«Fez este mês cinco anos que o BES colapsou. Não foi um colapso qualquer, foi um enorme estrondo, que deixou estilhaços por todo o lado. Todos percebemos as razões para a queda do banco, mas acho que praticamente ninguém percebeu o que a seguir se passou e ainda continua a passar-se.
O BES, que dias antes da resolução era considerado por governantes e supervisores como seguro e de confiança, foi dividido em dois, o banco bom e o banco mau, para se evitar uma compreensível crise sistémica, que provocaria efeitos inimagináveis na economia e na sociedade portuguesa.
Aos portugueses foi assegurado que no banco bom (Novo Banco) ficavam os ativos não tóxicos e que no banco mau (BES) ficavam os considerados tóxicos. O tempo encarregou-se de demonstrar que não foi bem assim. Para o banco bom também transitaram muitos ativos tóxicos e problemáticos sendo que, afinal, não era tão bom como apregoaram. Mais uma vez os portugueses foram enganados.
Depois continuam a tentar-nos enganar, agora com a versão de que não vão ser os contribuintes a pagar a fatura dos desvarios ruinosos desses gestores (premiados) e supervisores causadores de tamanha hecatombe.
O imenso dinheiro injetado e a injetar pelo Fundo de Resolução no Novo Banco vai ser pago até 2046 pelas contribuições sobre o setor bancário. Para pagarem ao Fundo de Resolução, os bancos vão ter que criar lucros suplementares (e até já o estão a fazer). Quem pagará esses lucros serão os depositantes e os clientes desses bancos, ou seja, de grosso modo os contribuintes.
Para garantirem esses lucros, os bancos despedem trabalhadores, fecham balcões e criam comissões bancárias em catadupa. Se não chegar inventarão mais formas de nos extorquir cada vez mais dinheiro, sempre defendidos pela máxima de que não serão os contribuintes a pagar. Até será verdade, se por acaso os depositantes ou clientes bancários não forem contribuintes portugueses, forem marcianos.
Como pelo que se saiba ainda nenhum marciano abriu uma conta num banco em Portugal, seremos todos nós a pagar, não via impostos, mas via comissões e mais comissões bancárias e outras formas engenhosas inventadas e a inventar.
A bem da transparência aos portugueses deveria ser dita a verdade. Não vai haver aumentos de impostos para pagar ao Fundo de Resolução, mas os portugueses e as empresas vão ter de pagar, a não ser que não peçam dinheiro emprestado à banca, não tenham conta bancária e guardem o seu dinheiro debaixo do colchão.
Depois temos mais uma vez a justiça a não funcionar em tempo oportuno. Cinco anos volvidos, ainda ninguém foi sequer julgado por estes atos ruinosos. Foram milhares de milhões de euros de gestão quiçá criminosa. Potenciais culpados não faltam. O que falta é fazer justiça.
Essa mesma justiça condenou recentemente e de uma forma célere um “indigente com um percurso de vida errático” a um ano de prisão por ter roubado 15 chocolates num supermercado, que foram valorizados em 23,85 euros. Sem querer fazer qualquer juízo sobre a justiça desta decisão (que se calhar até foi adequada), torna-se percetível ao cidadão comum que os poderosos acabam sempre por encontrar formas de fugirem ou adiarem o assumir das suas responsabilidades.
Torna-se claro que a nossa democracia ainda está incompleta, porque quando o sol nasce deveria ser para todos de uma forma igual e quando chove não deveriam existir abrigos privilegiados para alguns.
Vale a pena pensarmos nisto.»
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