Por Baptista-Bastos
Na história da democracia portuguesa nunca tão poucos fizeram tão mal a tantos. Ao mesmo tempo que a cègada política transforma as nossas monumentais perplexidades numa exasperada interrogação: que mais nos irá acontecer? O rol de indignidades é extenso e não deixa de aumentar: mentiras, omissões, faltas à palavra e aos compromissos, desprezo por todos nós, ocultação de factos e de decisões, por aí fora. Este fim-de-semana, Paulo Portas continuou a não contradizer a natureza do seu carácter, que se distingue pelo ambíguo e pela duplicidade. Denegou o que, uma semana antes, grave e sumptuoso, afirmara: não toleraria a aplicação de uma taxa às pensões e às reformas.
Ele sempre foi assim: pensa a política como um jogo de pertenças múltiplas, e os políticos não devem ser julgados através de padrões morais. As circunstâncias é que determinam, explicam e justificam os seus actos e as suas condutas. Segundo Paulo Portas, a democracia não se esgota na forma jurídico-política, e enriquece-se com a criatividade e a inventiva dos seus actores. O sentido da honra possui um valor supérfluo.
Estas confusões parecem ter adquirido carta de alforria, tendo em conta a naturalidade com que são encaradas. Há qualquer coisa de errado e de contagioso que excede o funcionamento processual da democracia. Quando um Governo, este, opera decisões que, de antemão, sabe serem anticonstitucionais, inscreve-se numa erosão endémica, que devia combater como norma fundamental da sua própria estrutura. As coisas, porém, não são assim. E se Paulo Portas intruja e desdiz-se, Passos Coelho não faz melhor do que seguir a banalidade que já pertence aos novos campos de intervenção política. Este Governo não é uma nódoa; é uma chaga pestilenta.
Quando, pressurosamente, o dr. Cavaco, coitado, fala em pós-troika, devia, sim, preocupar-se com as mazelas morais deixadas por esta gente equívoca, incompetente, grosseira e indecorosa, cujas relações com a democracia e os seus exigentes mecanismos são nulas e perigosas. Mas ele, infelizmente, não vê, na democracia outra coisa senão um objecto de ódio, de despeito e de sobranceria.
Vai reunir-se, segunda-feira, o Conselho de Estado; e a crer no que numerosos dos seus componentes têm dito e escrito deste Executivo, não se vê razões para que a reunião seja pacífica, e o seu presidente contrarie os impugnadores desta política celerada, continuando a sustentar o nosso infortúnio. É verdade que a arrogância de Belém atinge os limites do insuportável; porém, não há "interesse nacional" (expressão que oculta todas as vilanias) que justifique o conjunto de infâmias que nos têm atingido nos últimos dois anos.
A coligação deixou de o ser há muito tempo. É um conjunto mal remendado de interesses, e um concentrado de servilismo a conveniências estrangeiras. A palavra perfídia anda perto.
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