Como funciona o Cirque du Soleil
Introdução
Não importa para onde você olhe, o Cirque du Soleil é um grande sucesso. Em pouco mais de 20 anos ( a Companhia foi criada em 1984), conquistou uma posição única na indústria do entretenimento, visitou cidades em todo o mundo e recebeu críticas espetaculares. O Cirque também está muito bem financeiramente: seus ganhos estão estimados em US$ 1 bilhão, as vendas anuais de ingressos ultrapassaram US$ 450 milhões, e mais de 40 milhões de pessoas ao redor do mundo já assistiram a pelo menos um de seus espectáculos.
Foto cedida por Al Seib A dança do fogo |
Esta grande popularidade pode ser atribuída à extraordinária experiência de ver o Cirque de perto. A combinação do trabalho dos artistas, diretores eequipe de bastidores cria um espetáculo completamente original, que deixa a platéia deslumbrada. O Cirque é reconhecido em praticamente todo o lugar que vai.
Fundamentos do Cirque
O Cirque du Soleil nasceu em 1984 na cidade de Montreal, Canadá, quando um grupo de artistas de rua se juntou para criar um espetáculo que tinha de tudo. Eles andavam sobre pernas de pau, cospiam fogo e faziam malabarismos. Ao longo dos anos, o grupo cresceu, criou novos espetáculos e começou a visitar novas cidades.
Hoje, o Cirque possui cinco espetáculos itinerantes e quatro fixos (que ficam apenas em uma cidade). A idéia é adicionar um novo a cada ano.
Mesmo que seus espetáculos e turnês estejam mais sofisticados, o Cirque nunca se afastou de suas raízes, a arte de rua. Ao contrário de muitos circos famosos, que têm números com animais, o Cirque du Soleil utiliza exclusivamente o talento extraordinário de seus artistas. Para criar um espetáculo, a equipe reúne diversos talentos de todo o mundo e os transforma em um grupo harmonioso.
Tanto os espetáculos itinerantes, como Alegría e Varekai, quanto fixos como “O”, em Las Vegas, são realizados de acordo com dois elementos principais: trilhas sonoras e temas únicos. Como vamos ver a seguir, estes elementos auxiliam o desenvolvimento de cada número, cenário e figurino dos espetáculos.
Tema
O Alegría, , foi o segundo espetáculo criado pelo Cirque, em 1994, na sede artística de Montreal. É sempre na sede que a equipe de criação - incluindo o fundador Guy Laliberte, diretores, diretores artísticos, criadores de cenário e figurino e os coreógrafos - se reúne para discutir sobre novos espetáculos.
O primeiro item a ser determinado é o tema - uma escolha difícil, já que deve interligar todos os números sem que seja necessária muita narração. A equipe do Cirque evita as narrações para permitir que o público interprete o espetáculo da maneira que quiser.
Foto cedida por Al Seib A rota rápida |
Os temas do Alegría são vários, como poder (mau uso do poder político e sua transferência através das gerações) e contraste (antigas monarquias e modernas democracias, velhice e juventude). Para representar tudo isso, os personagens do espetáculo se caracterizam de mendigos, crianças, velhos aristocratas e bobos da corte. Em cada espetáculo do Cirque, o tema é estreitamente ligado à trilha sonora. Na próxima seção, vamos conhecer esta parte do processo criativo.
Trilha sonora
A trilha sonora para cada espetáculo do Cirque é desenvolvida por membros da equipe de criação. A equipe é liderada por um compositor, como René Dupéré, que escreveu a trilha sonora de Alegría, indicada ao Grammy, e várias outras trilhas de espetáculos do Cirque.
A trilha sonora de Alegria, como todas do Cirque du Soleil, é uma mistura eclética de estilos musicais. Esta mistura indica a mudança de humor e de tema para o público.
A trilha também serve como uma deixa, guiando os artistas durante cada número do espetáculo. Para garantir que os músicos sigam o ritmo dos artistas, todos os espetáculos utilizam música ao vivo. No caso de um número falhar, os músicos ajustam o tempo e o volume, improvisando se necessário.
