A história do padre Alípio Lima, que andou várias semanas nos jornais depois de se ter queixado à GNR contra duas prostitutas que o terão extorquido e chantageado, podia ter morrido com o seu regresso à paróquia, em Vila Nova de Anha, Viana do Castelo. Podia, mas não morreu. Porque, um dia depois, o seu irmão, o padre Adão Lima, foi acusado de extorquir dinheiro aos paroquianos de Deão e Subportela, outras duas paróquias do concelho. Mas enquanto Alípio mostrou arrependimento e até acabou aplaudido pelos paroquianos, Adão tem meia paróquia a querer vê-lo dali para fora.
"Tem um defeito muito grande", resume a paroquiana Rosa Gomes, "é doente por dinheiro." As acusações contra o pároco, que tem um processo em tribunal por falta de pagamento de uma dívida, vão desde a recusa da confissão a doentes à ameaça de excomunhão dos que recusam financiar obras da Igreja. "Chegou a dizer, durante a homilia, que quem não quisesse dar o dinheiro podia pegar nele, comprar veneno e envenenar-se", acrescenta o presidente da Junta de Subportela, Ilídio Rego, incompatibilizado com o padre: "Já chega de ameaçar, enxovalhar e humilhar os paroquianos."
O nome de Adão da Silva Lima galgou as fronteiras do concelho depois de ter conseguido que Daniel Gonçalves Dias, 89 anos, assinasse um contrato em que o idoso emprestava 50 mil euros para a construção de uma creche e de um lar na freguesia de Deão. O documento fez desconfiar os herdeiros. Intitulado "Contrato de Financiamento Particular de Mútuo sem Garantias Hipotecárias e Sem Juros", estabelece que o empréstimo é por cinco anos e que não incidem sobre ele juros legais nem moratórias. E estabelece que, se o idoso falecer, o empréstimo passa a doação: "É sua vontade que nenhum dos possíveis herdeiros não poderão [sic] por qualquer forma exigir para si esta quantia que hoje empresta e que futuramente será transposta como doação ao Centro Social Paroquial de Deão." Em troca, o idoso recebeu um "diploma de benemérito", onde, num português já menos trôpego, o padre surge na qualidade de presidente do Centro Social Paroquial de Deão e do conselho da fábrica para os assuntos económicos a agradecer, "muito penhorado", o contributo. "Que Deus multiplique por muito o que fizestes e continuareis a fazer em prol dos mais carenciados das nossas sociedades hodiernas."
Para o jurista que está a analisar o caso, o contrato "pode ser considerado nulo em tribunal". "A lei proíbe que uma pessoa ponha o seu advogado no testamento ou faça uma doação ao seu médico. Parece-me claro que o padre se faz valer do seu ascendente psicológico sobre os paroquianos para ficar com os seus bens. É como se lhes estivesse a vender conforto espiritual." Um dos 62 sobrinhos do "benemérito" concorda. "O padre aproveitou-se da fragilidade do meu tio e convenceu-o de que, se desse o dinheiro, teria lugar no lar de idosos e muito provavelmente no Céu." Nenhum aceita ter o nome no jornal.
Na freguesia de Subportela - margem esquerda do rio Lima, pouco mais de mil habitantes - correm histórias sobre empréstimos semelhantes. Mas o que traz os habitantes de mal com o padre parecem ser os constantes pedidos de dinheiro. "Há aqui pessoas com muita idade que levaram vidas sofridas. Trabalharam a vida toda debaixo de chuva, se vão à missa é para ouvir uma palavra de conforto. Não é para serem insultadas pelo padre, quando não lhe dão o dinheiro que ele quer", indigna-se Tiago Afonso, um dos poucos que aceitam dar o nome. Com 45 anos, sustento assegurado pelo seu trabalho de instalação de iluminações e amplificações sonoras das festas e romarias de arredores, este habitante da freguesia de Subportela diz-se farto das homilias do padre Adão. "Ele chegou a dizer na missa que ainda bem que o sigilo bancário ia acabar, porque assim ia poder saber quem é que tinha dinheiro na conta e não dava para a Igreja."
