenganando a todos.
Ganhou fama e proveitos crescidos, ficando rico e conhecido em toda a parte.
Já muito velho, o curandeiro foi chamado por um homem muito poderoso e rico. Apesar de relutar, dizendo-se cansado e não mais podendo aceitar consultas, foi obrigado a pôr-se numa carruagem e ir. Lá chegando, logo que olhou para o quarto do ricaço, avistou o compadre Morte, bem sentado aos pés da cama. A família do enfermo prometia os castelos de Espanha se o chefe recobrasse a saúde. O curandeiro imaginou um plano de burlar o pacto com a Morte e ganhar mais aquela fortuna. Mandou voltar o leito, de maneira a ficar os pés onde estava a cabeça e esta onde estavam os pés. A Morte, assim que voltearam a cama, foi-se embora, sem dizer uma só palavra.
O curandeiro recebeu uma gorda quantia e voltou para casa satisfeito.
Anos depois, a Morte veio visitá-lo e lhe disse: — Meu compadre, de hoje a um ano virei buscá-lo porque deve ter chegado o dia de sua viagem…
O Curandeiro ficou espavorido com o anúncio. Para enganar a Morte mais uma vez, quando se aproximou o dia fatal, pintou os cabelos de preto, pôs umas barbas retintas, convidou uns amigos e começou a beber e a rir, como se fosse outra pessoa.
Chegou a Morte e, não o vendo, perguntou pelo seu compadre. Todos os convidados responderam que o dono da casa não estava e nem sabiam quando êle voltaria.
— Ora, ora — monologou a Morte, desaponta da — como não posso perder meu tempo nem a mi nha viagem, vou levar esse barbadão bebedor…
E levou com ela o seu compadre.
É conto muito popular em vários folclores europeus. Sua origem não portuguesa denuncia-se pela Morte aparecer no masculino. O mesmo ocorre na versão da Baixa Bretanha, recolhida por F. M. Luzel, L’Hommem Juste, onde a Morte é masculina, ann Anhou em bretão, obrigando o tradutor francês a escrever Trepas em vez de Mort, Legendes Chrétiennes de la Basse-Bretagne, Paris, 1881. Há o mesmo processo de burlar a Morte. No Brasil, Gustavo Barroso registou uma variante do Ceará, A lenda da Morte, onde esta, libertada de uma armadilha, o mondéu, prometeu 120 anos de vida robusta a um sertanejo que, pelando-se todo, para fugir ao pagamento da cláusula, foi carregado por ela, dizendo: levo em, lugar dele este pecado dançador! p. 708, Ao som da Viola, Rio de Janeiro, 1921. Mt. 332 de Aarne-Thompson, Oodfather Death.Registado em Bolte e Po-livka, 1, 377 dos estudos sobre os contos dos irmãos Grimm, onde figura sob o n.° 44, R. T. Christiansen, Danske Studier, 71, na coleção dos contos da Sicília de Laura Gonzebach, n.° 19, nos russos de Afanasiev, n.° 9, do 1.°, conhecido na literatura oral da Estônia, Filândia, Lapônia, Dinamarca, Noruega, Flandres, etc. apud, Stith Thompson, Antti Aarne, The Types of the Folk-Tale, p. 5’9- 60. (Cascudo)
www.consciencia.org

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