Uma balança, produtos biológicos, zero plástico e zero desperdício. O «barlavento» esteve à conversa com as empreendedoras mais recentes para descobrir esta alternativa ao grande consumo.
Já existem em Aljezur, Almancil, Faro, Lagos, Portimão, e, mais recentemente em São Brás de Alportel, onde a empresária Ana Beatriz, 26 anos, garante que se trata de «um estilo de vida». Licenciada em Gestão de Empresas, pela Universidade do Algarve, e mestre em Marketing, abriu a sua mercearia a granel Bialógica, no centro de São Brás, em dezembro último.
A ideia surgiu durante um jantar em que afirmou à família que o que faltava na vila, cujo centro histórico até está bem preservado, era uma mercearia «à antiga». 
Como já tinha uma horta em casa e sempre utilizou produtos amigos do ambiente, com zero plástico, não foi difícil fazer um inventário de fornecedores e lançar os contactos.
A abertura foi «natural e aconteceu logo passados três meses», refere. A comunidade estrangeira estabelecida naquele concelho do Barrocal constitui a maioria da clientela. «Tenho alguns portugueses, mas quer os residentes quer os turistas são a grande parte do meu público.
Têm surgido muitos dinamarqueses, franceses e alemães», talvez fruto da crescente atratividade daquela parte do Algarve. Para o futuro, a jovem empreendedora pretende «trazer mais pessoas para este modo de comprar» e até influenciar os hipermercados. «Acho que somos nós, os pequenos comerciantes, que podemos fazer com que os grandes nos copiem, que pensem mais na questão dos plásticos e menos na parte consumista», até porque, «a comunidade tem aderido muito bem» ao conceito.


Ana Beatriz na Bialógica – Mercearia a granel, em São Brás de Alportel
As escovas de dentes de bambu e as lufas, uma espécie de pepinos que secam e transformam-se em esponjas, e que podem ser utilizadas na cozinha ou no banho, são os produtos que vendem melhor na mercearia. Ana Beatriz explica ao «barlavento» que divide o espaço em quatro zonas distintas: alimentar, higiene, limpeza e o cantinho para os mais pequenos.
Mercearia fresca, fruta desidratada, cereais integrais, frutos secos, sementes, especiarias, manteigas e microvegetais germinados encontram-se na parte alimentar. São todos produtos biológicos.
Palhinhas de bambu, vassouras de madeira, guardanapos de pano, sacos do lixo feitos a partir da cana de açúcar e escovas compõem a zona da limpeza. O que nesta área chama mais a atenção das pessoas são as nozes saponárias, uma alternativa biológica aos detergentes, tanto de roupa, como de corpo. Além disso, há ainda a possibilidade de se comprar detergente a granel. Como Ana Beatriz explica, os detergentes são feitos a partir de óleo alimentar usado, são produzidos na Universidade de Coimbra e há de todos os tipos: vidros, loiça, chão e roupa. São um bom exemplo de economia circular, conceito aliás defendido por este tipo de estabelecimentos.

Outro dos produtos com mais saída são os sabonetes artesanais. «Há de todos os cheiros e são feitos por uma senhora de Olhão que tem parceria connosco», conta. As pastas de dentes biológicas, champô sólido, desodorizantes de mineral, fio dental em carvão, giletes de bambu e perfumes ecológicos formam o resto da secção de higiene.
Em relação à importância de dedicar uma zona aos mais pequenos, a responsável da mercearia sorri e explica: «todos os brinquedos que temos são feitos em madeira e são construídos por um artesão aqui de São Brás de Alportel. Eu faço os desenhos, digo o que quero e ele executa».
Quanto aos produtores de frescos, a jovem empreendedora diz tentar sempre apostar nos algarvios. Quando isso não é possível, procura alternativas nas proximidades. Um exemplo são as pegas de cozinha, feitas em Aljustrel. Quase nada do que tem no sortido vem do estrangeiro. «O importante é passar uma mensagem e consciencializar as pessoas de que há sempre outra forma de consumir», conclui.