Na Páscoa, no Natal e sempre que alguma obra o requer, o método não varia. "No início distribuía os envelopes pelas caixas de correio. Depois passou a fazer uma pagela dobrada chamada "A Semente" e a colocar lá dentro um envelope. As pessoas vão à missa, levam a pagela para casa, escrevem o nome no envelope e depois devolvem-no durante o ofertório com o dinheiro lá dentro", conta Rosa Gomes. Está à porta de casa, com vários exemplares de "A Semente" entre as mãos calejadas. Foi por um destes boletins que viu dispensado o grupo coral da freguesia de que fazia parte. Deixou de pôr os pés na igreja. "Na missa do 15 de Agosto, em que as pessoas deviam entregar os envelopes para o centro de dia, alguns não foram. E não é que ele se pôs a dizer que estavam excomungadas?!"Ao longo dos nove anos de permanência do padre Adão Lima na freguesia, Rosa e o marido foram contribuindo como os outros. "As últimas verbas que lhe demos foram 500 euros. Foi para a residência paroquial. A gente até defendia que se fizesse a residência - que seria para ele enquanto cá estivesse, mas que depois ficava para a freguesia -, mas aquilo foi obra para 500 mil euros. Ele chegava à missa e punha-se a dizer: "Só os cortinados custaram 2800 contos. A mim ensinaram-me a comprar bom para comprar só uma vez." Ora, eu pus-me a pensar que na minha casa tenho cortinados fracos, mas tenho que me remediar. Ele até decorador levou!"
A esta residência o padre Adão soma outra residência paroquial em Deão e uma terceira, particular, noutra freguesia. Resultado: os três pisos de arquitectura moderna - cave, rés-do-chão e primeiro piso de paredes brancas, linhas rectas e enormes janelas a abrir para os montes - permanecem vazios. "Foi uma obra de 200 mil euros", conta ao telefone o empreiteiro que a construiu, José Nobre. Era amigo do padre, deixou de o ser. "Chamou-me para as obras de um restaurante, que abriu em Darque em sociedade com um cunhado - aquilo foi para cima de 124 mil euros - e, ao fim de dois anos, continuava sem pagar a última factura de 20 mil euros." O caso seguiu para tribunal, o empreiteiro ganhou, o restaurante Terra e Mar fechou, o padre recorreu para uma instância superior.
À porta de sua casa, bastante mais modesta do que a residência do padre que ajudou a pagar, Rosa Gomes continua a remoer o desgosto. "Chamam-no para ir confessar os doentes e ele recusa e diz que quem está na cama não faz pecados", lamenta, convencida de que se o bispo de Viana, Anacleto Oliveira, nada fizer, "daqui a meia dúzia de anos não há ninguém na igreja".
Ao PÚBLICO o porta-voz da secretaria episcopal, o padre Vasco, recusou comentários. "O bispo não toma posições nos jornais." O mesmo quanto ao padre Adão. "Pedimos desculpa, mas o padre não está", repete uma voz de mulher, quando se liga para o centro paroquial de Deão. "O padre Adão Lima não quer falar aos jornalistas, é isso? "É. Para já, não quer falar", concede, ao fim de vários telefonemas.
O padre Adão Lima é o sexto de uma família de nove irmãos. Em Vila de Punhe, a freguesia de Viana do Castelo de onde são naturais, não há quem não os conheça. O pai vendia tecidos pelas feiras, a mãe era doméstica e, nas horas que lhe sobravam, agricultora. Dos nove irmãos, quatro fizeram-se padres. Um deles, José da Silva Lima, foi durante sete anos presidente do Centro Regional de Braga da Universidade Católica. Sobre José - e sobre António, o primeiro dos quatro a fazer-se padre - correm também histórias pouco condizentes com o uso de batina. Deixemo-las correr. Vá-se lá saber onde acaba a fé e onde começa a inveja de quem confunde sacerdócio com voto de pobreza e castidade.
