(Carlos Esperança, 27/10/2018)
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A cerca de dez dias da segunda volta das eleições brasileiras, o arcebispo do Rio de Janeiro, Orani Tempesta, cardeal criado por Bento XVI, recebeu o candidato Jair Messias Bolsonaro.


O cardeal havia de saber que Bolsonaro não era o Messias que surgira para o iluminar, mas o Bolsonaro que o procurava para aliado. Contrariamente à IURD e a outras Igrejas evangélicas, que já eram cúmplices, o prelado católico teve a oportunidade de manter a decência. Bastava-lhe anunciar a recusa de receber qualquer dos dois candidatos que disputam a segunda volta, a fim de preservar a neutralidade da Igreja católica de que é um membro proeminente.


Recebeu-o. Foi sua a decisão. Dificilmente convencerá alguém de que o Espírito Santo exista ou, no mínimo, lhe tenha iluminado o entendimento.

Sabe-se mais da alegria que percorreu os corredores do episcopado, durante o encontro, do que da conversa entre o cardeal Tempesta e o capitão Bolsonaro, mas não há dúvida de que, em vários pontos, são gémeas as almas, e não se lhe conhecem divergências.

Da visita resultou um “compromisso formal”, assinado por ambos, contra “o aborto, a educação sexual e a legalização das drogas e em defesa da família e da liberdade religiosa”.
Quem, após o histórico compromisso, na sequência da fotografia que os perpetuará para a História, fez a síntese do documento assinado, quiçá benzido, foi Bolsonaro:

“É o compromisso que está no coração de todo o brasileiro de bem.”
A partir de amanhã, Jair Bolsonaro, Edir Macedo e Orani Tempesta ficam ungidos, pelo voto, como «brasileiros de bem».
Deus, na sua inexistência, há muito que mostrou falta de jeito para milagres e o silêncio perante a pulhice do clero, mas o cardeal do Rio de Janeiro assumiu a cumplicidade com um facínora misógino, xenófobo e demente, alheio ao respeito pelos direitos humanos e a um módico de humanidade. O pio cardeal Orani Tempesta é um solípede litúrgico a escoicear a dignidade humana.