Este trabalho foi realizado com factos reais, com histórias contadas, pessoalmente, por um dos intervenientes da Guerra Colonial, o meu avô materno, Manuel Dias Merciano, hoje com 69 anos de idade e com um prazer enorme de nos contar todas as peripécias que passou, mas que ele recorda com muita emoção e alegria. Como ele mesmo costuma dizer, “ Tempos que já lá vão! ”
Começou por me dizer que se apresentou na Escola de Fuzileiros, em 18 de Setembro de 1961, e logo, em 11 de Novembro de 1962, partiu para Moçambique, integrado na Companhia n.º 2 de Fuzileiros. Regressou de Moçambique, dia 25 de Abril de 1965. Saiu definitivamente de Marinha, em Novembro de 1965.
1.º Grumete dos fuzileiros
As condições de vida que tinham naquela altura eram péssimas, a família dele era humilde, viviam da agricultura, eram 8 irmãos todos com idades muito seguidas, logo tinham que começar a trabalhar muito novos para o sustento da casa e da família.
Diz o meu avô que para tentar uma vida um pouco melhor, e o gosto por conhecer sítios novos o levou a ir para a Marinha, ele e muitos outros da sua aldeia Natal.
Embarcou para Moçambique em Novembro de 1962 e aí começaram as peripécias que ele tanto gosta de relatar.
Primeiro, e muito importante, foi o facto de ele ter um certo receio de sair da sua aldeia, coisa que ele nunca tinha feito; depois as despedidas da família, de quem nunca se tinha separado; por fim, o choro da mãe que lhe ficou gravado na memória, até aos dias de hoje.
Já embarcado, os “praças” seguiam para a 3ª classe, onde havia um self-service, cada grupo nomeava os seus faxinas e aproximavam-se dos caldeirões, montados à proa e à ré, para receber um tacho de sopa, outro de “segundo”, o pão e a fruta, que iam distribuindo pelos seus camaradas, no regresso aos seus postos.Comiam sentados no convés.
Isto era um problema enorme, para o meu avô, que até com o mar calmo enjoava tanto que preferia não comer nada e ir deitar-se no beliche. Diz que todo o tempo que podia era passado com panos frios na testa e deitado no beliche, por causa dos enjoos.
Nessas viagens eram feitos ainda exercícios de salvamento a bordo, onde tinham que pôr coletes salva-vidas, em caso de naufrágio. Nos dias de calma jogavam às cartas e recebiam instruções sobre o destino, embora ninguém desejasse pensar nisso.
Chegado o dia do desembarque, aqueles que iam para o norte de Moçambique prosseguiam de Lourenço Marques até à Beira ou Porto Amélia.
A partir daqui, seguiam-se 2 anos de comissão.
Em Novembro de 1962, já na companhia de Fuzileiros Navais n.º 2, encontravam-se em Lourenço Marques e foi-lhes era confiada a segurança do comando naval de Moçambique, enquanto outro pelotão era destacado para o lago Niassa, em Metangula.
O lago Niassa foi o primeiro sítio onde os fuzileiros participaram, actuando autonomamente até ao limite das águas territoriais, em operações realizadas em lanches ou botes.
Os fuzileiros realizaram, além das operações típicas da contra-guerrilha, patrulhamentos ao longo dos rios e das costas, normalmente de noite.
Estas companhias de fuzileiros destinavam-se a manter segurança nos aquartelamentos e nos comandos navais, escoltavam comboios ou embarcações que utilizassem os rios como vias de acesso ao interior dos territórios.
No caso especifico do meu avô, normalmente ele e os da companhia dele faziam a segurança na estação rádio naval, onde eram feitas as transmissões; diz ainda que estavam sempre duas fragatas ao serviço, uma atracada em Lourenço Marques e a outra sempre a fiscalizar as fronteiras.
Foram estes tempos instáveis, naquela colónia, que trouxeram alguns dissabores, tais como doenças, mortes de amigos ou familiares que a memória não deixa esquecer, mas também se criaram grandes amizades, amizades essas que se perderam com a vinda do meu avô para a pátria.
Quando a guerra começou, mais propriamente em Setembro de 1974, o meu avô estava já na final da sua comissão e acabou por não viver bem aquela situação, porque ela se tinha despoletado mais a norte do sítio onde ele se encontrava, mas mesmo assim vivia-se um clima de instabilidade e medo dos acontecimentos.
O meu avô a conviver com os habitantes da aldeia
Em Moçambique, o movimento de libertação, denominado Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), efectuou a sua 1.ª acção, nos dias 24 e 25 de Setembro de 1964, num ataque a Chai, na província de Cabo Delgado, estendendo-se em seguida ao Niassa e para o centro do território.
Foram momentos muito intensos de horror e medo que se viveram naquela época, mas para o meu avô foram os últimos momentos vividos na Guerra Colonial, pois ele regressou em Abril de 1965, ficando a guerra ainda em completo vigor.
