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sábado, 18 de maio de 2019

Vêm Aí As Eleições Para O Parlamento Da UE





Uma “outra Europa” é possível? Qual é a “outra” Europa?...

As várias forças políticas do país preparam-se para as próximas eleições de 26 de maio. O PCP prepara-se para intervir na batalha. Não se põe em dúvida que os deputados europeus do Partido têm tido uma intervenção permanente e de qualidade no quadro da linha política do PCP; são, evidentemente, parlamentares abnegados e têm a intenção de defender os interesses dos trabalhadores e do povo português (o “interesse nacional” merece outra discussão). 

Dito isto, é necessário ser mais objetivo e claro no que toca à teoria sobre a União Europeia (UE), de forma a que não se engane os trabalhadores e o povo.

Fazer uma análise correta da natureza da União Europeia é indispensável para a correta direção da luta emancipadora dos trabalhadores cujos países fazem parte desta organização. De se considerar a UE como um polo imperialista decorre que a luta anti-imperialista se faça também contra ela. E que se devem interpretar muitos dos factos políticos, económicos e militares que surgem na Europa e no mundo à luz da concorrência existente entre os polos imperialistas mundiais, designadamente a UE e os EUA. Os EUA não são a única potência imperialista, como parece inferir-se do discurso do nosso Partido. Decorre ainda que, à luz do internacionalismo proletário, a solidariedade dos operários de cada país europeu vá para os seus irmãos de classe dos outros países (ricos, pobres e de migrantes), pela exigência da saída desses países de tal instituição política imperial reacionária, no quadro geral da luta contra a exploração capitalista dos trabalhadores e dos povos. A ideia peregrina de se afirmar que o PS só não seria governo se não quisesse, mas que a saída da UE só se poderá concretizar quando o povo quiser, deixa a clara a cobardia da atual direção do nosso Partido.

A Europa é um continente que vai do Atlântico aos Urais e, a menos que o planeta se desmorone, vai continuar a ser. Os países europeus são 50 e 28 pertencem à União Europeia. Não se descortina que outra Europa possa haver. Falar em “Europa” em vez de “União Europeia” é uma mistificação comum nos políticos e comentadores burgueses – a que alguns que se afirmam revolucionários vão aderindo – no sentido de dar dimensão continental a esta organização/polo imperialista que, à partida, se opõe ao polo imperialista da Rússia, cuja parte europeia (território e população) é maior do que a dos maiores países da UE. Longe vai o tempo da Laurásia e da Gonduana e ainda mais longe vai o tempo do continente único, a Pangeia.

Diz Lenine em Sobre a palavra de ordem dos Estados Unidos da Europa: «A desigualdade do desenvolvimento económico e político é uma lei absoluta do capitalismo».[1] Isto é, para a acumulação de riqueza num lado, tem de haver pobreza no outro, a exploração e subjugação dos mais fracos pelos mais fortes. Portugal faz parte da primeira categoria. Não poderia existir uma integração capitalista da Europa sem esta relação de dependência e desigualdade. Daqui decorre que os povos não serão livres nem soberanos enquanto existir capitalismo e UE.

É por esta razão que, contrariamente ao que afirma o nosso Partido, não é possível, em capitalismo, compatibilizar «uma alternativa progressista e democrática» e «a afirmação «corajosa da soberania e independência nacionais».

A UE assenta a sua base material na união de Estados capitalistas, para tirar o máximo partido do seu desenvolvimento capitalista e poder concorrer em melhores condições com os outros polos imperialistas no mundo, reforçar a exploração da classe operária, conquistar novos mercados e fontes de matérias-primas. Como Lenine afirmou já em 1916 na sua obra O Imperialismo fase superior do capitalismo, o capital encontra-se na sua fase imperialista. E não pode voltar atrás porque a “roda da história” não inverte a direção do seu movimento. Teorias que assentem no desejo irrealizável de regressar ao estádio pré-imperialista, de livre concorrência de capitais individuais são reacionárias e irrealistas, não podem ser apontadas aos povos como caminho de futuro. O futuro do imperialismo não é um capitalismo menos desenvolvido. O futuro é o socialismo.

Portugal e a União Europeia

O povo português sabe muito bem o que é a UE, pela amarga experiência da adesão de Portugal à então CEE, de há 33 anos para cá.

Os objetivos de Mário Soares, então Primeiro-Ministro, eram claros:
  1. Amarrar politicamente o país à política contrarrevolucionária nacional e ao capitalismo monopolista internacional, destruir as conquistas do 25 de abril, tentar limitar o papel do PCP e coartar qualquer “veleidade” de avançar para o socialismo em Portugal;
  2. Reconstituir o capitalismo monopolista em Portugal, privatizando todos os meios de produção nacionalizados com o 25 de abril.
Como sempre, o povo foi enganado com a mentira de que os portugueses iriam passar a viver tão bem como os povos mais ricos da Europa. E ainda hoje subsiste o perigoso mito de que a integração europeia permitiu certos desenvolvimentos do país, desconhecendo-se que, para receber um chouriço, Portugal teve de entregar um porco. Isto é, o saldo da integração é negativo para o país.