Todos os espetáculos do Cirque du Soleil apresentam músicas que usam "notas fonéticas" em vez de palavras. De acordo com Parisien, "o uso de palavras bloqueia a imaginação". Parisien acredita que esta característica ausência de palavras, como no tema de abertura e fechamento do espetáculo, permite a interpretação do público e torna o Cirque mais universal.
Foto cedida por Al Seib Monsieur Fleur |
O elenco
O trabalho dos artistas, com seus números incomparáveis, é a parte mais importante de todos os espetáculos do Cirque du Soleil. Agentes e olheiros vasculham cidades e lugares remotos à procura de novos talentos para os espetáculos do Cirque.
Além disso, os agentes realizam testes duas vezes ao ano na Sede Internacional, em Montreal, e os artistas também podem enviar vídeos com suas performances. Atualmente, a base de dados do Cirque du Soleil possui mais de 20 mil fichas de artistas, com números que são considerados de sublimes a estranhos. Parisien conta o vídeo de um homem: "foi algo muito especial...ele encostou o nariz em um copo e depois ficou movendo o copo para parecer que o nariz estava se mexendo...é muito estranho...eu ri na primeira vez que vi isso".
Foto cedida por Al Seib Manuseio |
Todos os artistas do Cirque du Soleil devem fazer um treinamento ou "aulas de formação" antes de participar dos espetáculos. Cada um deles é enviado para Montreal, onde treinam de um a seis meses na Sede Internacional. Mais de 50% dos números do Cirque são de ginástica artística, os outros são uma mistura de artes circenses e conhecimentos teatrais. Para os artistas sem conhecimentos em teatro ou artes circenses, as aulas de formação são cruciais. Durante este período de treinamento, os artistas aprendem as habilidades necessárias para efetivamente interagir com públicos de 3 mil pessoas.
Cenografia
O departamento de cenografia do Cirque du Soleil desenvolve o palco e os equipamentos para cada espetáculo. Duas considerações importantes são a estética e a segurança. No Alegria, os cenários foram desenvolvidos para transmitir os temas poder e contraste. O cenário de Alegría lembra a cúpula de uma igreja, um símbolo de poder com duas escadas, uma de cada lado, para representar o contraste ou "os dois lados".
Para o Varekai, outro espetáculo do Cirque, o criador de cenário usou softwares de animação e de engenharia industrial da Discreet 3D Max para criar uma floresta mágica dourada. A equipe de criação de cenário fez as árvores douradas em Varekai com materiais desenvolvidos pelo próprio Cirque, que são flexíveis mas fortes o suficiente para suportar o peso dos acrobatas.
Foto cedida por Al Seib A barra aérea alta |
A inovação na estética e na segurança é um ingrediente essencial para a receita de sucesso do Cirque. O Cirque inventou muitos equipamentos especificamente para seus espetáculos, incluindo a rota rápida, uma rede de acrobatas especial e o balanço russo duplo. O Cirque du Soleil vai contratar outras empresas para ajudar na criação de algumas partes do cenário e do palco, mas qualquer peça utilizada pelos acrobatas é produzida em uma área de pesquisa e desenvolvimento na Sede. Os projetistas do Cirque têm total controle sobre a segurança e planejamento das peças que constroem.
Foto cedida por Al Seib |
Figurino
O desenvolvimento do figurino e da maquiagem é um elemento importante em todos os espetáculos do Cirque. O objetivo do criador de figurino é desenvolver uma roupa que represente um personagem e permita que o artista se apresente com liberdade, tudo isto combinado com elementos estéticos e cuidados com a segurança.
Dominique Lemieux tem criado o figurino de muitos espetáculos do Cirque du Soleil, incluindo o Alegria. Lemieux trabalha com mais de 300 artesãos e 80 criadores na Sede do Cirque para desenvolver, produzir e conservar todos os figurinos para o Alegria e outros espetáculos. No Alegria, Lemieux usou os figurinos para representar o contraste e o poder na luta entre a "juventude" e a "velha guarda". Por exemplo, os figurinos usados pelos Anjos Brancos e pelos Velhos Pássaros representam o contraste entre o novo e o velho.
