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sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Os deputados perderam a paciência numa "frustrante" audição a Zeinal Bava



Os deputados perderam a paciência numa "frustrante" audição a Zeinal Bava

“Eu não guardo memória”, foi a forma como o ex-gestor da PT respondeu a quase todas as perguntas difíceis. Aquele que já foi considerado o “melhor CEO” veio ao Parlamento com o orgulho beliscado, mas não se desviou um milímetro do guião evasivo que trazia.
Zeinal Bava não se recorda de quem aprovou na PT a compra de 500 milhões de euros da Espírito Santo Internacional (ESI). “Não vou dizer que foi fulano, sicrano ou beltrano, porque não me recordo”, disse nesta quinta-feira, em resposta a Mariana Mortágua, do BE. Já não era a primeira vez. O deputado comunista Bruno Dias ouvira uns quantos “não guardo na memória” minutos antes. Mortágua deixou escapar o primeiro sinal de impaciência: “Era um bocado amadorismo para quem ganhou tantos prémios de CEO do ano, não?” Outras se seguiriam.Bava vinha preparado para a acutilância das perguntas. Os deputados vinham preparados para a mais dura audição, até agora, nesta Comissão de Inquérito à gestão do BES e do GES. 
Pedro Nuno Santos, do PS, perguntou: “O BES tinha uma influência significativa na vida da PT?”. O ex-gestor divagou, sem responder. O deputado repetiu a pergunta. Uma, duas, três vezes. E recordou, no fim: “Estamos numa comissão de inquérito”. 
Cecília Meireles, do CDS, passou pelo mesmo. Fez a pergunta, não teve a resposta. Repetiu. E desabafou: “Sou eu que sou de compreensão lenta. Sou eu que sou pouco inteligente.” Os deputados suspiravam, exibiam sorrisos amarelos e iam endurecendo o tom. Duarte Marques, PSD: “Percebo a sua afirmação, e é das poucas que faz sentido.”
A audição começou, ainda assim, num tom mais pacato, com Bava a assegurar: “Não acredito que pudéssemos ter feito alguma coisa que contrariasse os interesses da PT.” Mas seguiram-se as provas que desafiavam essa afirmação. Os investimentos, quase exclusivos, da PT no GES, que chegaram a totalizar 91% da tesouraria da empresa. A compra de dívida da ESI e da Rioforte, mil milhões de euros só nesta última. Os encontros com Ricardo Salgado. O papel do BES na condução da PT. E o fim da sua carreira na empresa, após o fim da fusão com a brasileira Oi.
Para tudo isto, Bava trazia uma resposta padronizada, que repetiu, exaustivamente. As suas conversas com Ricardo salgado eram, sempre, “genéricas”.  E, depois, “ninguém pensava que o BES podia falir. Do ponto de vista da PT, a responsabilidade final era do banco”. “A partir do momento em que fui nomeado presidente da Oi, eu não sabia nem devia saber das aplicações da PT, pois existia conflito de interesses.”
O gestor, que se manteve quase sempre sorridente, assegurou que até à sua saída da liderança da PT SGPS tudo estava bem. Ou quase. “Não me recordo de um único reparo até ao dia 4 de Junho de 2013”, a data da sua mudança para a Oi.  A partir de então, “dedicava 85% do tempo à Oi, sempre no Brasil, focado.” Tanto que passou a integrar expressões de português do Brasil nas suas respostas: “de jeito nenhum” ou “esse caixa”.
O problema é que, já antes disso, a PT entregara, entre depósitos e investimentos, 12 mil milhões ao grupo liderado por Ricardo Salgado, ou seja, 79,9% da tesouraria da PT. Esse valor subiu para 15 mil milhões no ano seguinte. Como recordou Mariana Mortágua, “a PT endividou-se a 4,6% para comprar dívida da ESI que pagava 4,05%”. Bava não negou, mas elogiou “a taxa que se conseguiu” pela dívida da ESI. De uma forma ainda mais contra-intuitiva: “A PT não aumentou a sua dívida, aumentou a sua flexibilidade financeira.”
Em todo o caso, mesmo quando os deputados apontavam a necessidade de ser do conhecimento do gestor determinada operação entre a PT e o BES, Bava tinha uma resposta: “Não guardo memória.” “Em sã consciência eu não sabia.” Fossem 500 milhões investidos numa empresa como a ESI, onde “ninguém mais queria investir”, como sublinharam os deputados. Fosse o fundo de pensões dos trabalhadores que ia parar à Espírito Santo Activos Financeiros, do GES, em nome do Benfica Stars Fund, por via da Ongoing.
Desta vez, ao contrário das anteriores, Bava não usou uma miríade de termos em inglês. Falou várias vezes de “cash pooling”, trouxe para o léxico parlamentar a expressão “tableaux de board” (espécie de gráficos que iam a despacho na administração, onde constavam os investimentos). 
À defesa, com pouca memória e muitos circunlóquios, Zeinal Bava decidiu não partir para o ataque. Recusou-se, apesar de instado por Duarte Marques, a “desmentir” as afirmações de Henrique Granadeiro. “Se o dr. Henrique Granadeiro vem cá, penso que é a pessoa certa para lhe fazerem as perguntas.” Bava fez finca-pé e sublinhou que a partir do momento em que saiu da PT SGPS, em Junho de 2013, “não tinha de saber” o que se passava na PT SGPS. Aí mandava Henrique Granadeiro. Quando saiu da PT, em Agosto, Granadeiro disse conviver bem com os seus actos, “mas não com os encargos e responsabilidades de outros”. Já na recta final da venda da PT Portugal à Altice (numa carta enviada à CMVM no momento da primeira assembleia geral da PT SGPS convocada para aprovar o negócio), o gestor criticou a fusão com a Oi, voltou a assumir parte das responsabilidades pelos prejuízos na Rioforte, mas, desta vez, foi directo nas acusações a Bava. O cerne da discussão entre os dois antigos responsáveis da PT anda em torno de quem na empresa fazia a gestão de tesouraria e decidia onde aplicar os excedentes.

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