Se o caso de Alípio Lima, o pároco de Vila Nova de Anha, passou de boato a escândalo foi por iniciativa do próprio. Foi ele quem, depois de vários meses em que terá sido chantageado por duas prostitutas, se apresentou na GNR a formalizar queixa. Segundo os jornais, o relacionamento terá começado a partir de anúncios eróticos. E ter-se-á prolongado até que as prostitutas passaram a extorquir-lhe dinheiro sob ameaça de divulgarem imagens alusivas aos actos sexuais que terão mantido com o pároco. A extorsão arrastou-se por vários meses. Mas quanto dinheiro entregou o padre Alípio Lima às prostitutas é algo que fica por saber. Quando o PÚBLICO tentou consultar o processo no Ministério Público da Póvoa de Varzim, a procuradora decidiu protegê-lo da curiosidade alheia, colocando-o em segredo de justiça. Por seu turno, o pároco pediu desculpas ao bispo e à população e depois fechou-se em copas. Quanto ao bispo, é lícito presumir que o perdoou. "Houve uma queda, mas a comunidade paroquial manifestou-se no sentido de compreender as fraquezas do pároco e este sentiu-se com forças para regressar", resume o padre Vasco. Quanto ao resto, "é para ser resolvido dentro da Igreja". O que se sabe é que o padre Alípio esteve sem celebrar missa durante um mês e depois regressou à paróquia. E que os paroquianos, pelo menos alguns, aplaudiram a missa em que Alípio Lima verbalizou arrependimento. "Eu fui dos que bateram palmas", confessa Rosa da Conceição, enquanto espera na paragem pelo autocarro que a há-de levar ao hospital. "Caiu nesta ratoeira, coitado, mas não fez mal a ninguém. Um padre é um homem como os outros", desculpa. "Por mim, este padre não vai embora. Puxoumuito pela freguesia, ainda agora se tenho os netos no infantário, foi porque ele conseguiu."
Cirandando pela vila - dois mil habitantes, a passar - vêem-se os costumeiros cafés, o largo central, a igreja e, ao lado, a residência paroquial. Toca-se à campainha e nada. O telefone também teima em manter-se mudo. "O padre foi muito ao fundo. Naturalmente que não há-de querer falar", adianta Ana Maria, 59 anos vestidos de preto, coração de filigrana ao peito. Está parada no largo a desfiar a vida com uma vizinha. "A gente tropeça e cai. É preciso é não tornar a cair na mesma pedra", paraboliza, dizendo-se convencida de que o episódio das prostitutas foi "uma ratoeira".
No café quase em frente, três homens numa das mesas exteriores. "Ainda é por causa do padre?", fala o que tem o copo de vinho a meio. "Para mim, os padres deviam ser casados. São homens como os outros: bebem, comem, dormem, não hão-de poder fazer o resto porquê? Fazia o seu horariozinho dentro da igreja, cumpria, e depois ia para casa p"rà beira da mulher." Chama-se Manuel Cunha, 62 anos, aceita ter o nome no jornal depois de muita insistência. "Andar agora a crucificar o homem, olhe que como este não arranjamos outro. Agora vão-se lá embora e mudem de assunto, sim?"
"Tem um defeito muito grande", resume a paroquiana Rosa Gomes, "é doente por dinheiro." As acusações contra o pároco, que tem um processo em tribunal por falta de pagamento de uma dívida, vão desde a recusa da confissão a doentes à ameaça de excomunhão dos que recusam financiar obras da Igreja. "Chegou a dizer, durante a homilia, que quem não quisesse dar o dinheiro podia pegar nele, comprar veneno e envenenar-se", acrescenta o presidente da Junta de Subportela, Ilídio Rego, incompatibilizado com o padre: "Já chega de ameaçar, enxovalhar e humilhar os paroquianos."
O nome de Adão da Silva Lima galgou as fronteiras do concelho depois de ter conseguido que Daniel Gonçalves Dias, 89 anos, assinasse um contrato em que o idoso emprestava 50 mil euros para a construção de uma creche e de um lar na freguesia de Deão. O documento fez desconfiar os herdeiros. Intitulado "Contrato de Financiamento Particular de Mútuo sem Garantias Hipotecárias e Sem Juros", estabelece que o empréstimo é por cinco anos e que não incidem sobre ele juros legais nem moratórias. E estabelece que, se o idoso falecer, o empréstimo passa a doação: "É sua vontade que nenhum dos possíveis herdeiros não poderão [sic] por qualquer forma exigir para si esta quantia que hoje empresta e que futuramente será transposta como doação ao Centro Social Paroquial de Deão." Em troca, o idoso recebeu um "diploma de benemérito", onde, num português já menos trôpego, o padre surge na qualidade de presidente do Centro Social Paroquial de Deão e do conselho da fábrica para os assuntos económicos a agradecer, "muito penhorado", o contributo. "Que Deus multiplique por muito o que fizestes e continuareis a fazer em prol dos mais carenciados das nossas sociedades hodiernas."