Foto cedida por Al Seib Os Velhos Pássaros |
Aqui está como o Cirque du Soleil descreve os personagens Anjos Brancos e Velhos Pássaros:
- "Os Anjos Brancos são os graciosos guardiões da Alegria. Ágeis, confiantes e corajosos, os Anjos são a juventude de amanhã. A postura deles é suntuosa, seus braços, como asas, estão sempre elegantemente equilibrados ao lado de seus corpos. Vestidos de branco, com peitorais feitos de ouro e narizes pintados de vermelho, os Anjos apóiam uns aos outros enquanto se revezam saltando pelo ar nas barras russas".
"Os nostálgicos Velhos Pássaros observam o que acontece como se fossem jovens e bonitos, acreditando que o futuro ainda pertença a eles. Admiram seus reflexos em quadros sem espelhos, mas são apenas vazios, sombras do que costumavam ser. Eles são a antiga aristocracia, ainda convencidos do seu poder e beleza. Mas na verdade são loucos, deformados e feios. Eles usam chapéus extravagantes e se escondem atrás de suas roupas floreadas com tons cor de malva, verde e dourado e cheias de rendas, jóias e enfeites".
Informações sobre os números cedidas por Cirque du Soleil
Lemieux e a equipe de criação de figurino do Cirque fizeram mágica para criar roupas brancas simples para os Anjos e figurinos extravagantes, floreados e máscaras para os Velhos Pássaros. Como o número dos Anjos Brancos é feito nas barras russas, segurança e espaço para o movimento foram levados em consideração para desenvolver suas roupas leves, mas firmes. Usando uma ferramenta especialmente desenvolvida pelo Cirque, os criadores fizeram o figurino dos Anjos Brancos com uma renda específica de linha de pesca. A renda modificada é forte o suficiente para suportar 500 kg de pressão.
Os Anjos Brancos |
O traje do homem forte do Alegria também é altamente inovador. Incorpora mecanismos de suporte discretos, permitindo que o artista levante com segurança os pesos necessários para o número. O figurino para as contadoras de história do Alegria, a Cantora de Branco e a Cantora de Preto, são vestidos feitos com armações e lâminas de aço.
Foto cedida por Al Seib A Cantora de Branco |
A cidade móvel
Hoje, um espetáculo itinerante como o Alegria cruza o mundo em uma "cidade móvel" do Cirque du Soleil, construída para ocupar 16.722m². Em cada nova cidade, esta "cidade móvel" precisa de 140 auxiliares permanentes e 150 temporários para montá-la, desmontá-la e administrar suas instalações. Isto inclui o Grand Chapiteau (A Grande Tenda), uma tenda de entrada anexa, o palco, a tenda artística, cozinha e área para refeição, uma escola e os suprimentos usados para manter tudo funcionando. São necessários 50 caminhões carregando mil toneladas de equipamentos cada para mover a cidade. A equipe leva oito dias para montá-la e três para desmontá-la.
O Grand Chapiteau é sempre usado em todos os espetáculos itinerantes do Cirque. É o lugar onde ficam o palco principal e as áreas de apresentação. O Grand Chapiteau comporta 2.500 espectadores e exige o trabalho de 70 pessoas, incluindo os "mestres de tenda", treinados exclusivamente pelo Cirque para realizar a tarefa monumental de levantar a Grande Tenda. A diretora de relações públicas Renee-Claude Menard relembra a primeira vez que o Cirque montou o Grand Chapiteau: "ninguém sabia como fazer e acabou caindo. No dia da conferência de empresa estava chovendo muito, a água formou uma poça e a tenda desmoronou".
O Cirque e seus artistas têm muitas tradições de grupo, além de tradições exclusivas para cada espetáculo. Uma tradição do grupo é dar um nome para cada Grand Chapiteau. De acordo com Menard, esta tradição existe desde o começo do Cirque: "nesses 20 anos, uma das tradições que acho surpreendente é a de dar nome às Grandes Tendas. Todas elas têm um nome. Quando um novo Grand Chapiteau é inaugurado, damos um nome único a ele, único não só para o Cirque du Soleil, mas para a trupe. Existe um pequeno grupo no Cirque que se reúne para garantir que as tendas sempre sejam nomeadas e este nome não é necessariamente divulgado. Isto é feito para mostrar a evolução do espetáculo. Primeiro tínhamos apenas uma, agora temos várias".
