- Anabela Fino
Eles têm medo
A história não se repete, como se sabe, mas imita muito bem. Num curto espaço de tempo, enquanto o País reagia com estupor e indignação à proposta de Orçamento do Estado para 2013, um professor que não é de Coimbra mas que acredita estar destinado a salvar as finanças nacionais, um cardeal que não é cerejeira mas é da mesma cepa, e um empresário que é muito democrata mas nunca se deu mal com o fascismo, vieram dizer ao «bom povo português» – numa linguagem e evocando «valores» semelhantes quanto baste aos cultivados durante quase meio século pela ditadura fascista – que tem de engolir até à última gota a taça de cicuta prescrita pelas altas instâncias para lhe tratar da saúde.
A mensagem, transmitida com nuances, teve ainda uma outra característica: desenterrou o anti-comunismo primário e voltou a agitá-lo como um papão.
O primeiro a fazê-lo foi o primeiro-ministro, que após uma mal sucedida incursão pelas «conversas em família» de triste memória optou pela tribuna do Parlamento para tentar convencer os portugueses da excelência da sua governação. Foi aí, manifestamente incomodado por o que se diz sem rebuço nas ruas ecoar também nas vetustas paredes da Assembleia, que Passos Coelho acusou o PCP de instigar à violência ao classificar de roubo o que de facto é um roubo.
Já o ministro das Finanças, com o tom melífluo que o caracteriza, deixou clara a sua «compreensão» para com alguns protestos mas não todos, evidentemente. Sair à rua a convite de redes sociais e gritar ordeiramente uns impropérios para aliviar a bílis até ajuda a diminuir a pressão, mas fazê-lo em resposta ao apelo dos sindicatos já é outra conversa. Até Gaspar sabe, lá do seu gabinete, que é a luta organizada dos trabalhadores e do povo que corrói os alicerces do poder do capital.
Pela mesma bitola, mas ainda mais curta, se regula D. Policarpo, para quem manifestações e até revoluções – abrenúncio! – nada resolvem. Para o Cardeal Patriarca de Lisboa, os fiéis devem sofrer em silêncio, resignadamente, deixando o Governo governar, que isso sim é que é democracia. Donde se infere que quem assim não procede não é democrata nem bom português. Resta aos crentes, presume-se, rezar e mastigar a bíblia devagarinho para matar a fome.
Mais terra a terra, Fancisco Van Zeller, o ex-patrão da CIP que preside à comissão (independente?!) de acompanhamento da privatização dos Estaleiros de Viana do Castelo, acha muito bem que o povo se manifeste aos fins-de-semana – até pareceria «mal» se o não fizesse – mas lá fazer greves e estar sindicalizado é que não. Aliás, diz, o grande problema que o novo dono dos estaleiros terá de resolver é acabar com a mão-de-obra «antiga e desactualizada» e com o «sindicato comunista que está enquistado e que é muito violento». Na cartilha Van Zeller, à «violência» que é defender os direitos dos trabalhadores responda-se com a polícia de choque.
Moral desta história: os comunistas de hoje já não comem criancinhas ao pequeno almoço nem matam os velhos com uma injecção atrás da orelha, como no tempo do fascismo, mas tal como no tempo do fascismo metem medo, muito medo ao capital. Por que será?
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