Para o jurista que está a analisar o caso, o contrato "pode ser considerado nulo em tribunal". "A lei proíbe que uma pessoa ponha o seu advogado no testamento ou faça uma doação ao seu médico. Parece-me claro que o padre se faz valer do seu ascendente psicológico sobre os paroquianos para ficar com os seus bens. É como se lhes estivesse a vender conforto espiritual." Um dos 62 sobrinhos do "benemérito" concorda. "O padre aproveitou-se da fragilidade do meu tio e convenceu-o de que, se desse o dinheiro, teria lugar no lar de idosos e muito provavelmente no Céu." Nenhum aceita ter o nome no jornal.
Na freguesia de Subportela - margem esquerda do rio Lima, pouco mais de mil habitantes - correm histórias sobre empréstimos semelhantes. Mas o que traz os habitantes de mal com o padre parecem ser os constantes pedidos de dinheiro. "Há aqui pessoas com muita idade que levaram vidas sofridas. Trabalharam a vida toda debaixo de chuva, se vão à missa é para ouvir uma palavra de conforto. Não é para serem insultadas pelo padre, quando não lhe dão o dinheiro que ele quer", indigna-se Tiago Afonso, um dos poucos que aceitam dar o nome. Com 45 anos, sustento assegurado pelo seu trabalho de instalação de iluminações e amplificações sonoras das festas e romarias de arredores, este habitante da freguesia de Subportela diz-se farto das homilias do padre Adão. "Ele chegou a dizer na missa que ainda bem que o sigilo bancário ia acabar, porque assim ia poder saber quem é que tinha dinheiro na conta e não dava para a Igreja."
Na Páscoa, no Natal e sempre que alguma obra o requer, o método não varia. "No início distribuía os envelopes pelas caixas de correio. Depois passou a fazer uma pagela dobrada chamada "A Semente" e a colocar lá dentro um envelope. As pessoas vão à missa, levam a pagela para casa, escrevem o nome no envelope e depois devolvem-no durante o ofertório com o dinheiro lá dentro", conta Rosa Gomes. Está à porta de casa, com vários exemplares de "A Semente" entre as mãos calejadas. Foi por um destes boletins que viu dispensado o grupo coral da freguesia de que fazia parte. Deixou de pôr os pés na igreja. "Na missa do 15 de Agosto, em que as pessoas deviam entregar os envelopes para o centro de dia, alguns não foram. E não é que ele se pôs a dizer que estavam excomungadas?!"Ao longo dos nove anos de permanência do padre Adão Lima na freguesia, Rosa e o marido foram contribuindo como os outros. "As últimas verbas que lhe demos foram 500 euros. Foi para a residência paroquial. A gente até defendia que se fizesse a residência - que seria para ele enquanto cá estivesse, mas que depois ficava para a freguesia -, mas aquilo foi obra para 500 mil euros. Ele chegava à missa e punha-se a dizer: "Só os cortinados custaram 2800 contos. A mim ensinaram-me a comprar bom para comprar só uma vez." Ora, eu pus-me a pensar que na minha casa tenho cortinados fracos, mas tenho que me remediar. Ele até decorador levou!"
A esta residência o padre Adão soma outra residência paroquial em Deão e uma terceira, particular, noutra freguesia. Resultado: os três pisos de arquitectura moderna - cave, rés-do-chão e primeiro piso de paredes brancas, linhas rectas e enormes janelas a abrir para os montes - permanecem vazios. "Foi uma obra de 200 mil euros", conta ao telefone o empreiteiro que a construiu, José Nobre. Era amigo do padre, deixou de o ser. "Chamou-me para as obras de um restaurante, que abriu em Darque em sociedade com um cunhado - aquilo foi para cima de 124 mil euros - e, ao fim de dois anos, continuava sem pagar a última factura de 20 mil euros." O caso seguiu para tribunal, o empreiteiro ganhou, o restaurante Terra e Mar fechou, o padre recorreu para uma instância superior.
À porta de sua casa, bastante mais modesta do que a residência do padre que ajudou a pagar, Rosa Gomes continua a remoer o desgosto. "Chamam-no para ir confessar os doentes e ele recusa e diz que quem está na cama não faz pecados", lamenta, convencida de que se o bispo de Viana, Anacleto Oliveira, nada fizer, "daqui a meia dúzia de anos não há ninguém na igreja".
