Madalena Feu, Delegada Regional no Algarve do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), em entrevista exclusiva ao jornal diáriOnline Região Sul explica o fenómeno do desemprego sazonal no Algarve e revela o que está a ser feito para colmatar essa lacuna que se arrasta há várias décadas, mas que nos últimos anos se agudizou com o desemprego jovem, assim como, mais recentemente, devido à escassez de habitação a longo prazo.
diáriOnline Região Sul (dRS): Atualmente como Delegada Regional do IEFP, mas tendo em conta que já passou por várias áreas dentro da instituição, como explica o fenómeno do desemprego sazonal na região algarvia?
Madalena Feu (MF): O fenómeno da sazonalidade no Algarve, dadas as características naturais da região, está diretamente relacionado com a sua forte atratividade turística, colocando-nos como um dos principais destinos de férias, do país e da europa.
Uma vez que a generalidade da procura se focou precisamente no turismo de férias, designadamente de sol/praia/mar, levou a uma forte especialização da atividade económica no setor do turismo e áreas afins (hotelaria, restauração, comércio e serviços, entre outros), com grande incremento da atividade sobretudo no 2º e 3º trimestres do ano. Foram-se assim evidenciando dois ciclos de atividade económica na região, com reflexos no emprego/desemprego – o da “época alta”, em que se verifica um pico máximo de atividade e de criação de emprego, com valores mínimos do desemprego registado nos Serviços Públicos de Emprego da região e o da “época baixa”, em que se verifica a situação inversa.
Devo dizer que, apesar das condicionantes decorrentes da forte especialização produtiva no sector do turismo e nas áreas com ele relacionadas, este tem sido efetivamente o motor do desenvolvimento económico da região, contribuindo não só para que o Algarve seja considerado uma das regiões mais desenvolvidas do país, sendo também das regiões que mais tem contribuído para o PIB nacional e para o aumento das exportações e do emprego.
É também de relevar o esforço que os agentes económicos da região têm feito para promover todo o seu potencial turístico e de riqueza regional, criando atividades/programas complementares ao turismo de sol/praia/mar, como por exemplo o turismo desportivo e de natureza, o turismo cultural e recreativo, o turismo sénior e o turismo de saúde, que poderão ser um bom complemento e contributo para um Algarve a funcionar durante a maior parte do ano. Relevo também, numa lógica de diversificação da economia regional, os apoios a investimentos com potencial de crescimento e de criação de negócio e emprego na região, como por exemplo a agricultura e atividades relacionadas com o mar (outrora as atividades principais do Algarve), mas também as TICE, as energias renováveis e a reabilitação urbana.
dRS: Pode dizer-se que é uma questão cultural. Em que hábitos antigos se mantêm. A sazonalidade no emprego nunca vai acabar?
MF: O processo de evolução e desenvolvimento da região foi tendo, naturalmente, efeitos no comportamento e na cultura da região e das suas gentes, mas, como qualquer comportamento e/ou cultura, esta vai-se modificando e evoluindo em função de novas necessidades e novos desafios.
Acredito que estamos no bom caminho, mas os resultados das práticas que estão a ser implementadas, com vista ao desenvolvimento sustentável da região, em todas as suas vertentes, não serão naturalmente imediatos.
No que se refere aos ciclos sazonais da região, é já visível o aumento da duração do ciclo de atividade a que chamamos de “época alta”. Devo dizer que no corrente ano assistimos a um aumento das ofertas de emprego no primeiro trimestre do ano, logo a partir do mês de janeiro, sendo que a diminuição do desemprego registado nos Serviços de Emprego da região, designadamente do desemprego sazonal, se fez também sentir desde a mesma altura.
Nesta matéria, importa relevar que o IEFP dispõe, para o Algarve, de um programa específico – o FormAlgarve – que visa estimular a manutenção do emprego ao longo do ano e a qualificação dos trabalhadores. O programa prevê a concessão de um apoio financeiro aos empregadores que, ao invés de cessarem os contratos sazonais com os seus trabalhadores, os convertam a contratos sem termo ou os renovem por um período mínimo de 12 meses, comprometendo-se a facultar-lhes formação durante o período de menor atividade.
dRS: O que pode ser feito para colmatar essa lacuna, tendo em conta que a maioria dos desempregados tem idades acima dos 40 anos?
MF: O reforço de competências e a qualificação dos ativos empregados, quer sazonais ou não, e a qualificação e reconversão dos desempregados registados que não encontram uma solução de emprego na região, tem caráter fundamental, já que potenciar o desenvolvimento económico da região, de forma sustentada, implica necessariamente recursos humanos qualificados.
