O embaraçoso silêncio de Passos
Primeiro-ministro falou muito mas não disse nada de relevante. E continua a não responder a uma pergunta simples: recebeu ou não cinco mil euros mensais durante três anos nos anos 1990?
Pedro Passos Coelho respondeu esta terça-feira às perguntas levantadas nos últimos dias sobre os seus rendimentos, as suas declarações ao fisco e as informações que prestou à Assembleia da República nos anos 1990.Em directo nas televisões, o primeiro-ministro foi mais do que cauteloso. Repetiu a frase “não posso ser mais claro nem mais aberto do que isto” e anunciou que iria pedir, no próprio dia, que a Procuradoria-Geral da República o investigue e verifique se cometeu “eventuais ilícitos”. No fim, como nunca ouvimos em 40 anos de democracia, disse mesmo que tiraria “as consequências” das conclusões da investigação.
Passos falou muito, mas não disse nada de relevante.
O que Passos Coelho não disse é particularmente barulhento. O primeiro-ministro mantém um absoluto silêncio sobre uma pergunta simples que este jornal faz há dois anos: entre 1997 e 1999, recebeu ou não dinheiro do Centro Português para a Cooperação, a ONG criada e financiada pela Technoforma? Se recebeu, Passos tem um problema: não o declarou às finanças. Se não o recebeu, porque é que simplesmente não o afirma? A questão é relevante porque Passos disse por escrito que, nesse mesmo período, era um deputado com regime de exclusividade na Assembleia da República, tendo recebido por isso perto de 30 mil euros.
Ninguém se lembra com rigor científico o que escreveu num formulário oficial há 17 anos. Mas ninguém se esquece se, há 17 anos – e durante três – recebia uma avença fixa de cinco mil euros. Cinco mil euros são um belíssimo salário hoje. Em 1997, seriam seguramente ainda mais memoráveis. É incompreensível que Passos Coelho não se lembre e não responda a esta pergunta. E não o fazer é tudo menos ser “muito claro”. É o oposto. É ser obscuro, é não ser transparente.
Do mesmo modo que o pedido de investigação que pretende enviar à PGR só não é um bluff mediático se o primeiro-ministro entregar as suas declarações de IRS e uma autorização de levantamento do sigilo bancário. Abrir o jogo, mostrar as cartas e não ter medo do que aí vem.
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