Ao PÚBLICO o porta-voz da secretaria episcopal, o padre Vasco, recusou comentários. "O bispo não toma posições nos jornais." O mesmo quanto ao padre Adão. "Pedimos desculpa, mas o padre não está", repete uma voz de mulher, quando se liga para o centro paroquial de Deão. "O padre Adão Lima não quer falar aos jornalistas, é isso? "É. Para já, não quer falar", concede, ao fim de vários telefonemas.
O padre Adão Lima é o sexto de uma família de nove irmãos. Em Vila de Punhe, a freguesia de Viana do Castelo de onde são naturais, não há quem não os conheça. O pai vendia tecidos pelas feiras, a mãe era doméstica e, nas horas que lhe sobravam, agricultora. Dos nove irmãos, quatro fizeram-se padres. Um deles, José da Silva Lima, foi durante sete anos presidente do Centro Regional de Braga da Universidade Católica. Sobre José - e sobre António, o primeiro dos quatro a fazer-se padre - correm também histórias pouco condizentes com o uso de batina. Deixemo-las correr. Vá-se lá saber onde acaba a fé e onde começa a inveja de quem confunde sacerdócio com voto de pobreza e castidade.
Se o caso de Alípio Lima, o pároco de Vila Nova de Anha, passou de boato a escândalo foi por iniciativa do próprio. Foi ele quem, depois de vários meses em que terá sido chantageado por duas prostitutas, se apresentou na GNR a formalizar queixa. Segundo os jornais, o relacionamento terá começado a partir de anúncios eróticos. E ter-se-á prolongado até que as prostitutas passaram a extorquir-lhe dinheiro sob ameaça de divulgarem imagens alusivas aos actos sexuais que terão mantido com o pároco. A extorsão arrastou-se por vários meses. Mas quanto dinheiro entregou o padre Alípio Lima às prostitutas é algo que fica por saber. Quando o PÚBLICO tentou consultar o processo no Ministério Público da Póvoa de Varzim, a procuradora decidiu protegê-lo da curiosidade alheia, colocando-o em segredo de justiça. Por seu turno, o pároco pediu desculpas ao bispo e à população e depois fechou-se em copas. Quanto ao bispo, é lícito presumir que o perdoou. "Houve uma queda, mas a comunidade paroquial manifestou-se no sentido de compreender as fraquezas do pároco e este sentiu-se com forças para regressar", resume o padre Vasco. Quanto ao resto, "é para ser resolvido dentro da Igreja". O que se sabe é que o padre Alípio esteve sem celebrar missa durante um mês e depois regressou à paróquia. E que os paroquianos, pelo menos alguns, aplaudiram a missa em que Alípio Lima verbalizou arrependimento. "Eu fui dos que bateram palmas", confessa Rosa da Conceição, enquanto espera na paragem pelo autocarro que a há-de levar ao hospital. "Caiu nesta ratoeira, coitado, mas não fez mal a ninguém. Um padre é um homem como os outros", desculpa. "Por mim, este padre não vai embora. Puxoumuito pela freguesia, ainda agora se tenho os netos no infantário, foi porque ele conseguiu."
Cirandando pela vila - dois mil habitantes, a passar - vêem-se os costumeiros cafés, o largo central, a igreja e, ao lado, a residência paroquial. Toca-se à campainha e nada. O telefone também teima em manter-se mudo. "O padre foi muito ao fundo. Naturalmente que não há-de querer falar", adianta Ana Maria, 59 anos vestidos de preto, coração de filigrana ao peito. Está parada no largo a desfiar a vida com uma vizinha. "A gente tropeça e cai. É preciso é não tornar a cair na mesma pedra", paraboliza, dizendo-se convencida de que o episódio das prostitutas foi "uma ratoeira".
No café quase em frente, três homens numa das mesas exteriores. "Ainda é por causa do padre?", fala o que tem o copo de vinho a meio. "Para mim, os padres deviam ser casados. São homens como os outros: bebem, comem, dormem, não hão-de poder fazer o resto porquê? Fazia o seu horariozinho dentro da igreja, cumpria, e depois ia para casa p"rà beira da mulher." Chama-se Manuel Cunha, 62 anos, aceita ter o nome no jornal depois de muita insistência. "Andar agora a crucificar o homem, olhe que como este não arranjamos outro. Agora vão-se lá embora e mudem de assunto, sim?"
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