Neste processo e na sequência da crise capitalista de sobreprodução e de sobreacumulação de capital e da vinda da troika, estrangeira (não esquecer que troika nativa sempre esteve bem ativa durante o governo de Passos Coelho embora o Partido tente varrer para debaixo do tapete a colaboração do PS com esse governo que só fez o que fez porque o PS deixou), vale a pena apreciar a posição do PCP – bastante fluida, digamos assim –, sobre a dívida.

Em determinado momento, defendeu-se que existia uma diferença entre a dívida legítima e a dívida ilegítima, admitindo-se, e muito bem, ser esta última passível de não ser paga. Defendeu-se depois a renegociação da dívida nos seus juros, prazos e montantes. Noutro momento, defendeu-se a saída do euro. Agora, exige-se a libertação do país do Tratado Orçamental.

Até agora, nesta “fase da vida política nacional” ainda não se pôs em causa a legitimidade de toda a dívida e ela é totalmente ilegítima, porque é um ajuste de contas do capital financeiro, entre bancos – o povo em nada beneficiou dos capitais delapidados e é o povo que está e vai continuar a pagá-la. O mecanismo da “dívida” é uma ferramenta de domínio, o instrumento de transferência de valor entre países dominados e países dominantes em favor dos últimos, que aprofunda a desigualdade entre eles, levando à concentração de capital onde ele já está mais concentrado. A “dívida” levou à extinção da soberania nacional sobre o capital de todos os bancos (à exceção da CGD). Só de juros, os trabalhadores e o povo estão a pagar com cortes na sua educação, na sua saúde, na sua segurança social, oito mil milhões de euros. E quanto à CGD, também pagam os roubos de Berardos e outros que tais, com a conivência e cumplicidade dos gestores do capital.

Num artigo de G. Marinos, do KKE, publicada no Avante! n.º 1937, de 2011/01/12,  afirma-se: « […] as medidas antilaborais da UE e do FMI não são impostas aos governos burgueses contra a sua vontade e interesses. Pelo contrário, estas medidas têm pleno apoio da plutocracia doméstica porque asseguram a manutenção dos seus lucros tanto no período de crise como no período de recuperação».

Obviamente, o PS e o seu governo submetem-se, tal como se submete qualquer partido governante ou qualquer país economicamente dependente. Decorre da situação histórica e económica.

«Portugal precisa de uma efectiva subordinação do poder económico ao poder político, eliminando a razão de fundo da corrupção e de outros crimes de natureza económica», afirma o camarada Jerónimo de Sousa na sua intervenção de apresentação da candidatura da CDU às eleições para o PE. Mas quem é que espera que no nosso país, uma democracia burguesa capitalista, o poder económico se subordine ao político? Acontece que, fora de situações de charneira, o poder político é sempre a emanação do poder económico e que o capitalismo, como formação exploradora, vive da corrupção e de crimes de toda a natureza. A burguesia portuguesa não consegue subsistir senão como apêndice e cúmplice desse sistema. Como defensor do capitalismo, o PS só pode ter essa posição, é escusado apelar a que faça outra coisa. Isso é iludir o povo quanto ao papel da social-democracia e simultaneamente, trair o ideal comunista e os trabalhadores.

Parlamento Europeu

Neste contexto, é necessário fazer a denúncia do Parlamento Europeu como uma das estruturas políticas da construção imperialista a que se dá atualmente o nome de União Europeia. É uma instituição artificial para enganar os povos. É o único órgão eleito diretamente, mas os seus poderes são fictícios, uma vez que as grandes decisões são tomadas pelo Conselho Europeu (nas matérias decisivas o PE é simplesmente consultado e o Conselho não fica vinculado a esse parecer), a Comissão Europeia e, mais recentemente, pelo Euro-grupo. No PE dominam os partidos de direita e social-democratas. No grupo parlamentar em que o PCP se encontra, GUE/NGL, estão outros partidos que se reclamam de esquerda, mas a sua maioria é efetivamente socialdemocrata e serve para enganar os trabalhadores. Veja-se a proposta da presidência do GUE/NGL para o próximo nobel da Paz: Alex Tsipras. Que disse o nosso Partido sobre isto? Muitos dos partidos que constituem o GUE/NGL integram igualmente o chamado Partido da Esquerda Europeia, supranacional e anticomunista, do qual vários partidos operários já se demitiram, tais são os favores que faz ao capital.

