Austeridade, emigração e desemprego
Na linha de declarações como as proferidas há uns meses por Maria Cavaco Silva ou Joaquim Azevedo, Passos Coelho garantiu recentemente ser «falsa» a ideia de que «o desemprego só baixa porque as pessoas emigram», acrescentando que Portugal tem sido um país de emigração desde há muitos anos e que a situação de «hoje não é muito diferente de 2007 ou 2008».
Num ponto o primeiro-ministro tem razão: não é «só» a emigração que contribui para gerar a ilusão de que o desemprego está a baixar de forma relevante. Como procurei demonstrar aqui, uma estimativa minimamente credível dos verdadeiros níveis de desemprego há-de somar, ao número oficial de desempregados, os «desempregados ocupados» e os «desencorajados», bem como as estimativas de «expatriados» (ou seja, da emigração de população activa). O que faz com que a diferença entre os valores de «desemprego oficial» e de «desemprego real» daí resultantes aumente de quatro pontos percentuais (Junho de 2011) para treze pontos percentuais (Setembro de 2014).
Mas concentremo-nos na relação entre emigração e desemprego. De acordo com as estimativas disponíveis mais credíveis, não é verdade - ao contrário do que diz Passos Coelho - que Portugal seja, há muitos anos, um país de emigração. De facto, a inversão mais recente do saldo migratório ocorreu apenas em 2011, quando o número de saídas (emigrantes) passou a superar o das entradas (imigrantes), agravando-se desde então até se atingir, em 2013, uma perda líquida de -36 mil pessoas (sendo que o saldo migratório ainda era positivo em 2010, em cerca de 4 mil).
Mas há mais: também não é verdade que a emigração tenha estado a aumentar ao longo dos últimos anos. De facto, o seu valor até diminuiu entre 2007 e 2010 (ano em que se estima tenham saído do país cerca de 70 mil pessoas), para acelerar desde então até às cerca de 110 mil saídas, em 2013. Uma explicação plausível para esta inversão é aliás dada pelo próprioObservatório da Emigração, que associa a descida dos valores, entre 2008 e 2010, aos «impactos da crise financeira global» (não sendo portanto uma originalidade portuguesa, no contexto da União Europeia) e o seu recrudescer, a partir dessa data, à «assimetria da crise das dívidas soberanas na Europa». Tornando pois sobejamente evidente a estreita relação que existe entre fluxos migratórios e políticas de austeridade.
E nem de propósito, uma investigação recente, no âmbito do Projecto «Generation E», vem confirmar o que há muito se suspeita: que os dados oficiais não contam tudo, estimando-se que «o número de jovens que emigraram dos países do Sul da Europa seja o dobro do registado», sobretudo pela falta de assentamentos oficiais das saídas e pelo facto de muitos dos que emigraram (cerca de metade, em diferentes países) não terem alterado a sua residência. A título de exemplo, é referido que «só o número de entradas registadas nos três países com mais imigração portuguesa em 2013 - Reino Unido, Suíça, Alemanha, num total de 55.910 indivíduos - é mais elevado do que aquele que é apontado pelo INE para as saídas permanentes no mesmo ano para todos os destinos (53.786)». Ou seja, um exemplo do que Saskia Sassen designa por «eventos invisíveis».
Mas há ainda um outro dado desta investigação que importa reter. Dos jovens emigrantes portugueses abrangidos pelo estudo, cerca de 86% referenciam as «questões laborais» entre os factores que estiveram na base da decisão por emigrar, o que reforça, novamente, a ideia de que a recente sangria de quadros qualificados é indissociável da escolha, empobrecedora, inútil e fracassada, pelas políticas de austeridade como forma de sair da crise.
Num ponto o primeiro-ministro tem razão: não é «só» a emigração que contribui para gerar a ilusão de que o desemprego está a baixar de forma relevante. Como procurei demonstrar aqui, uma estimativa minimamente credível dos verdadeiros níveis de desemprego há-de somar, ao número oficial de desempregados, os «desempregados ocupados» e os «desencorajados», bem como as estimativas de «expatriados» (ou seja, da emigração de população activa). O que faz com que a diferença entre os valores de «desemprego oficial» e de «desemprego real» daí resultantes aumente de quatro pontos percentuais (Junho de 2011) para treze pontos percentuais (Setembro de 2014).
Mas concentremo-nos na relação entre emigração e desemprego. De acordo com as estimativas disponíveis mais credíveis, não é verdade - ao contrário do que diz Passos Coelho - que Portugal seja, há muitos anos, um país de emigração. De facto, a inversão mais recente do saldo migratório ocorreu apenas em 2011, quando o número de saídas (emigrantes) passou a superar o das entradas (imigrantes), agravando-se desde então até se atingir, em 2013, uma perda líquida de -36 mil pessoas (sendo que o saldo migratório ainda era positivo em 2010, em cerca de 4 mil).
Mas há mais: também não é verdade que a emigração tenha estado a aumentar ao longo dos últimos anos. De facto, o seu valor até diminuiu entre 2007 e 2010 (ano em que se estima tenham saído do país cerca de 70 mil pessoas), para acelerar desde então até às cerca de 110 mil saídas, em 2013. Uma explicação plausível para esta inversão é aliás dada pelo próprioObservatório da Emigração, que associa a descida dos valores, entre 2008 e 2010, aos «impactos da crise financeira global» (não sendo portanto uma originalidade portuguesa, no contexto da União Europeia) e o seu recrudescer, a partir dessa data, à «assimetria da crise das dívidas soberanas na Europa». Tornando pois sobejamente evidente a estreita relação que existe entre fluxos migratórios e políticas de austeridade.
E nem de propósito, uma investigação recente, no âmbito do Projecto «Generation E», vem confirmar o que há muito se suspeita: que os dados oficiais não contam tudo, estimando-se que «o número de jovens que emigraram dos países do Sul da Europa seja o dobro do registado», sobretudo pela falta de assentamentos oficiais das saídas e pelo facto de muitos dos que emigraram (cerca de metade, em diferentes países) não terem alterado a sua residência. A título de exemplo, é referido que «só o número de entradas registadas nos três países com mais imigração portuguesa em 2013 - Reino Unido, Suíça, Alemanha, num total de 55.910 indivíduos - é mais elevado do que aquele que é apontado pelo INE para as saídas permanentes no mesmo ano para todos os destinos (53.786)». Ou seja, um exemplo do que Saskia Sassen designa por «eventos invisíveis».
Mas há ainda um outro dado desta investigação que importa reter. Dos jovens emigrantes portugueses abrangidos pelo estudo, cerca de 86% referenciam as «questões laborais» entre os factores que estiveram na base da decisão por emigrar, o que reforça, novamente, a ideia de que a recente sangria de quadros qualificados é indissociável da escolha, empobrecedora, inútil e fracassada, pelas políticas de austeridade como forma de sair da crise.
ladroesdebicicletas.blogspot.pt
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