Como assim? Aves nascendo em conchas e saindo voando por aí?
Será mito ou verdade?
VAMOS DESCOBRIR...
Bom, tudo começou com Sir Robert Moray (Figura 2), que foi um espião do cardeal Richeliu, maçom, membro do exército escocês que tomou Newcastle dos ingleses em 1640 e, em seu tempo livre, o primeiro presidente da Royal Society. Ele escreveu em detalhes sobre a história natural de usa terra natal e fez uma descoberta memorável, publicada na revista da Sociedade, Philosiphical Transactions, em 1677.
Figura 2. Sir Robert Moray. Fonte da imagem: FindaGrave. |
MITO OU VERDADE?
Em uma tora na costa da Ilha de Uist, ele observou e relatou:
“Inúmeras pequenas conchas; havendo em seu interior pequenos pássaros de formas perfeitas, os quais se supõe que sejam gansos selvagens (...) Esse pássaro (...) considerei de formas tão curiosas e perfeitas que parece nada lhe faltar, em relação a suas partes externas, para compor uma perfeita ave marinha; (...) o pequeno bico como aquele de um ganso, os olhos marcados, a cabeça, o pescoço, o peito, as asas, o rabo e as patas formados como os de outra ave aquática, se bem me recordo.” Sir Robert teve a honestidade de admitir que ele jamais havia observado algum dos animais adultos, mas garantiu a seus leitores que “algumas pessoas dignas de créditogarantiram ter visto alguns tão grandes quanto um punho fechado ”.
Figura 3. Gansos-de-faces-brancas. Fonte da imagem: AvesdosAçores. |
O mito dos pássaros nascidos em conchas, os gansos-de-faces-brancas (Figura 3), como os conhecemos hoje, sendo as conchas supostamente as sementes de uma certa árvore, já era bastante difundido (de fato, tais gansos eram confundidos com percebes (Figura 8), uma espécie decrustáceo pertencente à Infraclasse dos cirripédios).
Figura 4. Thomas Henry Huxley (1825-1895). Fonte da imagem: TodayinScienceHistory. |
A noção era tão arraigada que, durante um tempo, o ganso-de-faces-brancas (barnacle goose, em inglês) foi considerado um peixe e podia ser comido pelos católicos às sextas-feiras. Thomas Henry Huxley (Figura 4) sugeriu que o equívoco ocorreu porque tais pássaros eram comuns na Hibérnia, ou Irlanda, e que a mudança de Hiberniculae para Barnaculae, o termo então usado para cracas, foi bastante simples.
A VERDADE POR TRAZ DA EMBRIOLOGIA
A ideia de uma árvore que dá pássaros é estúpida, mas surge de uma observação antiga e precisa, de que a forma adulta de muitos seres é bastante distinta da de seus ovos e embriões (Figura 6). O olho não reinado tem dificuldade em distinguir as formas jovens. Um feto humano com um mês de desenvolvimento é quase idêntico ao de um chimpanzé, a parte interna do ovo de um ganso se parece bastante com a do ovo de um avestruz, e as larvas de cracas não são muito diferentes das de seus parentes, as lagostas e os caranguejos. Até mesmo o fundador da embriologia moderna, Karl Von Baer (Figura 5), considerava difícil estabelecer tais distinções.
Figura 5. Karl Von Baer (1792-1876). Fonte da imagem: Wikipédia. |
Em 1828, ele escreveu: “Tenho dois embriões preservados em álcool que esqueci de rotular. Hoje, sou incapaz de determinar o gênero a que pertencem. Podem ser lagartos, pequenos pássaros ou até mesmo mamíferos.”
O desenvolvimento é a imposição de um padrão sobre uma massa disforme. A maioria dos animais, das cracas aos gansos, compartilha os mesmos tipos básicos de células. Conforme um embriãocresce, elas são organizadas para formar um caranguejo, um ganso ou um avestruz, um homemou um morcego.
Essa grande recombinação constrói corpos novos e complexos a partir da mesma matéria-prima. Ao fazê-lo, esconde a lógica sob a qual os corpos são construídos. A anatomia de um adulto faz muito mais sentido quando vista pelos olhos do embrião.
No livro A Origem das espécies usou a similaridade entre os estágios iniciais de seres aparentemente não relacionados para argumentar que “a comunhão da estrutura embrionária revela a comunhão da descendência”.
NA BIOLOGIA MODERNA
A ideia ganha nova vida na biologia moderna, que revela afinidades entre os embriões até mesmo de seres distantes. O DNA, assim como os corpos que constrói, é baseado em uma série de variações sobre um tema estrutural.
Conforme o ovo se torna adulto, órgãos complexos (olhos, ouvidos, mãos ou cérebros) são agrupados a partis de elementos que podem ser distinguidos com clareza apenas no embrião.
Figura 7. Cracas. Fonte da imagem: GeoCaching. |
Em nenhum lugar o contraste entre jovem e velho é mais notável que entre as cracas (Figura 7). Um dia se pensou que tais seres fossem caracóis, por causa de suas sólidas conchas.
De fato, eles são animais de membros articulados não diferentes de caranguejos, aranhas ou moscas. Seus ancestrais viviam livres nos oceanos, mas, hoje, muitos deles passam a maior parte de suas vidas numa cela de prisão. As cracas são parentes próximos não de lapas, como um dia se imaginou, mas de camarões e lagostas.
Essa afinidade foi descoberta nos anos 1820 por um cirurgião do exército baseado na Irlanda mas, por muitos anos, o grupo (os cirripédios, para dar seu nome técnico) pareceu não mais do que obscuro. Poucos biólogos se importavam com tais seres tediosos.
Figura 8. Percebes. |
Até que Charles Darwin, o famoso naturalista, dedicou um sexto de sua carreira científica ao estudo desses seres. Seus oito anos de pesquisa, mostraram que os animais, por mais tolos que pareçam, tinham lições não apenas para os naturalistas, mas para a biologia como um todo.
Conforme ele se aproximava lentamente da ideia de que a vida não era fixa mas passível de mudanças, foi alertado de que “ninguém tem o direito de examinar a questão das espécies a não ser que tenha descrito minuciosamente muitas delas”.
Darwin escreveu quatro livros, sobre a taxonomia, os embriões e os fósseis de tais seres. Algumas espécies eram estranhas; tão distintas dos habitantes das rochas da costa do País de Gales ou da Escócia que qualquer parentesco parecia quase tão improvável quanto uma afinidade com os gansos. Darwin foi tão preciso que ganhou prêmios por seus estudos e estabeleceu um tema central da evolução: de que o embrião é a chave para o adulto.
www.bioorbis.org
Sem comentários:
Enviar um comentário