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segunda-feira, 8 de outubro de 2012

CARTA CONTRA O FASCISMO

por Jorge de Sena - Escritor, Doutor em Letras, Professor catedrático, Director do Departamento de Literatura portuguesa e espanhola, Engenheiro Civil.

(Publicado no “Portugal Democrático”, de S. Paulo, em 5/10/ 1959)

«Tratam-te os que te lambem e legitimam, por Sr. Presidente do Conselho. Chamam-te os que ainda acreditam nas Universidades que degradaste, por Professor Doutor. No tempo em que eras fascista sem vergonha passavas por ser o Chefe, e os leonardos, teus chacais, escutavam a tua Palavra. Depois, quando inventaste a “democracia orgânica”, gostavas que te apelidassem de Chefe... do Governo. Mas, no isolamento e no silêncio e na treva, que é o sítio vago onde estaria a alma que te fugiu aterrada com o cheiro de arganaz podre a que o teu cérebro e o teu coração fedem, tu sabes que não és nada disso. Presidente de quê? De um Conselho de lacaios? Chefe de quê e de quem? Dos assassinos e ladrões impunes que proteges, para que eles te protejam o couro ressequido que nunca terá conhecido para que dignidade e que alegrias serve a carne humana? Professor de quê? Doutor em quê? Professor de desmoralização, de cepticismo, de corrupção, de crueldade, de hipocrisia, de blasfémia, de infâmia? Doutor em quê? Em técnicas de Censura e de Polícia, que são toda a tua política, toda a tua filosofia, toda a tua religião?

Some-te, rato! Mergulha de uma vez no esgoto de oito séculos de erros que te criaram e engordaram, como excremento que és, venenoso, estéril, impotente. Rato, apenas, rato. As comemorações brilhantíssimas do 5 de Outubro em São Paulo, o que elas significam de unidade na luta democrática, o que elas projectam no futuro como esperança de dissolução sulfúrica da tua presença pestilenta, nada disso chegará aos teus ouvidos surdos, às tuas unhas negras da pele dos mártires que esfolaste, à tua cauda imunda, com que fustigas um dos mais gloriosos e heróicos povos da terra. 

Não lerás, também porque és analfabeto e nunca leste nada, o telegrama em que os democratas reunidos para comemorar a Revolução que hoje simboliza a unidade de todos os portugueses, sem distinção de raça, religião ou credo político, na luta contra a tua baba peçonhenta, com que tens envenenado tanto patriota ingénuo que no Brasil honra o trabalho português, pedem a tua demissão. E fazes bem, fazes bem. Tu não podes demitir-te, porque nunca foste nomeado. Tu és o símbolo da ilegalidade, da arbitrariedade, da injustiça, da opressão. Não te demitas, some-te! Some-te, rasteiro como nasceste, como subiste, como governaste, como imitaste nos teus discursos, laboriosamente vomitados, uma língua admirável que, rato que és, nunca soubeste falar.

Some-te tal como viveste, com a mesma cobardia com que mandaste assassinar, roubar, violentar. Some-te rato, com a tua bota-de-elástico, a tua pena de pato, a tua ceroula de fita, as tuas letras gordas, a tua finança de quinta, a tua economia de campónio, a tua política de traidores à Pátria. Some-te assim, rasteiro e mesquinho, como vieste! Some-te, rato! E que o ódio de um Povo, e o desprezo de todos os amantes da liberdade e da justiça, saibam esquecer o momento de nojo e de vergonha e castração que tu longamente foste, em mais de trinta anos de horror e reles mesquinhez. Que nem a tua pele piolhosa fique apodrecendo na memória das gentes, mais que como imagem da peste política e moral! Some-te rato!». — com Francisco Valverde Arsénio e outras 49 pessoas.


Guilherme Antunes  (facebook)

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