Loja de Almancil é a mais recente

Liliana Ribeiro, de 52 anos, trabalhou três décadas numa clínica. O marido sempre vendeu frutos secos e incentivou a esposa a abrir o seu próprio negócio. Um mês depois da ideia surgir, a mercearia «L´Granel» inaugura em Almancil, a 13 de abril, na Rua da Loja do Município.
«A inauguração correu muito bem. Tive muitos clientes e aquilo que mais vendi foram os frutos secos caramelizados», relembra. Entre o sortido, os artigos mais procurados são tapiocas, sementes, azeites biológicos, especiarias, bolachas, chocolates e fruta desidratada. Ao contrário das lojas de Faro e São Brás de Alportel, Almancil ainda não consegue ter fornecedores regionais e até os nacionais «são difíceis».


Liliana Ribeiro
Apesar da juventude da loja, Liliana Ribeiro antevê que os turistas vão gostar do conceito. «Estamos perto da Quinta do Lago e de Vale de Lobo, portanto são públicos que eu gostava muito de ter» para lhes servir o melhor que se faz no Algarve. A «L’Granel» é um projeto familiar e a empreendedora refere que não contactou, nem visitou nenhuma das outras lojas no Algarve. «O meu marido deu-me dicas, e eu sempre tive cuidados com a proteção ambiental».
Quanto ao futuro, ainda é cedo para fazer projeções, o importante «é primeiro ter o feedback das pessoas e perceber o que procuram, até porque já me vão pedindo outras coisas», como «chás e licores de Monchique».

Mercearia de Faro é mentora e atração da rota EN2

Chama-se «Retratos D’Aldeia» e é a mercearia a granel de Faro. Situa-se em frente à conhecida pastelaria «Trigo Dourado», não muito longe do Estádio de São Luís. Abriu portas no dia 1 de julho de 2017, pelas mãos de Sara Teixeira, de 29 anos.
A bióloga de formação conta ao «barlavento» que desde pequena sempre esteve em contacto com a natureza. Aos 12 anos sofria de excesso de peso e começou a adotar uma alimentação saudável. Enquanto estudante na Universidade do Algarve, surgiu o gosto pela educação ambiental e pela temática de redução de recursos e desperdício alimentar. Foi então que em 2016, ao sentir necessidade de criar o seu próprio projeto, começou a planear a abertura da mercearia.
Chás, frutos secos, granolas e especiarias são os produtos com mais sucesso. São todos biológicos e vendidos a granel. Os rebuçados de mel são a escolha predileta dos mais novos. A última aposta de Sara foi nas cervejas artesanais, provenientes de Mértola.

Para a jovem, o importante é escolher produtores regionais, ou, pelo menos, nacionais. Um dado curioso é que o público-alvo desta loja são as famílias e, curiosamente, uma faixa etária mais avançada. Porém, os turistas já começam a entrar pela porta, apesar da localização afastada do centro histórico da cidade. Porquê? Porque a «Retratos D´Aldeia» faz parte da rota da Estrada Nacional (EN)2, que une Faro a Chaves e consta no roteiro oficial como ponto de passagem obrigatória.
Sara Teixeira conta ainda que recebeu uma mensagem de uma jovem, Ana Beatriz, que lhe disse que planeava abrir um espaço semelhante ao seu, mas em São Brás de Alportel. Depois de conhecer a loja e, consequentemente, a Sara, ambas permaneceram em contacto. «Eu alertei-a sobretudo para as dificuldades de abrir um negócio, uma nova loja. São muitas horas de trabalho e é muito exigente. Aconselhei-a a vender apenas itens sobre os quais tivesse conhecimento. Dei-lhe ideias de produtos e falei-lhe, na minha perspetiva, do que corre melhor e pior», recorda.
Ainda segundo Sara Teixeira, as lojas a granel funcionam como uma «comunidade em torno de um novo estilo de vida e estamos sempre em contacto». Contudo, em 2017, quando Sara se preparava para abrir a loja, «ainda não havia tanta informação. Eu recorri à experiência de uma congénere do Porto, que hoje já nem existe». Apesar do negócio em Faro estar a correr bem para Sara, a jovem lamenta ainda não «ter o retorno monetário que gostaria». De qualquer maneira, «tenho cada vez mais oferta e mais clientes e isso é muito recompensador», conclui.