Submarinos: Ex-consul de Portugal julgado na Alemanha por corrupção
Conheça aqui excertos de um documento, apreendido, em 2010, no escritório de Jürgen Adolff pela polícia alemã, onde o ex-cônsul honorário de Portugal em Munique descreve como tentou influenciar a opção do Governo Durão Barroso-Paulo Portas pelos submarinos alemães.
Como se conta na edição impressa da VISÃO desta semana, Jürgen Adolff foi entre 1994 e 2010 e está a ser julgado na Alemanha por corrupção passiva em Munique.
Segundo as autoridades alemãs, o ex-cônsul honorário, com interesses empresariais no Algarve, terá recebido "luvas" para influenciar a decisão do governo Português na aquisição, em 2004, de dois submarinos a um consórcio alemão liderado pela multinacional Ferrostaal.
Esse dinheiro terá sido pago ao abrigo de um contrato de consultoria que iria garantir a Adolff 0,3% do montante envolvido nos submarinos - 880 milhões de euros.
Mas, em 2004, a Ferrostaal quis reduzir-lhe as comissões em 50 por cento. O ex-cônsul honorário não gostou e fez um relatório detalhado sobre a sua influência na decisão do Executivo de Lisboa, reclamando o pagamento na totalidade e acabou por receber mais de 1,6 milhões de euros pelos serviços prestados.
Eis excertos do documento apreendido, em Março de 2010, pela polícia alemã no seu escritório de Munique.
'Diário' do cônsul
10.06.1999 - Receção pelo embaixador de Portugal em Bona, Sr. Dr. João Diogo Nunes Barata. Conversa do Dr. Jürgen Adolff e Rita Adolff [sua mulher] com o Sr. Hanfried Haun, administrador da Ferrostaal e o vice Sr. Weisser. O Sr. Haun fala sobre a estagnação das pré-negociações com Portugal (...). Ele solicita apoio.
19.08.1999 - Telefonema do Sr. Haun por causa das propostas de contrapartidas e do meu encontro com o Sr. Dr. Veiga Simão (anterior ministro da Defesa).
2000 e 2001 - O Governo do Estado português (PS) não mostra um interesse prioritário nas negociações relacionadas com a compra de submarinos. Em especial devido a problemas orçamentais e à falta de uma solução de questões relativas ao financiamento.
05.07.2002 - Logra-se convidar o sr. Primeiro-ministro Barroso para Munique.
Conferência na Fundação Hanns Seidel [fundação política ligada ao União Social Cristã, da Baviera].
Organizo almoço a pedido do PM Barroso. Convido também o Sr. Haun. Promovi em especial a conversa entre o Sr. primeiro-ministro Barroso e o Sr. Haun.
Resultado: PM Barroso incumbe o Dr. Mário David [seu conselheiro] e a mim de continuarmos a acompanhar e a promover o assunto do GSC.
Comentário do Sr. Haun: Até agora nunca se negociou a este nível. Ainda à mesa, o Sr. Haun confirma honorários adequados. (...)
09.07.2002 - Proporciono um encontro a curto prazo entre o Dr. David e o Sr. Haun em Lisboa.
31.07.2002 - Sr. Haun comunica-me que estará em Lisboa a partir de 22.09.2002 e pede agendamento de novas reuniões.
24.09.2002 - O Sr. Haun comunica que discutiu, em Lisboa, o projeto de contrato para a compra e que esse foi bem recebido. Pede a intervenção a Dr. Jürgen Adolff para conseguir encontros com o ministro da Defesa, Dr. Paulo Portas, e com o ministro da Economia Dr. Tavares.
24.09.2002 - Carta enviada ao Dr. David. Acordada reunião para 03.10.2002 para proposta de financiamento. Marcada reunião com o ministro da Defesa, Dr. Paulo Portas.
03.10.2002 - Reunião sobre o ponto da situação negocial entre
Sr. Haun
Sr. Mühlenbeck
Dr. Jürgen Adolff
Sr. Rita Adolff
Seguiu-se encontro com Dr. Mário David em São Bento, residência oficial do primeiro-ministro, com o Sr. Philipp Schöller da International Defense Financing.
Apresentação extremamente importante que mostrou uma via (?) de que há maneiras de representar um financiamento neutro do ponto de vista orçamental.
Numa conversa subsequente com o Dr. David (conselheiro político do primeiro-ministro) pôde esclarecer que soluções idênticas também são possíveis com grandes Institutos (por exemplo, bancos).
Isso levou posteriormente, na sequência da elaboração de um conceito adaptado e refinado, a convidar 10 bancos internacionais e, finalmente, à escolha dos dois bancos financiadores, o Credit Suisse e o Espírito Santo.
10.01.2003 - Dr. Jürgen Adolff informa o Sr. Haun de que vem a Lisboa uma delegação francesa de alto nível.
Uma vez mais, Dr. Jürgen Adolff, aconselha veementemente a apresentar, num curto prazo, um conceito de financiamento adequado (orçamentalmente neutro) para cerca de 4 a 5 anos sem exidibilidade do pagamento.
07.02.2003 - Buscar o ministro da Defesa ao aeroporto de Munique para a Conferência de Segurança. Durante a viagem entre o aeroporto e o hotel, cerca de 40 minutos, conversa a dois. Entre outros assuntos, também sobre submarinos.
08.02.2003 - Buscar ministro Paulo Portas ao hotel.
Participação [de Portas] na Conferência de Segurança. Conhecido statement do ministro Paulo Portas a favor de [Donald] Rumsfeld contra [Joshka] Fischer relativamente à guerra do Iraque. (...)
Conversa entre o Dr. paulo Portas e o então presidente da Comissão de Defesa da Alemanha.
09.02.2003 - Pequeno-almoço com a delegação portuguesa no hotel e aconselhamento sobre a reação da imprensa ao statement do Sr. ministro Paulo Portas. A minha proposta foi a de acalmar os ânimos com o contrato dos submarinos. Conversa entre o Dr. Paulo Portas e o presidente da Comissão de Defesa da Alemanha, intermediada por mim.
25.09.2003 - GSC ganha o concurso.
11.11.2003 - É tornada pública a decisão pelos submarinos alemães.
19.02.2004 - (...) Sr. Haun pediu ajuda. Negoceia, há semanas, com subalternos, sem qualquer progresso. (...) Prometo esmerar-me.
21.02.04 - Assinatura oficial dos contratos (...).
Contrapartidas significativamente simplificadas. Não é necessária a participação nos Estaleiros de Viana do Castelo.
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