Foto cedida por Al Seib Contorção |
Outros pontos principais para aqueles que viajam com a "cidade móvel" do Cirque são a cozinha e a área de refeição. Nestes lugares, os artistas e as equipes comem refeições preparadas por cinco chefs (com 13 assistentes no total). Estes chefs servem 300 refeições por dia para os artistas e assistentes do Cirque. Durante os 10 anos de estrada do Alegria, o elenco e as equipes comeram:
- 1.622.400 morangos
- 162 mil quilos de carne
- 374.400 biscoitos
- 79 mil litros de leite
- 1,5 quilo de frutos do mar
A cozinha e a área de refeição também são lugares onde os artistas e os assistentes podem se reunir, conversar e checar os e-mails.
Muitas das tradições do Cirque começaram na área de refeição. Na noite de estréia, por exemplo, os chefs freqüentemente preparam pratos tradicionais da cidade que estão visitando. Muitas vezes, um membro do elenco ajuda a preparar a comida de seu país. No dia de mudança ou de "desmontar", os chefs preparam spaghetti à bolonhesa, feito com os alimentos que sobraram. O planejamento do menu deve ser exato porque a comida não pode ser desperdiçada ou levada para o próximo lugar da turnê.
Memória do Cirque
No passado, era extremamente difícil administrar e coordenar os aspectos criativos, elencos, cenários, instalações dos espetáculos e locais de turnê do Cirque du Soleil. O crescimento da equipe e da rede de espetáculos do Cirque aumentou esta dificuldade. Por exemplo, em 1984 o Cirque tinha 73 empregados e um Grand Chapiteau. Hoje, o Cirque tem nove espetáculos, com 2.700 empregados de 40 nacionalidades que falam 25 línguas diferentes.
Para auxiliar a administração destes vários elementos, o Cirque du Soleil construiu a Sede Internacional e desenvolveu a "Memória do Cirque" (site em inglês), uma base de dados online. A construção da sede e a utilização da Memória contribuíram para a evolução do Cirque como uma organização estruturada, porém criativa. As instalações da sede internacional criaram um lugar central onde a equipe treina os artistas, desenvolve os cenários e cria os figurinos.
Foto cedida por Al Seib As ninfas |
Criado para organizar e administrar os espetáculos do Cirque, a Memória do Cirque vasculha e organiza os artistas e assistentes, assim como suas necessidades. Trabalhando com consultores de TI (tecnologia da informação) externos e com seu próprio departamento de TI, o Cirque desenvolveu e implementou uma base de dados global com acesso online e em cinco línguas diferentes. Construído usando apenas o Microsoft Windows 2000, Internet Information Server 5.0 e SQL Server 2000, a Memória do Cirque possui seis aplicações: elenco, maquiagem, memória de figurinos, medi-cirque, kin-cirque e administração de números.
O sistema permite que o Cirque rastreie os 20 mil artistas no diretório de elenco. A base de dados também inclui fotos e instruções sobre aplicações de maquiagem em cada personagem, além de 5 mil modelos de figurino e 4 mil notas de revezamento. A equipe e os médicos do Cirque podem monitorar a saúde e a recuperação dos artistas através de 24 mil arquivos no Medi-Cirque. Se necessário, os diretores podem usar a Memória do Cirque para achar substitutos com os mesmos pesos e alturas dos artistas machucados, eliminando suportes caros e a produção de novos trajes. Esta administração de dados garante a constante qualidade de cada espetáculo durante suas apresentações e ajuda a assegurar que as reposições ou mudanças de elenco, figurino ou cenário ocorram da maneira mais rápida e eficiente possível.
O Cirque du Soleil evoluiu muito desde quando foi criado por um grupo de artistas de rua em Montreal. Por 20 anos, foram feitos espetáculos de tão surpreendente beleza e talento que o Cirque está destinado a continuar redefinindo o entretenimento ao vivo e ser um grande sucesso de bilheteria em todo o mundo.
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