Ainda hoje ele recorda com alguma mágoa, mas também muita saudade, aqueles tempos.
O meu avô, Manuel Dias Merciano, na mata perto da base naval. 1964
historias_de_familia.blogs.sapo.pt
Patrícia Gonçalves
Três décadas depois de ter participado na Guerra Colonial na Guiné, para onde foi chamado em 1966, para prestar serviço militar obrigatório pela terceira vez, António Loja sentiu-se inesperadamente assaltado por uma série de memórias, no pós-operatório de uma cirurgia: «O ruído do motor de um frigorífico, numa sala vizinha do corredor onde, no hospital, faço a minha caminhada diária, levou-me de repente a recordar o motor da LDG que, directamente do Uíge, vindo de Lisboa, nem atracara no cais de Bissau.» (p. 11)
É este o ponto de partida para um diário marcado por recordações emocionantes e dolorosas, sobre a luta pela sobrevivência e a relação com Deus – o autor é agnóstico – e a morte, numa obra que é também uma homenagem aos que partiram e aos que sofreram as suas mortes. Esta é a guerra contada, não em números, mas em pessoas, em histórias como a dos amigos de infância que morreram juntos e a do pai que perdeu os dois filhos, um após o outro.
No meio de tudo isto, há ainda lugar a inusitadas deambulações relacionadas com a enfermeira do hospital, a meu ver desnecessárias, mas que acabam por servir de escape às dores da guerra e da doença, neste livro não recomendado a estômagos frágeis.
Uma citação: «– Ai, meu capitão! Meu capitão!
De um buraco abaixo da clavícula jorrava, a cada batida do coração, um repuxo de sangue que me atingiu a cara, os óculos e me escorreu para o nariz e para a boca. Sustentei-o debaixo dos braços e pousei-o devagar sobre as folhas das árvores, no meio da picada, enquanto toda a companhia assumia posições de defesa. Nunca consegui esquecer o sabor do sangue ainda quente e o cheiro adocicado e logo nauseabundo que me invadia as narinas. Disse-lhe uma mentira piedosa:
– Vem aí o enfermeiro. Vais ficar bem! Já mandei vir o helicóptero…
Espero que ele tenha acreditado, nos breves segundos que levou a morrer. Só que na morte não há breves segundos. É um tempo sem relógio. É toda a eternidade de um fim que parece nunca chegar. Morreu a esvair-se em sangue que ninguém poderia estancar. O que recordo com horror é a minha reacção seguinte: ainda ajoelhado junto dele, inclinei-me para o lado e vomitei, de um modo incontrolável, ali a dois passos do cadáver do meu camarada.» (p. 38)
aviagemdosargonautas.net
Também havia aviões
Agora mudando de assunto.
Esta foto está aqui só por uma questão muito simples. Quando vamos ás escolas falar sobre a Guerra Colonial, os alunos fazem muitas perguntas, algumas das quais, se havia também aviões, e neste caso fala-se no T- 6 ou no Fiat, eles interrogam-nos: Mas que aviões eram esses? Para muitos que não sabem que aviões eram, hoje vão começar a conhecer alguns. Como eu tenho divulgado o nosso site quando vou às escolas, a partir daqui eu vou meter alguns aviões para todos ficarem a conhecer. O primeiro é o famoso T6. Fica aqui um pequeno comentário sobre este avião:
O T-6 foi um dos mais famosos aviões monomotores de hélice, conhecido por nomes como "Texan", "Harvard", "Yale", "Wirraway", "Mosquito", "Boomerang" e "Tomcat", conforme o país que o usava. Foi adoptado na força aérea de 55 países, desde avião de treino de pilotos, a bombardeiro. Criado em 1935 pela North American, começou a ser utilizado em força em 1940, sendo introduzido em Portugal em 1946.O T-6, podia ser convertido em caça-bombardeiro ligeiro, equipado com metralhadoras, mísseis, bombas convencionais
ou de napalm debaixo das asas ou actuar como avião de reconhecimento.
Foram pintados segundo vários esquemas como com a fuselagem em cinzento metálico (alumínio), e os lemes de profundidade e de direcção, as pontas das asas e uma faixa na fuselagem traseira pintados a amarelo alaranjado, mas houve outros exoticamente personalizados.
Os T-6 utilizados em Moçambique durante a guerra colonial estavam estacionados em Nampula na base AB 5, a maioria pintada de cor de alumínio, ou com tinta anti-radiação a preto e verde-mate (baço) de protecção contra mísseis terra-ar do tipo "Strella".
Belicamente, foram usados pela última vez em Portugal, a 11 de Março de 1975. O motor deste avião fazia um barulho fora do comum. Era um barulho inconfundível!
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E agora vai o primeiro texto que faz parte do Seminário “ECOS DA GUERRA DO ULTRAMAR”:
www.adcash.com
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