Nesta matéria, os Centros Qualifica (CQ), – o IEFP dispõe de 3 CQ na região (Portimão, Albufeira e Faro) – são, na minha opinião, de uma oportunidade extrema, pois permitem a qualificação e a certificação de competências adquiridas ao longo da vida, em situações de aprendizagem formal e informal, por via da análise de histórias de vida e de um processo de reconhecimento, validação e certificação de competências (RVCC), de acordo com o ritmo e disponibilidade de cada candidato.
Acresce que estamos numa região em que, por via da sazonalidade do emprego, grande parte dos ativos têm larga experiência de trabalho no setor do turismo, mas efetivamente não tem qualificações reconhecidas, porque os ciclos da sazonalidade dificultam a obtenção/conclusão de percursos completos de formação qualificante. Os Centros Qualifica constituem um excelente instrumento com vista a colmatar e regularizar estas situações.
dRS: Atualmente verifica-se que a região tem necessidade de alojamentos de longa duração para quem quer vir trabalhar. O que lhe apraz dizer sobre o assunto?
MF: A dificuldade em encontrar-se alojamento na região, a preços razoáveis para quem pretender vir trabalhar para o Algarve, designadamente durante a “época alta”, bem como a dificuldade em ter uma rede de transportes públicos, a funcionar em horários compatíveis com os horários dos setores do turismo e a cobrir toda a região, são problemas já identificados por todos e está em “cima da mesa” a procura de soluções.
Não sendo matéria da competência do IEFP, enquanto parceiros regionais, estaremos sempre disponíveis para colaborar com informação e medidas que ajudem a resolver/minimizar o problema, designadamente os problemas de emprego que possam resultar dessa situação. Em matéria de emprego e de forma a facilitar a mobilidade geográfica para o efeito, o IEFP, IP dispõe de uma medida – “Incentivos de Apoio à Mobilidade Geográfica” – que disponibiliza um apoio financeiro à deslocação e alojamento, a candidatos desempregados e inscritos nos Serviços de Emprego há pelo menos 3 meses, que pretendam trabalhar a mais de 50 km (contratos de curta duração) ou 100km (contratos superiores a 12 meses) do local da sua residência. Esta informação poderá ser obtida em detalhe através do nosso portal IEFPonline ou em qualquer Serviço de Emprego.
dRS: No que concerne aos jovens, o que está o IEFP a fazer para fazer baixar as elevadas taxas de desemprego que se continuam a verificar?
MF: O desemprego jovem é um problema, mas não é o problema com maior peso na região, já que o desemprego jovem registado corresponde a uma pequena percentagem do total do desemprego registado, cujo intervalo etário de maior dimensão é o que se situa entre os 35 e os 55 anos.
A maior preocupação relativamente aos jovens da região foca-se na sua qualificação e na motivação para uma aprendizagem ao longo da vida, pois ainda existe um número de jovens na região, que não pode ser menosprezado, que não conclui o seu processo de educação/qualificação.
Alguns irão trabalhar, o que não é de todo uma situação negativa, pois adquirem competências importantes para a sua vida futura e um maior conhecimento/aproximação ao mundo do trabalho. O problema está em que muitos deles desinveste na sua educação/formação, mantendo-se com graus de escolaridade baixos e sem qualquer qualificação profissional. Desta forma, todo o trabalho que se fizer no sentido da divulgação e valorização das profissões e da oferta formativa, bem como da disponibilização de serviços de informação e orientação profissional, junto dos jovens, com vista à sua qualificação para o futuro, é muito importante.
Quanto a medidas concretas disponibilizadas pelo IEFP, para além do já referido, dispomos de programas de formação qualificante (Sistema de Aprendizagem e Cursos de Especialização Tecnológica), que conferem um nível de qualificação IV e V respetivamente. Por outro lado, dispomos, para jovens já qualificados, de um Programa de Estágios Profissionais, a realizar em empresas e por candidatura destas, que permite aos jovens integrados transferir as competências adquiridas ao longo do seu percurso de qualificação, para uma situação concreta de trabalho, bem como adquirir novas competências, quer do ponto de vista pessoal/social, quer do ponto de vista profissional.
Este programa melhora significativamente as perspetivas de empregabilidade dos jovens estagiários, sendo que muitos deles são contratados pela empresa no termo do estágio. Importa também relevar que as medidas de apoio ao emprego atuais, de acordo com as políticas públicas de emprego de combate à precariedade e de reforço à integração profissional, privilegiam a contratação de públicos com maiores dificuldades de integração profissional, tal é o caso dos jovens, havendo também um programa de apoio ao empreendedorismo jovem – o InvesteJovem -, bem como prémios de integração para as empresas que contratem os jovens no termo dos seus estágios profissionais.
Em suma, apesar de muito estar a ser feito, mudar a cultura será o mais difícil e certamente vai ser necessário muito tempo para que se sinta uma verdadeira mudança. Só mesmo o tempo nos trará sinais de mudança.
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