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domingo, 18 de maio de 2014

Se os suíços quiserem, o salário mínimo mais alto do mundo será 3270 euros - Fixação de um valor mínimo de 4000 francos decidida hoje em referendo. Governo e patrões acenam com o risco do aumento do desemprego, sindicatos dizem que valor deve ser lido à luz do elevado custo de vida no país.

Se os suíços quiserem, o salário mínimo mais alto do mundo será 3270 euros

Fixação de um valor mínimo de 4000 francos decidida hoje em referendo. Governo e patrões acenam com o risco do aumento do desemprego, sindicatos dizem que valor deve ser lido à luz do elevado custo de vida no país.


Visto de fora, o aceso debate das últimas semanas na Suíça dá a ideia de um país alheio à realidade para lá das suas fronteiras. Com a Europa a debater-se ainda com uma crise que deixou milhões no desemprego, os suíços decidem neste domingo em referendo a fixação de um salário mínimo nacional. O valor proposto? Quatro mil francos suíços (3270 euros) que deixam a anos-luz o que é pago nos países do Sul da Europa e que é superior aos dos países vizinhos. Mas para os sindicatos, autores da proposta, trata-se apenas de garantir que os trabalhadores menos qualificados conseguem viver do seu salário num dos países mais caros do mundo.
Este é a terceira vez em menos de um ano e meio que a democracia directa na Suíça – onde para convocar um referendo federal bastam cem mil assinaturas – “interfere” na política de salários do país: em Março de 2013, os eleitores decidiram que os accionistas das empresas têm o direito de vetar as remunerações e prémios dos administradores; sete meses depois, chumbaram uma proposta que proibia que os salários dos executivos fossem superiores a 12 vezes o salário do trabalhador com menor remuneração. A estes juntou-se um outro referendo, em Fevereiro, que determinou a reintrodução de quotas para imigrantes vindos da UE, apesar da oposição dos empresários e do Governo federal e dos alertas de Bruxelas para as consequências da decisão nas relações bilaterais.
“A Suíça sempre foi conhecida como um país credível, estável, liberal e aberto, mas estas votações estão a tornar as coisas difíceis para as empresas”, disse à Reuters Daniel Kalt, economista do banco UBS, alertando para o risco de a “insegurança legal tornar a Suíça menos atractiva para os investidores”.
Esse é um dos argumentos usados pelas confederações patronais para rejeitarem a fixação de um salário mínimo que a Suíça até aqui não tinha e que, a ser aprovado, seria o mais alto do mundo, mesmo após a ponderação com o custo de vida no país. Os 22 francos por hora (18 euros) propostos pela União Sindical Suíça (USS) ultrapassam em muito o que vigora na Austrália (o equivalente a 11,18 euros), que detém o actual recorde mundial de salário mínimo. Na Alemanha, onde a fixação de um valor mínimo por hora de trabalho foi uma das chaves para o acordo de grande coligação entre a CDU de Angela Merkel e os sociais-democratas, os patrões vão pagar 8,5 euros por hora a partir de Janeiro.
Prós e contras
Feitas as contas, um trabalhador a tempo inteiro (42 horas semanais), receberia um mínimo de 3270 euros por mês, muito acima dos 1921 euros pagos no Luxemburgo, até agora o país europeu com a remuneração garantida mais alta. Em Portugal, o salário mínimo antes de impostos é de 485 euros por mês; na Bulgária, com a remuneração mais baixa dos 21 países da UE que têm este dispositivo, é de apenas 174 euros.
“O salário mínimo exigido vai pôr em risco o emprego e vai tornar ainda mais difícil o acesso ao mercado de trabalho das pessoas com baixas qualificações e dos jovens”, avisou o Conselho Federal (o governo suíço) quando o referendo foi anunciado. Os patrões acrescentam que a medida pode levar as grandes empresas a deslocar a produção para países onde a mão-de-obra seja mais barata e provocar um aumento generalizado dos preços – a confederação de agricultura, uma das mais críticas da proposta, admitiu que as frutas e legumes podem chegar aos consumidores 25% mais caros.
“Esta é uma medida que não ajuda a criação de emprego”, disse Peter Brabeck-Letmathe, presidente da Nestlé ao Wall Street Journal. A multinacional, uma das maiores e mais emblemáticas do país, já paga aos seus trabalhadores acima desse valor, mas Letmathe afirma que os negócios mais pequenos, sobretudo nas regiões rurais, teriam dificuldades em acompanhar a subida dos salários.
Avisos que os suíços parecem ter levado a sério: as últimas sondagens indicam que 64% dos eleitores planeia votar “não” no referendo deste domingo, ainda que o desfecho dos referendos na Suíça seja por tradição imprevisível.
Mas os sindicatos, apoiados pela oposição de esquerda, asseguram que a proposta não só é sustentável (os 4000 francos equivalem a 60% do salário médio do país, uma porção idêntica à de outros países europeus) como terá um impacto reduzido na economia suíça. Isto porque, sublinham, apenas 9% dos 4,2 milhões de trabalhadores do país recebem abaixo daquela fasquia e a maioria trabalha em sectores dependentes da procura interna, como a hotelaria, serviços domésticos ou pequeno comércio – os menos abrangidos pelas convenções colectivas de trabalho. “Como é que se vão deslocalizar? Será que os suíços vão passar a cortar o cabelo na Polónia ou na Hungria”, questionava-se Ewald Ackermann, dirigente da USS ao site Swissinfo.

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