O PE é uma instância burocrática que consome, no seu funcionamento e no pagamento aos seus agora 705 deputados, milhões de euros que os trabalhadores produzem com o suor do seu rosto. É uma câmara de ressonância para ratificar decisões de quem manda verdadeiramente ou para se entreter à volta de questões secundárias, justificando assim os milhões de euros que consome para sustento de milhares de funcionários e de políticos ao serviço do capital.

Nestas circunstâncias, é importante participar nesta batalha eleitoral? Sem dúvida, se servir para denunciar a natureza imperialista e exploradora da UE, o papel do PE, o significado que estas eleições (não) têm e a exigência da saída de Portugal da UE.

Objetivos

A campanha eleitoral que vai decorrer nos próximos tempos deveria ser utilizada para:

  1. Desmascarar o PE como instituição parasita e burocrática incapaz de defender os interesses dos trabalhadores e dos povos;
  2. Desmascarar a UE como uma organização imperialista no mundo e dentro de si própria e, como tal, serve a exploração dos trabalhadores e dos povos e a causa do militarismo e da guerra;
  3. Desmascarar a evolução previsível da UE, que se fará no sentido da agudização das contradições capitalistas, da centralização do poder político e económico acima dos Estados constituintes, da concentração do poder económico e político dos monopólios, do empobrecimento dos povos, do aumento da exploração dos trabalhadores, da destruição dos direitos conquistados, do aumento da rapina dos povos colonizados dentro e fora do continente, das possibilidades de deflagração de mais guerras imperialistas e interimperialistas – em suma, que a UE será cada vez mais reacionária e perigosa;
  4. Desmascarar o PS como o partido dos monopólios e do capital em geral e, como tal, insuscetível de ser um aliado dos trabalhadores;
  5. Afirmar que não há hipótese de reformas progressistas dentro da UE;
  6. Afirmar que os trabalhadores deveriam lutar contra a UE, pela saída de Portugal da UE – não apenas do euro, do Tratado orçamental e outros elementos de domínio, à peça, os chamados “constrangimentos” – no quadro da luta pelo socialismo e do internacionalismo, juntamente com os trabalhadores das outras nações da UE, do continente e do mundo;
  7. Defender que o povo português não deve pagar uma dívida que não é sua e submete o povo português por largas gerações;
  8. Esclarecer que a candidatura da CDU se apresenta para denunciar tudo isto perante o povo e os trabalhadores e não é uma ferramenta de mitigação do capitalismo (mas antes uma ferramenta de defesa dos trabalhadores)
  9. Explicar a razão pela qual os deputados do PCP no PE não podem continuar a fazer parte do GUE/NGL e desmascarar o PEE.

Por antecipação às críticas há que esclarecer duas questões.

A primeira: tendo o PS a natureza que atrás lhe atribuímos, isso não significa que as massas de proletários e outras camadas laboriosas que nele votam e o acompanham deixem de ter objetivamente interesse em acabar com a exploração capitalista e, portanto, têm de estar implicadas nas lutas de massas. Daqui decorre que é tarefa do partido do proletariado atrair para si estas massas enganadas na sua opção política e eleitoral. Decorre ainda que o êxito do trabalho do partido do proletariado será tanto maior quanto menores forem os desvios parlamentaristas de intervenção e quanto mais o parlamentarismo burguês for desmascarado (atenção: não se está a renegar a importância do trabalho parlamentar, mas a criticar o afunilamento parlamentar da ação política).

A segunda: a saída de qualquer país da UE, fora do quadro da luta anticapitalista pelo poder popular, pelo socialismo, sem o povo disposto a arrancar o poder à burguesia, não resolverá nenhum problema dos trabalhadores e dos povos hoje amarrados às grilhetas da UE. A eliminação da dependência dos povos da UE, que o mesmo é dizer do capitalismo monopolista, do imperialismo, é um problema solúvel apenas com o seu derrubamento revolucionário. É para isso que as massas têm de ser ganhas, não para qualquer democracia avançada ou atrasada, para qualquer alternativa patriótica e de esquerda, seja lá o que isso for, no plano nacional, não para a tal “outra” Europa dos “direitos sociais”, de “progresso económico e social”, de “paz e cooperação”, etc., etc., no plano da UE, consignas que só servem para enganar os trabalhadores.

O rumo apontado pelo CC do PCP na sua reunião de 10 de dezembro de 2018 «... abrir caminho a uma alternativa patriótica e de esquerda que enfrente, sem hesitações, a submissão ao Euro e às imposições e condicionalismos da União Europeia, e recupere para Portugal os instrumentos necessários ao seu desenvolvimento soberano, num quadro de uma Europa de paz, cooperação e progresso» equivale a defender uma UE que não seja UE, isto é, uma impossibilidade.

Lutar contra a UE, para acabar com ela - apesar de todo o mar de dificuldades - sabe-se o que é, lutar para que a UE não seja UE é uma mistificação e, acima de tudo, um engano deliberado.




[1] https://www.marxists.org/portugues/lenin/1915/08/23.html 


 www.quefazer.info

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